Encontro técnico dos Consegs discute leis de saída temporária e audiência de custódia
Primeiro encontro de 2024 dos Conselhos de Segurança Comunitários do Grande ABC expõe números da Polícia Militar em 2023 e debate revisões de leis como a que prevê a saída temporária de detentos
- Data: 31/01/2024 18:01
- Alterado: 31/01/2024 18:01
- Autor: Rodilei Morais
- Fonte: ABCdoABC; Agência Brasil
Coronel Luiz Fernando Alves apresentou os números da PM na região do ABC em 2023
Crédito:Rodilei Morais/ABCdoABC
O primeiro encontro técnico dos Conselhos de Segurança Comunitários (Consegs) do ABC, realizado na noite desta segunda-feira (29) no Cine Theatro Carlos Gomes, em Santo André, debateu mudanças na legislação que lidam com a atuação policial, não somente na região, mas em todo território nacional. Autoridades e representantes da sociedade civil manifestaram a demanda por alterações em leis como a que prevê a saída temporária de detentos e a audiência de custódia.
A ocasião reuniu policiais civis, militares, representantes do poder público da região e membros dos Consegs do Grande ABC para a apresentação dos números de 2023 do CPA/M-6 — Comando de Policiamento de Área Metropolitana 6, que engloba os sete municípios da região — e o levantamento de demandas por alterações na legislação.
De acordo com o Coronel Luiz Fernando Alves, comandante local da PM, foram mais de 3,3 milhões de chamados atendidos ao longo do ano passado no ABC. A Polícia Militar ainda apreendeu 3,9 toneladas de drogas e 283 armas, prendeu 3.914 infratores e recuperou 5.431 veículos roubados na área atendida pelo CPA/M-6. O comandante destacou ainda uma ocorrência em que a polícia identificou um local desmanche na região. “Não adianta combater só o marginal na ponta da linha,” afirmou Alves. “É preciso desmantelar essa cadeia criminosa.”
Manifestações pelo fim das Saídas Temporárias
O Coronel Alves também iniciou o debate pelo fim das saídas temporárias de detentos, benefício previsto na Lei de Execução Penal, de 1984, a presos que cumprem o regime semiaberto que tenham cumprido um sexto da pena total se for réu primário, ou um quarto se for reincidente — cerca de 30.000 presos foram liberados desta forma em 2023 no estado de São Paulo, 1.000 deles não teriam voltado ao cárcere e são considerados foragidos.
O comandante expôs um caso em Diadema em que um preso foi vítima de uma tentativa de homicídio dois dias antes de seu retorno à penitenciária. A ocorrência exigiu que 36 policiais militares fossem mobilizados para realizar a escolta do detento, se revezando, ao longo de nove dias, em turnos de 12 horas e utilizando 18 viaturas no período.
Luiz argumenta que o fato ilustra um dos problemas ocasionados pelo recurso das saídas: um grande efetivo teve de permanecer fora de sua atividade convencional, a fim de garantir a segurança do próprio preso e também daqueles presentes no hospital — o detento poderia ser alvo novamente ou ainda tentar fugir após sua recuperação. Entre o Natal e o Ano Novo, um outro preso foi reconduzido ao CDP de São Bernardo do Campo após descumprir as regras de sua saída — ele teria saído de seu perímetro permitido para um passeio de jet-ski.
O Coronel PM Leonardo Castro Isipon, coordenador estadual dos Consegs, trouxe ainda o caso do assassinato do sargento Roger Dias da Cunha, em Minas Gerais. O detento Welbert de Souza Fagundes, liberado na saída do último Natal, atingiu o policial com três tiros após uma perseguição — o oficial chegou a ser socorrido, mas faleceu no hospital.
Conseg e legislações de interesse para a segurança pública
Além de argumentar a favor das mudanças na Lei de Execução Penal, Isipon levantou ainda outras legislações que, segundo ele, são um desestímulo à atuação policial. “É uma insegurança jurídica absurda que o policial tem para trabalhar,” declarou. Ele elencou o Estatuto da Criança e do Adolescente, que facilitaria a atuação de criminosos menores de idade; a Lei 9.099 95, que trata de Crimes de Menor Potencial Ofensivo, permitindo penas alternativas para delitos leves; e a Lei 13.964 2020, que prevê a audiência de custódia, na qual cerca de 54% dos infratores seriam liberados no estado de São Paulo.
Leonardo defende que o problema da segurança pública está na brandura de leis como estas e propõe que os conselhos comunitários assumam um papel de diálogo com o poder legislativo para a alteração dessa legislação. Os Consegs, formados por munícipes que, de forma voluntária, se reúnem para discutir a temática de segurança com as autoridades locais, teriam respaldo legal para ocupar este espaço de pressionar o poder legislativo.
As questões expostas pelos coronéis da PM estiveram alinhadas com as falas de dois presidentes destes conselhos que estavam presentes no encontro. Kleber Paiva, à frente do Conseg Sudeste de Santo André, também se manifestou contra a saída temporária, além de pedir um maior efetivo e a construção da 6ª CIA do décimo batalhão na cidade. Marta Lilia Porta, que presidente um destes conselhos da capital do estado, reforçou a importância da atuação das entidades para atingir os avanços desejados.
Argumentos a favor da saída temporária
A existência do benefício de saída temporária dos presídios é justificada pela sua função de ressocialização dos detentos e manutenção de seus laços familiares. O projeto de lei que extinguiria este mecanismo data de 2022, mas desde outubro do ano passado está parado no senado.
Em entrevista dada à Agência Brasil no início do mês, a diretora-executiva do Instituto de Defesa do Direito de Defesa (IDDD), Marina Dias, defende a importância da saída no processo de reinserção dos detentos, lembrando ainda os problemas do sistema carcerário no Brasil. “Ninguém faz um questionamento sobre a falência do sistema prisional, sobre a falência do sentido da pena, da punição. Tem um olhar isolado sem perceber a questão estrutural,” declarou.