Reformas podem atenuar efeito de crise
Segundo economistas, parceria entre Executivo e Legislativo para dar andamento às reformas pode reduzir incertezas e atrair investimentos
- Data: 10/03/2020 08:03
- Alterado: 10/03/2020 08:03
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
Jair Bolsonaro e Paulo Guedes entregam pacote de medidas ao presidente do Senado
Crédito:Marcelo Camargo/Agência Brasil
Medidas que possam reduzir a exposição do Brasil ao caos verificado na segunda-feira, 9, em todo o mundo passam por entendimento entre Executivo e Legislativo para iniciar, de imediato, as reformas urgentes como a administrativa, a tributária e a PEC emergencial, segundo vários economistas ouvidos pelo ‘Estado’.
Mas há também quem defenda a continuidade da redução de juros, liberação de compulsórios e até a suspensão do teto de gastos por dois anos.
“Se tivermos clareza sobre as reformas, como elas vão andar, se virmos um clima de parceria entre Executivo e Congresso em volta de uma agenda que permita reduzir a incerteza doméstica, melhoraria o ambiente de negócios e tornaria o Brasil muito mais interessante do ponto de vista do investimento”, diz Armando Castelar, coordenador da área de Economia Aplicada do Ibre/FGV.
Para José Roberto Mendonça de Barros, economista e sócio da MB Associados, a área de infraestrutura é a que mais precisa de investimentos no momento. “A lei do saneamento, por exemplo, geraria grandes obras públicas e teria efeito social enorme, como a geração de empregos.”
Já Bráulio Borges, pesquisador do Ibre, acredita que a agenda da infraestrutura teria enorme potencial não só para dinamizar a atividade no curto prazo, como aumentar a produtividade brasileira no médio e longo prazo. “Mas essas coisas não saem do papel do dia para a noite.”
De imediato, Borges defende o uso da política monetária para atenuar o impacto do turbilhão externo provocado pelo coronavírus e acentuado pela guerra do petróleo. Ele lembra que, assim como na crise de 2008, hoje o efeito líquido da alta do câmbio e da queda das commodities é desinflacionário. “Por isso há espaço para o Banco Central cortar juros e tentar reativar a economia como já fez no passado.”
TETO DE GASTOS
Sérgio Vale, da MB Associados, também acredita que há espaço para o BC continuar cortando juros, que, para ele, ainda são muito elevados no Brasil na comparação com o resto do mundo. Ele lembra que a regra do teto de gastos impede o aumento dos investimentos públicos e acredita que o mercado faria uma leitura ruim se as regras fossem mudadas, mesma opinião de Borges, para quem não se deve mudar regras “no olho do furacão”.
“Mexer no teto de gastos é suicídio”, concorda Castelar. O professor da Universidade de Brasília, José Luís Oreiro, pensa de forma diferente. “É preciso mudar a política econômica e suspender o teto de gastos por dois anos para aumentar investimentos públicos. Para ele, se o ministro da Economia, Paulo Guedes, não mudar a política econômica, “então que se mude o ministro”.
Para enfrentar o choque externo, Samuel Pessoa, professor da FGV, também defende urgência na aprovação das reformas para arrumar o desequilíbrio fiscal. Isso abriria espaço para uma política fiscal contracíclica, com estímulo à demanda. Ele admite, porém, que o desentendimento entre Executivo e Legislativo impede o processo.
“O governo já estava meio perdido antes da semana trágica”, afirma Mendonça de Barros. O melhor seria o ministro Guedes parar de falar em dólar e se concentrar nas reformas.”
O QUE FAZER PARA ENFRENTAR A CRISE?
José Roberto M. de Barros, economista e sócio da MB Associados – País precisa de mais investimento
“A melhor coisa a ser feita é um trabalho construtivo entre Executivo e Legislativo para acelerar a aprovação da PEC emergencial, que significaria inequívoca melhora na questão fiscal. São necessárias medidas que permitam mais investimentos, como a lei do saneamento básico, que geraria obras públicas e teria enorme efeito social. Outro ponto é a reforma administrativa. De resto, é manter a calma. Não podemos controlar o que vem de fora, mas quem opera câmbio é o Banco Central. Não é papel de ministro falar sobre isso.”
Samuel Pessoa, economista e professor da FGV – Reformas trariam equilíbrio fiscal
“A prioridade é aprovar as reformas emergencial e administrativa. O efeito imediato da aprovação seria arrumar o equilíbrio fiscal estrutural. Essa arrumação abriria espaço para uma política fiscal contracíclica, mas só se criarmos instituições que sinalizem esse equilíbrio lá na frente. As dificuldades do Executivo e Legislativo em fazer política dificultam a aprovação de reformas e a construção do estabelecimento de instrumentos para uma política fiscal. Sem isso, há menor capacidade de enfrentar o choque externo.”
Bráulio Borges, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia – Há espaço para a política monetária
“O efeito líquido de tudo isso que está acontecendo é desinflacionário. Por isso, há espaço para a política monetária reagir a isso, mas talvez não seja suficiente, pois a atividade vem decepcionando, mesmo com os juros num patamar bastante baixo. Talvez seja preciso outros estímulos. O governo já fala em mais uma rodada de liberação de FGTS. Liberação de compulsório tem o potencial de ajudar, mas o feito não é garantido. No entanto, mudar a regra do teto no meio desse turbilhão todo pode gerar muito ruído.”
José Luís Oreiro, professor da Universidade de Brasília (UnB) – Suspender teto por dois anos
“É preciso parar as reformas que estão em transição e focar em garantir a segurança da população e compensar os efeitos recessivos. Só ter um remédio para doenças diferentes é coisa de maluco. É preciso mudar a política econômica, suspender o teto de gastos por dois anos para aumentar os investimentos públicos. Se investir em infraestrutura, o efeito aparece em três meses. Dificilmente o ministro da Economia, Paulo Guedes fará isso. Se o ministro não mudar a política econômica, então, que se mude o ministro.”
Armando Castelar, coordenador de Economia Aplicada do Ibre/FGV – Mexer no teto de gastos é suicídio
“O que o governo pode fazer é reduzir a incerteza. Fazer parceria com o Congresso com uma agenda clara para o andamento das reformas. Isso diminuiria a incerteza doméstica e melhoraria o ambiente de negócios. Desta forma, o País ficaria mais interessante para atrair o investimento. Cortar juros, fazer política parafiscal e mexer no teto de gasto vão na direção errada. Mexer no teto de gasto é suicídio, pois vai introduzir incertezas sobre a situação fiscal. É preciso dar uma parada e tirar o Banco Central de cena.”
Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados – Governo está de mãos atadas
“O governo está sem opções, com as mãos atadas, como o resto do mundo. A regra do teto de gastos impede o aumento de investimentos públicos e o mercado faria uma leitura ruim se as regras forem mudadas. O jeito seria continuar cortando juros, que ainda estão elevados no Brasil na comparação com o resto do mundo. O País deve fazer um esforço para que a reforma tributária ande o mais rápido possível, o que sinalizaria uma recuperação mais acelerada, sem jogar fora o esforço fiscal que foi feito até agora.”