Paraisópolis tem melhor controle da pandemia do que o município de São Paulo
Com organização comunitária consolidada, a região serve de exemplo para políticas públicas em territórios vulneráveis
- Data: 24/06/2020 17:06
- Alterado: 24/06/2020 17:06
- Autor: Redação
- Fonte: Instituto Pólis
Centro de isolamento na escola estadual que fica na entrada de Paraisópolis
Crédito:Reprodução
A pandemia do Covid-19 está se espalhando de maneira heterogênea pelo município de São Paulo. Apesar do vírus ter aparecido primeiro na zona sudoeste da cidade, uma das mais ricas, características de infraestrutura urbana e índices socioeconômicos contribuíram para que territórios com maior precariedade urbana, como favelas por exemplo, fossem mais atingidas pela doença.
Dados da Secretaria Municipal da Saúde atestam que os distritos com maior número de óbitos pelo novo coronavírus são nas regiões com população de baixa renda e que carecem de condições para aderir ao isolamento social e demais orientações de higiene preconizadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS). No entanto, entre os territórios precários a evolução da doença também não acontece da mesma forma.
Análise do Instituto Pólis indica que, em territórios precários cuja organização comunitária é estruturada o controle da doença vem sendo mais efetivo na comparação com a média municipal. Esse é o caso de Paraisópolis, uma das maiores favelas brasileiras que conta com mais de 70 mil habitantes (IBGE 2019) e uma densidade demográfica de 61 mil hab/km².
Incluída no distrito de Vila Andrade, o qual também abrange territórios como o Morumbi, Paraisópolis vem implementando um conjunto de ações integradas em parcerias com organizações da sociedade civil para conter a difusão da pandemia. Esse esforço fez com que a favela apresentasse, em 18 de maio de 2020, taxa de mortalidade por Covid-19 de 21,7 pessoas por 100 mil habitantes, enquanto a Vila Andrade como um todo registrava 30,6 mortes a cada 100 mil habitantes. O índice também está abaixo da média municipal (56,2) e de outros distritos vulneráveis como o Pari (127), o Brás (105,9), a Brasilândia (78) e Sapopemba (72).
O QUE A FAVELA FEZ
Desde a confirmação dos primeiros casos em São Paulo, logo em março, a associação de moradores de Paraisópolis desenvolveu estratégias para suprir a falta de políticas públicas para a comunidade. Primeiramente, foi criado o sistema de “presidentes de rua” em que voluntários ficam responsáveis por monitorar famílias para possíveis sintomas do Covid-19. Foram cerca de 420 presidentes – cuidando de cerca de 50 casas cada – que, além do monitoramento desenvolveram atividades para conscientizar a população sobre o vírus e cuidados necessários. Arrecadaram e distribuíram cestas básicas, combateram à fake news sobre a pandemia e ainda foram capacitados para dar encaminhamento correto àqueles que apresentaram sintomas.
Para sustentar o sistema de presidentes, a comunidade também se preocupou em contratar ambulâncias equipadas para atendimento dos sintomáticos, assim como médicos e enfermeiros para suprir a favela 24 horas. Também foram capacitados 240 moradores como socorristas para apoiar as 60 bases de emergência criadas com a presença de bombeiros civis. Além disso, foram utilizadas duas escolas públicas cedidas pelo governo estadual, após pedido da associação de moradores, para garantir o isolamento de pessoas infectadas, principalmente das que possuem famílias numerosas e/ou moram em casas pequenas.
Ao analisar as ações e os dados de óbitos, o Instituto Pólis atesta que, a favela, apesar das condições de precariedade e vulnerabilidade, tem sido eficiente em baixar a média de mortalidade do distrito como um todo.
Vale ressaltar que o percentual de idosos, considerados grupo de risco da doença, é menor em Paraisópolis se comparado com o de Vila Andrade como um todo que, por sua vez, é menor do que o do município. Entretanto, ao realizar a devida ponderação, o Instituto averiguou que as taxas de mortalidade entre a população acima dos 60 anos ainda são menores na favela do que no distrito.
O cenário em Paraisópolis deixa claro que iniciativas de atenção básica à saúde e ações voltadas para garantir a segurança alimentar e outras despesas essenciais, com ampla testagem e busca ativa de novos casos e controle dos familiares são eficazes no combate à pandemia em centros urbanos. Assim, teríamos em Paraisópolis um bom exemplo para uma política pública de contenção do vírus que poderia ser replicada, como uma Política de Estado, em outros territórios vulneráveis.
Os gráficos com os dados analisados pelo Instituto Pólis podem ser consultados aqui.
Sobre o Instituto Pólis
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