Nova Ocupação do Itaú Cultural é dedicada a Artacho Jurado, que coloriu SP nas décadas de 40 a 60

Em um tempo em que imperava a sisudez do cinza e de linhas retas, Artacho preencheu a cidade com construções festivas, coloridas, em uma mescla de texturas e formas

  • Data: 19/06/2024 16:06
  • Alterado: 19/06/2024 16:06
  • Autor: Redação
  • Fonte: Itaú Cultural
Nova Ocupação do Itaú Cultural é dedicada a Artacho Jurado, que coloriu SP nas décadas de 40 a 60

Artacho Jurado

Crédito:Acervo da Família

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Artacho Jurado (1907-1983) amava a ópera e os charutos. Embalado por esse gênero musical e pelo tabaco, ele seguia madrugada adentro, em seu apartamento no Edifício Piauí – o primeiro que ergueu no bairro de Higienópolis, em São Paulo, com ampla vista para a cidade –, criando as plantas dos prédios que logo construiria. Na contramão dos traços racionalistas da arquitetura moderna, Artacho se tornou uma espécie de aquarelista da cidade, com projetos que destacavam elementos ornamentais e decorativos, cores vibrantes e espaços de convivência que perduram até hoje.

É este espírito que, de 20 de junho a 15 de setembro, a Ocupação Artacho Jurado, apresenta ao público no espaço Multiuso – segundo piso do Itaú Cultural. Cerca de 130 peças, entre imagens, fotografias, vídeos, desenhos originais, publicidade de época, uma maquete e o acervo pessoal da família Jurado – além de recursos acessíveis – permitem ao público conhecer a fundo a vida e obra deste empreendedor, que ajudou a desenhar a paisagem urbana. Ele via no mercado imobiliário da época possibilidades muito além da sobriedade e racionalidade geométrica que guiava outros arquitetos do período.

A curadoria desta Ocupação é do antropólogo, curador, pesquisador e roteirista documental Guilherme Giufrida, ao lado da curadora, arquiteta e pesquisadora Jéssica Varrichio e da equipe do Itaú Cultural formada pelos núcleos de Artes Visuais e de Informação e Difusão Digital, o qual abriga a Enciclopédia da instituição. A expografia é de Juliana Godoy.

“Procuramos revelar a pragmática construtiva de Artacho”, explica Giufrida. “Seguimos menos pelo raciocínio das ideias ou do teórico, já que a arquitetura dele foi pouco considerada em termos acadêmicos, para olhar para os aspectos construtivos dos materiais formais que é aquilo em que ele mais se debruçava”, completa.

O arquiteto autodidata desenhava à mão os cobogós, gradis de guarda-corpos, a paleta de cores de cada edifício, as marquises das coberturas, as amplas janelas pouco usuais no período. “Ele foi como um aquarelista de São Paulo”, observa Jéssica.

Espaço expositivo

A entrada da Ocupação embala o público com o som das óperas favoritas de Artacho e a vista de alguns de seus apartamentos, proporcionando um diálogo com o arquiteto ao experienciar a paisagem urbana. É neste momento que o público conhece a sua personalidade e importância para o legado arquitetônico da cidade, da história da arquitetura, da indústria dos empreendimentos imobiliários e da propaganda. O período contempla o final da era Vargas, quando país entrava na Quarta República – iniciada em 1946 com a posse de Gaspar Dutra e encerrada em 1964 pelo golpe militar.

Na sequência, entra-se em um núcleo que revela a história de Jurado antes de se embrenhar na construção arquitetônica. Nascido no bairro do Brás, em São Paulo, em 1907, filho de imigrantes espanhóis, ele começou a sua carreira como letrista de cartazes, estandartes, feiras e exposições, na década de 1920. Depois, passou a desenhar estandes para feiras industriais. Acabou se estabelecendo como organizador de grandes eventos, como as exposições Centenário da cidade de Santos e Bicentenário de Campinas.

Fotos da época de neons, luminosos publicitários – que ele desenhava e produzia – e dos estandes que criava para as feiras com novidades da indústria ilustram este núcleo. Aqui se revela quando, em 1946, Artacho decidiu entrar na construção civil ao lado do irmão Aurélio. Os dois construíram casas, pequenos prédios e vilas. Por fim, já entrando na década 1950, criaram a Construtora Monções, fonte de suas obras mais emblemáticas. O primeiro empreendimento foi um conjunto de casas no bairro do Brooklin Novo, na zona sul de São Paulo, no qual a venda dos imóveis incluía telefone e automóvel.

Uma grande maquete comissionada demonstra os edifícios mais importantes do arquiteto e como foram inseridos na topografia de São Paulo e de Santos, formando uma cronologia geolocalizada de seus projetos. É possível imaginar que, no início dos anos 1950,  do edifício Saint Honorè, situado na Avenida Paulista, era possível ver os prédios Cinderela, Piauí e Bretagne, em Higienópolis, de onde, por sua vez, se enxergava o edifício Parque das Hortênsias, e, a partir dele, as construções do Louvre, Viadutos e Planalto, no centro. Uma projeção em vídeo-mapping sobre a maquete traz informações sobre cada um deles e como mudaram a paisagem paulistana, quando a cidade dava os primeiros passos em direção à sua verticalização. 

Outro núcleo revela o conceito de lazer e ócio impregnado por Artacho em seus empreendimentos. Ele foi pioneiro na oferta, no térreo e na cobertura dos projetos, de áreas comuns, onde os moradores poderiam se encontrar e confabular, entre salões de festas, de chá, de música e galerias de arte. Um estilo de vida no gênero american way of life, que era viabilizado com espaço para publicidades e anúncios nas coberturas, barateando o valor do condomínio.

No espaço seguinte, o visitante se depara com o ambiente festivo que embalava as suntuosas inaugurações dos prédios: havia bandas e fanfarras, convidados internacionais, políticos, celebridades, religiosos e apresentações musicais e de dança. A abertura do Edifício Bretagne, por exemplo, contou com apresentações de cortejo de cavalaria e da Escola de Balé de Higienópolis. Teve, ainda, as presenças de Eurlyne Howell, Miss Estados Unidos, e de Odette le Mintier de Léhélec, viscondessa da França. Não por acaso essa arquitetura e glamour de inspiração cinematográfica serviu de cenário para filmes, comerciais e videoclipes, da época em que os edifícios foram construídos até hoje. 

Gramática do arquiteto

Uma parede inteira do espaço expositivo é dedicada ao que os curadores chamam de gramática de Artacho. Ela acolhe um ensaio fotográfico comissionado do fotógrafo Tuca Vieira que revela em detalhes os seus elementos construtivos, propondo uma pesquisa abrangente sobre a estética do arquiteto e seu desenvolvimento no tempo, a partir de alguns de seus edifícios.

Esse estilo foi desenvolvido por ele em um período em que a indústria pregava a padronização de elementos na construção civil, enquanto Artacho propunha uma junção entre o industrial e o artesanal. Assim, ele mesmo desenhava os lustres, os cobogós, as janelas, as escadas, as rampas e os gradis de cada apartamento e de todos os prédios que construiu. O escopo deste núcleo se desdobra em uma publicação, distribuída no balcão de atendimento no piso térreo e na própria Ocupação, com desenhos da ilustradora Juliana Russo, que traduzem em traço, desenho e cor a sua caligrafia projetiva.

Outro espaço nobre da mostra apresenta dezenas de imagens do edifício Parque Verde Mar feitas pelo fotógrafo alemão Hans Günter Flieg. Nascido em 1923, ele é um dos mais versáteis profissionais a registrar o desenvolvimento industrial, arquitetônico e publicitário de São Paulo, quando começava a se anunciar moderna. Com os ensaios fotográficos encomendados por Artacho, ele ressaltou desejos e perspectivas sociais e culturais de toda uma época, demonstrando como a experiência do morar tornou-se uma das principais vitrines da vida moderna, um aspecto em consonância com o modo como o arquiteto projetava e vendia seus edifícios.

A riqueza da proposta construtiva de Artacho também se evidencia nos estudos que realizou para os seus diversos projetos – inclusive aqueles que nunca saíram do papel, como o Edifício Marajoara. O conjunto de documentos inéditos apresentados nessa mostra permite conhecer  as diferentes etapas de um projeto arquitetônico: estudos de volumetria, esboços de ambientes internos, hall, salões, fachadas e terraços, além das perspectivas coloridas utilizadas para apresentar e vender os empreendimentos aos futuros moradores.

SERVIÇO:

Ocupação Artacho Jurado
Visitação: 20 de junho até 15 de setembro
Sala Multiuso – 2º piso

Concepção e curadoria:
Guilherme Giufrida, Jéssica Varrichio e Itaú Cultural

Itaú Cultural
Avenida Paulista, 149, próximo à estação Brigadeiro do metrô

Visitação:
Terça-feira a sábado, das 11h às 20h; domingos e feriados, das 11h às 19h.
Entrada gratuita
Acesso para pessoas com deficiência física
Estacionamento: entrada pela Rua Leôncio de Carvalho, 108.
Com manobrista e seguro, gratuito para bicicletas.

Mais informações:
Tel. (11) 2168.1777; wpp (11) 9 6383 1663
E-mail: [email protected]
www.itaucultural.org.br; www.twitter.com/itaucultural
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  • Data: 19/06/2024 04:06
  • Alterado:19/06/2024 16:06
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