Mobilização da área tecnológica em eventos climáticos extremos
Interdisciplinaridade é marca da atuação de profissionais que lidam com a prevenção e gestão de risco
- Data: 17/10/2024 08:10
- Alterado: 17/10/2024 08:10
- Autor: Redação
- Fonte: Crea-SP
Atuação no Rio Grande do Sul
Crédito:Exército Brasileiro
Bastam algumas horas ou apenas alguns minutos para que cidades inteiras sejam destruídas em eventos climáticos extremos. Há pouco tempo, isso era impensável no Brasil, dada a posição geográfica privilegiada que faz com que o país registre fenômenos de menor impacto, tirando situações específicas que marcam o histórico nacional. Mas, a emergência climatológica tem mostrado que ninguém fica imune aos efeitos devastadores da interferência humana na saúde do meio ambiente.
São inúmeros os acontecimentos que demonstram isso. Entre os mais recentes, um comoveu a população brasileira e boa parte do mundo. A catástrofe que acometeu 475 dos 497 municípios do Rio Grande do Sul, entre o final de abril e início de maio deste ano, é um exemplo trágico de como a mudança do clima torna tempestades, inundações e escorregamentos de terra mais fortes.
A ação combativa que vai na contramão dessa realidade é parte de um engajamento coletivo de mobilização multidisciplinar, em que os profissionais da área tecnológica [Engenharias, Agronomia, Geociências e Tecnologia] estão inseridos e são fundamentais para o sucesso das iniciativas. “As pesquisas científicas desenvolvidas pela comunidade meteorológica têm proporcionado um contínuo aprimoramento dos modelos numéricos. Isto, aliado ao crescente avanço na capacidade computacional, tem permitido previsões com modelos de resolução cada vez maiores”, conta o meteorologista Carlos Raupp, professor do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG/USP) e conselheiro do Crea-SP.
A explicação dada por ele diz sobre o que tem sido feito no âmbito da Meteorologia para antecipar, com mais precisão, os eventos extremos. “As pesquisas científicas também têm levado ao aprimoramento do que chamamos de previsão de curtíssimo prazo (conhecida como nowcasting), que utiliza uma combinação de redes observacionais e técnicas de sensoriamento remoto para proporcionar uma visão mais acurada e imediata das condições atmosféricas”, detalha.
A melhor previsibilidade, porém, não é a única ciência que progride neste sentido. Afinal, é a combinação de soluções e fatores que faz a diferença quando o assunto é resiliência. “A inserção de parques e espaços verdes, e de infraestruturas como os jardins esponjas, projetados para ajudar os municípios a gerenciar a água da chuva, reduzem o risco de inundações e minimizam os efeitos das ondas de calor”, esclarece a engenheira ambiental Profa. Dra. Ana Maria Taddei Cardoso de Barros.
“Aumentar as áreas de infiltração em todos os projetos é a primeira medida, pois a promoção da infiltração já contribui, de forma significativa, na redução do escoamento superficial. Pode-se combiná-la com a implantação de providências que controlem o fluxo de água, como as bacias de retenção e detenção, praças, calçadas verdes, pisos permeáveis e cobertura vegetal, que são alternativas para substituição do concreto”, complementa a docente dos cursos de Engenharia Ambiental e Sanitária, de Engenharia Civil, de Arquitetura e Urbanismo e de Enfermagem, e coordenadora da Pós-Graduação em Saneamento e Meio Ambiente e do EAD de Gestão Ambiental, todos da Fundação Paulista de Tecnologia e Educação do Centro Universitário de Lins (FPTE/Unilins).
O engenheiro civil Prof. Dr. Ricardo Molto Pereira, também da Unilins, acrescenta que onde a inundação é frequente, há ainda a opção de utilizar a técnica de edificações suspensas, também conhecida por palafitas. “Em regiões urbanizadas, o ideal é fazer desde o planejamento urbano até os projetos de infraestrutura, cidades que tenham retenção de águas para suporte aos períodos de seca, assim como sistemas de amortecimento e encaminhamento das águas pluviais de forma controlada compatibilizando sua dinâmica hídrica ao meio ambiente natural e construído”, defende.
Mas, segundo ele, infelizmente isso não acontece e a especulação imobiliária baseada em um sistema viário de mobilidade individual acaba deixando de lado a sustentabilidade a longo prazo. “Precisaríamos, primeiramente, ter uma norma para drenagem, o que, por incrível que pareça, não existe ainda. Esta norma deve possibilitar a inovação, pautada no dimensionamento e modelagem hidráulica e hidrológica”, sugere Pereira.
Voltando à análise meteorológica, a atuação conjunta tem se dado em vários aspectos:
- Na definição de zonas de risco e planejamento de uso do solo de modo a minimizar a exposição da população;
- Na elaboração de planos de gestão de desastres que incluem a elaboração de rotas de evacuação, abrigos temporários, dentre outras medidas de segurança;
- Na adoção de estratégias de mitigação das ilhas de calor urbanas e seus efeitos, tais como a construção de superfícies mais refletivas;
“Cabe ressaltar também que as informações meteorológicas são usadas por engenheiros civis na projeção de edificações resistentes”, menciona Raupp. “Para ter sucesso na combinação das soluções, precisa-se de estudo, projeto e planos específicos”, completa Ana.
O que é feito durante uma emergência
São muitas instituições envolvidas nos eventos climáticos extremos. Quando as intervenções preditivas não são suficientes, o trabalho passa a acontecer durante o estado calamitoso. É aqui que entra a Engenharia Militar, com a missão de mitigação, preparação, resposta (socorro, assistência às populações vitimadas e reabilitação do cenário do desastre) e recuperação.
As forças são divididas entre engenheiros militares combatentes, que possuem formação específica para atuar diretamente em ambientes de combate, com graduação em Ciências Militares; e engenheiros formados pelo Instituto Militar de Engenharia (IME) pertencentes ao Quadro de Engenheiros Militares (QEM), oficiais da linha de ensino militar científico-tecnológica, graduados em diversas áreas da Engenharia, como civil, elétrica, mecânica, entre outras. “No caso das ações de resposta no Rio Grande do Sul, as capacidades do Sistema de Engenharia do Exército (SEEx) contaram com a sinergia e a complementaridade das aptidões e capacidades dessas vertentes técnicas e operacionais”, declara o Ten. Cel. de Engenharia Warley Luiz da Silva.
“Os engenheiros de combate atuaram em tarefas como: abertura de estradas, limpeza de vias e áreas, lançamento de pontes provisórias, operações com embarcações, emprego de equipamentos de engenharia, tratamento de água, construção de obras verticais e serviços ambientais. Já os engenheiros formados pelo IME contribuíram no planejamento e execução de projetos complexos, como a reconstrução de edificações destruídas pelas enchentes, e nos estudos e vistorias técnicas que precedem as futuras obras de reconstrução necessárias à operação de resposta aos desastres”, conclui o tenente coronel.