Governo já esperava reação de facções, diz chefe da Casa Civil do CE

Em entrevista Élcio Batista defendeu declaração de secretário da Administração Penal e disse que segurança pública será 'prioridade absoluta' do governador até o fim da gestão

  • Data: 08/01/2019 11:01
  • Alterado: 08/01/2019 11:01
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Estadão Conteúdo
Governo já esperava reação de facções, diz chefe da Casa Civil do CE

Crédito:José Cruz/Agência Brasil

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Braço direito do governador do Ceará Camilo Santana (PT), o secretário da Casa Civil Élcio Batista disse nesta segunda-feira, 7, que a série de ataques nas ruas em reação ao endurecimento do sistema prisional já era esperada desde o fim de 2018 pela gestão estadual. “(O governo) sabia que na hora que fizesse uma intervenção mais dura dentro do sistema prisional teria provavelmente reações fora e dentro do sistema”, afirmou ao Estado.

Entre as medidas de endurecimento adotadas pelo governo, além do comando da Administração Penitenciária a Luis Mauro Albuquerque, estão ainda a proibição do ingresso de celulares e de visitas íntimas, além da transferência de líderes de facções criminosas. Nesta segunda, o Ceará deu início à transferência de 21 chefes de grupos organizados a presídios federais.

Batista se esquivou ao ser questionado se Albuquerque errou ao declarar que não reconhece as facções e que os presídios deixarão de ser separados segundo os grupos criminosos. De acordo com o secretário da Casa Civil, Mauro, que já foi secretário de Justiça e Cidadania no Rio Grande do Norte, tem “competência técnica e de liderança”.

“O que diz a lei é que existem presos. Ele (Mauro) trata essas pessoas como presos. E vai dar o tratamento que diz o tratamento penal, que reza a lei de Execução Penal”, afirma o braço-direito de Santana. No Ceará, duas facções criminosas se destacam: Comando Vermelho (CV) e Guardiões do Estado (GDE). Até o ano passado, os grupos ligados ao crime organizado eram separados em presídios de acordo com a facção à qual pertenciam.

“Organizamos todas as forças do Estado para que pudéssemos buscar o máximo possível evitar esses ataques. Dentro do sistema prisional, controlamos muito bem”, disse Batista.

Fora do sistema penitenciário, porém, já são seis dias de ataques, com o registro de atentados a órgãos públicos e privados em ao menos 36 municípios de todas as regiões do Ceará. Em Fortaleza, 33 bairros sofreram com os atos. Os ataques, que teriam sido comandados de dentro dos presídios cearenses, atingiram principalmente veículos de transporte público, vans, prédios, fotossensores, lojas, unidades da Polícia Militar, uma passarela e até um viaduto.

O que tem causado essa onda de ataques no Ceará?
As mudanças que temos feito dentro do sistema prisional. São mudanças no sentido de fazer valer a lei de Execução Penal e o Código de Processo Penal, com a entrada dos agentes penitenciários que ocorreram no ano passado, com 1 mil novos agentes, e a conclusão do processo de estabilização do sistema penitenciário que foi destruído em 2016 por conta de greve de agentes. Resolvemos implementar um conjunto de mudanças, como por exemplo a separação de presos condenados e provisórios, a separação de presos baseados nos crimes e na gravidade do delito, o isolamento de líderes faccionados de grupos criminosos do crime organizado que desestruturavam ali e causavam incômodo no sistema penitenciário. Essa série de medidas, ao serem tomadas, acabam criando desconforto diante das situações estabelecidas. E isso provoca, gera uma reação deles fora do sistema prisional. Houve tentativas também dentro do sistema prisional. Conseguimos debelar todas.

O governo do Ceará previu essa série de ataques?
No fim de 2018, já iniciamos ali um trabalho de planejamento para intervenções que começaram no final do ano já dentro do sistema prisional. O próprio anúncio do Mauro (Luís Mauro Albuquerque, secretário de Administração Penal) foi uma delas. Já houve muitas movimentações, muitos comentários e muita informação produzida dentro e fora do sistema penitenciário relacionado com a presença do Mauro. (O governo) sabia que na hora que fizesse uma intervenção mais dura dentro do sistema prisional teria provavelmente reações fora e dentro do sistema. Organizamos todas as forças do Estado para que pudéssemos buscar o máximo possível evitar esses ataques. Dentro do sistema prisional, controlamos muito bem. E fora do sistema, temos buscado trabalhar com inteligência, tecnologia e presença dentro do território dos policiais para minimizar os efeitos dessa reação fora do sistema prisional.

Já havia previsão? O governo já estava mobilizado?
Em qualquer ponto do País que se faça a interferência dentro do sistema prisional no grau que estamos fazendo no estado do ceara você vai ter reação fora do sistema prisional. Isso corre em qualquer estado do País.

Então o volume de ataques e a capilarização para o interior não surpreendeu o governo?
Toda interferência no sistema prisional, na magnitude que passamos a executar, vai ter uma reação. E essa reação estamos buscando minimizar o máximo possível seu impacto e ao mesmo tempo estabilizar no tempo mais curto possível os efeitos fora do sistema prisional.

Toda essa interferência no sistema prisional a que o sr. se refere inclui também a proibição de celulares e de visitas íntimas?
O que está sendo aplicado é justamente o que diz o Código Penal, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal. É isso que está sendo feito. Dentro desse marco do sistema legal, estamos buscando realizar todas as ações necessárias. Celular é proibido dentro das penitenciárias. Não só do Ceará, do Brasil como um todo. Eles entram dentro do sistema prisional principalmente baseado no contato físico que existe do preso com pessoas estranhas ao sistema prisional. Ou com pessoas que atuam dentro do sistema prisional. O que temos que fazer e é o que está sendo feito aqui no Estado do Ceará é cada vez mais ter um sistema prisional em que a comunicação do preso é controlada o máximo possível, respeitando sempre o que diz a lei de execução penal.

Como o governo avalia a declaração do secretário Luís Mauro Albuquerque, ao dizer que não reconhece as facções criminosas e ao prometer acabar com a divisão por facções nos presídios?
O Mauro esteve com a gente aqui em 2016 e nos ajudou naquele momento a controlar as rebeliões que praticamente destruíram o sistema prisional, pelo menos as grandes prisões do Estado. Ele veio, ajudou as forças do Estado a controlar e depois passamos praticamente 2 anos reconstruindo o sistema prisional. O governador vai chamar 650 agentes penitenciários. Isso nos dá condição de seguir o Código de Processo Penal e a Lei de Execuções Penais. Vamos separar os presos provisórios dos condenados, vamos separar os presos baseado no crime cometido, vamos fazer com que dentro do sistema cada vez mais possamos desenvolver atividades educacionais e de trabalho. É isso que objetivamos fazer. O Mauro está aqui justamente para implementar esses procedimentos nesse sistema prisional, dado a capacidade técnica e de conhecimento. E dada a sua capacidade de liderança sobre os agentes prisionais. A experiência dele justamente o leva a se basear muito na lei. O que diz a lei é que existem presos. Ele trata essas pessoas como presos. E vai dar o tratamento que diz o tratamento penal, que reza a lei de Execução Penal.

O secretário errou ao fazer essa declaração?
O Mauro, naquele momento, estava justamente se referindo à questão do preso. A pergunta (feita a ele) era relacionada aos presos. Ele respondeu justamente baseado no que o Judiciário e o Ministério Público reconhecem. Existem presos. E esses presos precisam ser recolhidos quando condenados ou em situação de prisão temporária ao sistema prisional para que eles possam ou responder já em regime de condenação pelos crimes que cometeram ou durante o período em que precisam estar presos durante a evolução de um inquérito.

Então o governo não considera que o secretário errou ao fazer essa declaração?
O Mauro é preparado. Ele tem passagem pelo sistema prisional no Distrito Federal, esteve no Ceará, no Rio Grande do Norte e em outros locais.  E em todos esses locais tem conseguido obter resultado.

O que o governador quis dizer ao afirmar que vai “endurecer” contra o crime organizado?
Vamos aplicar o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal dentro do sistema prisional. Do lado de fora do sistema prisional, vamos buscar ser extremamente rigorosos na aplicação da lei. O endurecimento a que o governador se refere é no sentido da aplicação da lei. Participou de ações do crime organizado, foi identificado, foi feito um relatório mostrando o papel dessa pessoa como liderança ou dentro do sistema prisional no sentido de desestabilizar o sistema? Vamos encaminhar para presidio federais. Dentro do sistema prisional, cometeu infração? Vamos autuar.  Vamos buscar permanentemente dentro do sistema prisional fazer com que os canais de comunicação do presídio para fora cada vez mais possam desaparecer por completo. Mas sabemos das dificuldades, como em qualquer lugar do mundo, de que isso ocorra de forma plena.

Como o Ceará tem lidado para conter o avanço das facções criminosas em 2019?
Desde 2015, a gente vem trabalhando a partir de um diagnóstico que nos foi apresentado à época nessa questão da segurança pública, fazendo os investimentos mesmo diante de uma crise econômica, fiscal e política. E no caso do estado do Ceará, de uma crise hídrica muito forte, o governador resolveu fazer os investimentos lá desde 2015 na contratação de mais efetivo da Polícia Militar, da Polícia Civil, dos Bombeiros, da Perícia Forense, para que a gente pudesse fortalecer a política de segurança pública. Também fazendo investimentos em mais equipamentos, carros, armas, coletes. Foi feito concurso para a Polícia Civil. E será feito um novo concurso para a Polícia Civil. Fizemos investimentos para fortalecer a área de inteligência da Secretaria da Segurança Pública, bem como do sistema prisional.

Apesar de todas essas ações em várias frentes, foi preciso pedir apoio da Força Nacional. Se o governo fez tantos investimentos desde 2015, o que aconteceu?
O que aconteceu é que faz 40 anos que o Brasil não construiu uma política e uma rede de proteção social baseada na educação, saúde, habitação e desenvolvimento urbano, e no apoio às famílias. Isso que é uma rede de proteção social que faz a prevenção ao delito e ao crime. E segundo, nos últimos 40 anos também não se construiu uma política nacional integrada e cooperativa entre a União, os Estados e os municípios na área de segurança pública. Não tivemos nenhuma política de prevenção social efetiva e nem tivemos política de repressão qualificada efetiva. Daí o resultado que você tem hoje do Brasil como um todo. Portanto, os resultados não ocorrerão no curto prazo. São resultados que ocorrerão no médio e longo prazo. Não adianta crermos que há soluções mágicas. As sociedades que conseguiram enfrentar e reduzir a criminalidade trabalharam em duas vertentes: prevenção social e repressão qualificada. Se não tiver as duas ao longo do tempo, com programas, projetos e sem descontinuidade, não consegue atingir os resultados que todos almejam e esperam.

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