‘Foi instinto. Não esperava isso na escola’, diz professora que parou ataque em SP

Docente na Escola Estadual Thomazia Montoro há pouco mais de dois anos, ela conta que agiu intuitivamente quando tentou dominar o agressor

  • Data: 30/03/2023 10:03
  • Alterado: 30/03/2023 10:03
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Estadão Conteúdo
‘Foi instinto. Não esperava isso na escola’, diz professora que parou ataque em SP

Momento em que o agressor é contido pela professora

Crédito:Reprodução/Câmeras de segurança da escola

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Responsável por parar o agressor e evitar uma tragédia ainda maior em uma escola na Vila Sônia, na zona oeste de São Paulo, a professora de Educação Física Cinthia Barbosa, de 37 anos, é ex-jogadora profissional de basquete e já deu aula na Fundação Casa, justamente para onde o adolescente foi encaminhado após o atentado.

“Foi um instinto, não esperava isso (o ataque) em uma escola”, disse Cinthia, em entrevista ao Estadão. Imagens de câmeras de segurança da escola mostram a professora imobilizando o aluno, de 13 anos, com um mata-leão, impossibilitando que ele continuasse a desferir golpes na professora Ana Célia Rosa, uma das quatro pessoas que ficaram feridas – uma outra docente, de 71 anos, não resistiu. Enquanto isso, a coordenadora pedagógica Sandra Mendes retirou a faca da mão do aluno.

Cinthia conta que chegou por volta de 6h50 na escola na segunda-feira, o dia do atentado. Após pegar o material na sala administrativa, foi ministrar uma aula para o 7º ano. Pouco depois, começou a ouvir um barulho alto vindo de fora. “Até pensei que fosse a dinâmica que algum professor estivesse utilizando, porque às vezes a gente faz rodas de conversa entre alunos e afasta as carteiras”, disse. “Mas o barulho não cessava não passava, estava continuando.”

Cinthia fechou a porta e foi correndo em direção às escadas. A professora explica que a escola tem dez salas de aula: cinco no andar de baixo, onde ela estava dando aula, e a mesma quantidade em cima, de onde vinham os gritos.

A professora diz que hesitou por alguns segundos, mas que ainda assim decidiu ir para onde tinham indicado que estava ocorrendo os ataques: na terceira sala do corredor. Segundo a polícia, o atentado teve início por lá – onde a professora Elisabeth Tenreiro foi assassinada -, depois o agressor teria se dirigido para uma segunda sala e, na sequência, voltado para o local onde tinha começado.

ALUNO

“Fui lá e, quando olhei de frente, vi a professora Elisabeth deitada no chão. E a Ana Célia estava com ele, que estava segurando a Ana Célia e esfaqueando a professora”, disse Cinthia. “Aí eu tentei parar, fui por trás e segurei ele. E aí minha coordenadora, Sandra Mendes, já entrou na sequência. Aí falei para ela: ‘Tira a faca, tira a faca, tira a faca’. Ela tirou a faca dele e abaixou a máscara. Retirou a touca e viu que era nosso aluno.”

Essas imagens foram capturadas por câmeras de segurança da escola. Cinthia conta que, na sequência, ela e o aluno se desequilibraram e caíram no chão, mas a professora continuou o imobilizando. “Perguntei para ele: ‘Você tem mais alguma coisa? Está com mais alguma arma?’. Ele falou não. Perguntei se estava sozinho, ele disse que sim. Aí já levantei e levei ele lá para fora para a gente descer para a sala da direção da escola.”

A professora disse ter mantido o aluno por lá até a chegada da Polícia Militar, minutos depois. Nesse meio tempo, Cinthia disse que foram poucas as palavras que o aluno disse. “Eu lembro que algumas coisas ele até falou, que queria vingança por causa de bullying, ele falava que já queria fazer isso por algum problema com a família, alguma coisa assim ele falou”, afirmou.

Cinthia conta que, quando entrou na sala de aula para conter o agressor, não conseguiu determinar qual era o estado de saúde das professoras. “Eu só queria tirar ele dali, fui para tirar ele dali. Não me atentei de fato se a professora Beth (Elisabeth Tenreiro) estava desmaiada”, disse.

Só depois, conta a professora, ela foi ter dimensão do que tinha acontecido na escola. Um dia depois do enterro de Elisabeth Tenreiro, ela relembra da professora com carinho. “Ela era bastante comunicativa, a gente se falava sempre”, diz. “Logo que ela entrou na escola, estava sem armário ainda. E eu falava para ela para pôr as coisas no meu. Aí a gente compartilhou por um tempo o armário.”

HEROÍNA

Ainda na segunda, após a repercussão das imagens de Cinthia e Sandra contendo o agressor, o secretário de Segurança Pública de São Paulo, Guilherme Derrite, chamou as duas de “heroínas”. “Eu não me enxergo dessa forma. Acho que a nossa função como professora é poder estar auxiliando os alunos em tudo que é possível”, diz ela, que descreve o autor dos ataques como introspectivo.

Antes de lecionar, ofício que exerce há quase cinco anos, Cinthia dedicou a carreira ao basquete e deu aulas na Fundação Casa, para onde o agressor foi encaminhado. Cinthia diz que não pretende se deixar desanimar de dar aula. “Eu penso que eu tenho que ter força. A gente cria planos, cria sonhos, infelizmente esse é um processo muito grande”, diz. “Voltar depois do que aconteceu não é uma readaptação tão simples. Eu perdi uma companheira de trabalho diretamente. Não posso falar que vai ser fácil, que vai ser difícil, mas eu estou disposta a tentar.”

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