Comissão da Câmara favorece Lira e indica a Alagoas mais emendas do que a 19 estados juntos
Prefeituras e o governo alagoano devem ser o destino de cerca de R$ 320 milhões, do total de R$ 1,1 bilhão em emendas disponíveis nesta comissão, presidida pelo deputado José Rocha (União Brasil-BA).
- Data: 04/07/2024 17:07
- Alterado: 04/07/2024 17:07
Crédito:Zeca Ribeiro /Câmara dos Deputados
A Comissão de Integração Nacional e Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados favoreceu Alagoas na divisão das emendas parlamentares de 2024. O estado é a base de Arthur Lira (PP-AL), presidente da Câmara e que mantém controle sobre as negociações de verbas das comissões.
Prefeituras e o governo alagoano devem ser o destino de cerca de R$ 320 milhões, do total de R$ 1,1 bilhão em emendas disponíveis nesta comissão, presidida pelo deputado José Rocha (União Brasil-BA).
O valor supera a soma da verba indicada pelo mesmo colegiado a 19 outros estados.
Arthur Lira (PP-AL) entrega kits agrícolas comprados pela estatal Codevasf em Campo Alegre, no interior alagoano, em abril, com verba de emendas parlamentares Reprodução Arthur Lira no Instagram O deputado está em pé, sozinho, em um campo de futebol cercado por equipamentos **** O governo Lula (PT) não é obrigado a empenhar e pagar as indicações, mas há acordo político firmado com o Congresso para atender as emendas de comissões -no total, há cerca de R$ 15,5 bilhões reservados no Orçamento para isso em 2024.
Com os acordos, o governo busca garantir apoio nas votações de projetos de interesse.
Dados obtidos pela Folha mostram que o estado e municípios da Bahia são o segundo principal destino das verbas indicadas pelo colegiado, com cerca de R$ 170 milhões.
Caso todas as indicações sejam seguidas pelo governo, as emendas ao Rio Grande do Sul devem somar R$ 30 milhões. Mesmo atingido por fortes chuvas em maio, o estado é o 12º no ranking da verba solicitada pela comissão.
Entre as atribuições da comissão, está o debate sobre planos nacionais e regionais de ordenação do território e políticas de combate às calamidades.
Nesta quarta-feira (3), uma caravana de prefeitos do Rio Grande do Sul realizou um protesto em Brasília para cobrar do governo federal recursos para uma recomposição da perda que o estado deve registrar na arrecadação com ICMS por conta da destruição provocada pelas enchentes.
No fim da lista enviada pela comissão está Mato Grosso, beneficiado com menos de R$ 1 milhão em indicações.
O Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional empenhou cerca de R$ 430 milhões da verba solicitada pelo colegiado comandada por Rocha. O empenho é a etapa que antecede o pagamento de uma emenda.
Os pedidos da comissão são entregues ao ministério com indicações de qual órgão deve executar a verba, o tipo de serviço que deve ser feito e qual município ou entidade, como associações de moradores, será beneficiado. Os documentos não apontam os padrinhos políticos dos recursos.
O dinheiro das comissões foi turbinado com o fim das emendas de relator, um tipo de indicação parlamentar que se tornou símbolo das negociações entre governo e Congresso na gestão Jair Bolsonaro (PL).
Mas, ainda que o STF (Supremo Tribunal Federal) tenha declarado inconstitucional esse tipo de prática no fim de 2022, a distribuição dos recursos das comissões mantém a baixa transparência observada anteriormente.
Os dados disponíveis em portais da transparência não permitem apontar qual parlamentar é o padrinho desse tipo de emenda. Apenas no caso das indicações individuais a autoria é revelada.
Além disso, parte dos empenhos não aponta nem sequer qual município receberá o equipamento ou obra contratada com a indicação parlamentar.
Questionado, o ministério não confirmou os pedidos de distribuição de verbas que recebeu da comissão da Câmara. Também não se manifestou sobre o privilégio a Alagoas.
Em nota, a pasta comandada pelo ministro Waldez Goés disse que “a indicação dos beneficiários das emendas é de competência exclusiva dos autores”. Ainda afirmou que as informações sobre os padrinhos das verbas devem ser buscadas com “respectivos titulares”.
O deputado José Rocha não respondeu aos questionamentos da Folha. A verba indicada pela comissão é usada principalmente para compra de maquinário, como tratores, e obras de pavimentação.
Lira também não quis se manifestar sobre a verba direcionada a Alagoas. Com controle sobre as negociações dessas verbas, ele repassa o valor acordado com o líder de cada partido, que depois transfere aos deputados. Esse modelo foi apelidado de pizza na Câmara, como revelou a Folha de S.Paulo.
Na prática, avaliam parlamentares, essas emendas estão sendo usadas para replicar o modelo das extintas emendas de relator.
Parte dos recursos será executada pela estatal federal Codevasf e no Dnocs (Departamento Nacional de Obras Contra as Secas). Os dois órgãos foram entregues pelo então presidente Bolsonaro ao centrão, com aval de Lira, e mantidos dessa forma por Lula.
Em nota, a Codevasf diz que já recebeu indicações de R$ 256 milhões da comissão. Nesse recorte, o estado e municípios da Bahia são os maiores beneficiados, com R$ 71,3 milhões.
Há cerca de R$ 52 bilhões disponíveis no Orçamento de 2024 para emendas parlamentares -divididas nas modalidades individuais, das bancadas estaduais e das comissões da Câmara e do Senado. Cerca de R$ 34 bilhões foram empenhados e o governo desembolsou R$ 16 bilhões até esta quarta-feira (3).
Os dados obtidos pela reportagem ainda apontam que a comissão pediu para o governo direcionar cerca de R$ 90 milhões a Minas Gerais, R$ 80 milhões ao Ceará e R$ 50 milhões para São Paulo e ao Maranhão.
A Comissão de Saúde da Câmara é a que tem mais verba de emendas em 2024, cerca de R$ 6 bilhões. O presidente do colegiado, Dr. Francisco (PT-PI), chegou a prometer em entrevista à Folha que apontaria os padrinhos das emendas, o que não foi feito.
A prioridade do Congresso tem sido atender seus redutos eleitorais, não as localidades de maior demanda no país.
O governo acelerou e ampliou o total de verbas pagas porque a Justiça determina que elas só podem ser liberadas até 6 de julho, três meses antes do primeiro turno das eleições, marcadas para 6 de outubro.
A legislação eleitoral determina uma série de vedações ao governo federal e ao presidente Lula nesse período –por exemplo, a inauguração de obras federais.