Quando existe um arco-íris entre o Outubro Rosa e o Novembro Azul

Campanhas de prevenção à saúde são também um alerta para população trans, travestis e pessoas não binárias

  • Data: 15/11/2022 08:11
  • Alterado: 15/08/2023 19:08
  • Autor: Redação
  • Fonte: ID8
Quando existe um arco-íris entre o Outubro Rosa e o Novembro Azul

Quando existe um arco-íris entre o Outubro Rosa e o Novembro Azul

Crédito:Divulgação

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Desde 2003, o mês de novembro é conhecido mundialmente por ações relacionadas à prevenção e ao diagnóstico precoce do câncer de próstata. No Novembro Azul, homens são incentivados a realizar exames preventivos que podem identificar a doença, além de infecções sexualmente transmissíveis (ISTs). Porém, é preciso abordar os cuidados para a saúde dentro de uma perspectiva integral, sem restringi-los a essas doenças. Embora ocorra há quase 20 anos, a campanha falha ao não abordar na saúde a questão de gênero, ao excluir outras pessoas que também possuem próstata, como mulheres trans (se identificam como sendo do gênero feminino embora tenham sido biologicamente designadas como pertencentes ao gênero masculino ao nascerem), travestis (o termo engloba pessoas que têm uma identidade de gênero feminina, mas que não se entendem como mulheres trans) e pessoas não binárias (que não se reconhecem dentro das identidades de gênero masculina ou feminina) que necessitam de acompanhamento médico para aumentar suas chances de cura. 

Essa invisibilização pode ser observada até mesmo na simbologia da campanha. O famoso bigode divulgado pelo Novembro Azul remete a homens cisgêneros (que se identificam com o gênero designado no nascimento). O problema também está presente no Outubro Rosa – focado na prevenção e diagnóstico do câncer de mama em mulheres cisgêneros, mas todas as pessoas correm o risco de desenvolver a doença, incluindo homens trans, travestis e pessoas não binárias. Com a marginalização desses públicos nas campanhas, os riscos do diagnóstico tardio aumentam.  

“O acompanhamento da saúde sexual da população deve ser realizado na sua totalidade, independente do gênero ou orientação sexual da pessoa, e sem qualquer tipo de preconceito por parte dos profissionais da saúde. Infelizmente, devido à marginalização, há menos diagnósticos precoces de ISTs tratáveis. Uma vez que essa população figura como um grupo de risco para ISTs, em face da invisibilidade e preconceito a que está submetida, as ações de rastreio e monitoramento das ISTs acabam sendo deixadas de lado. Devemos lembrar que geralmente as ISTs são assintomáticas e a falta de um diagnóstico rápido e preciso leva a uma maior taxa de transmissão e possíveis complicações clínicas. É dever da área da saúde garantir um diagnóstico precoce de diversas doenças. Entre elas, o câncer de colo uterino, causado pelo HPV, que pode acometer Homens Trans, mas isso não exclui o rastreio e acompanhamento de todas as demais ISTs relacionadas à saúde sexual”, comenta Rodrigo Faitta Chitolina, coordenador e responsável técnico do ID8 – Inovação em Diagnóstico. 

Além disso, os dados dos órgãos de saúde também não possuem recorte de gênero. Segundo o Ministério da Saúde, o câncer de próstata é o mais comum entre os homens e causa a morte de 28,6% da população masculina. Em 2021, a doença resultou no óbito de 16.055 homens, o que corresponde a cerca de 44 mortes por dia. Neste ano, são esperados 65.840 novos casos da doença, de acordo com o Instituto Nacional do Câncer (Inca). Em um mundo onde há uma pluralidade de corpos, é natural questionar onde estão as travestis, as mulheres trans e as pessoas não binárias nesses dados.

Discriminação e desinformação

Mesmo com o avanço das políticas públicas, há diversos empecilhos para que esses grupos tenham acesso a um atendimento de saúde adequado às suas necessidades, aponta Carine V. Tellier, trabalhadora da saúde, graduanda em Saúde Coletiva pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e voluntária da ONG Outra Visão, que luta pela promoção da cidadania e dos direitos humanos da população LGBTQIA+ em Porto Alegre e região metropolitana no Rio Grande do Sul: “A primeira barreira que uma pessoa trans encontra no serviço de saúde é o acolhimento a suas especificidades, ou seja, a atenção do profissional de saúde à sua identidade de gênero e à orientação sexual, o respeito ao nome social, questões centrais dessa população específica. Outro problema é o horário de atendimento e de marcação de consultas. Precisamos entender o contexto social da população trans, que é absolutamente marginalizada e cuja manutenção da vida ainda está bastante relacionada à exploração sexual desses corpos, o que também reforça o estigma de pensar saúde para este grupo apenas no combate às ISTs”.

“Quando entendo que essa população é segregada do ponto de vista social e que para a manutenção da vida o que resta é o trabalho sexual, compreendo que esse grupo tem particularidades, como hábitos e horários distintos, a oferta de vagas e a marcação da consulta no serviço de saúde precisa considerar essas questões, sob pena de estarmos excluindo do cuidado toda uma população. É preciso construir alternativas para receber as pessoas no serviço público de saúde de acordo com a sua realidade. Isso passa por um acolhimento e pela compreensão de como esse grupo funciona e dialoga com a premissa de Equidade no SUS”,  ressalta.

Segundo levantamento da ONG ANTRA, sobre o Novembro Azul, não há registros no Brasil de serviços especializados de Urologia para a população trans. No Rio Grande do Sul, a articulação neste sentido se dá a partir da iniciativa da comunidade trans que, através da ONG HTA mapeia profissionais que oferecem atendimento humanizado aos homens trans. Porém, quando há necessidade de referenciamento para a rede pública ficam à mercê da sorte, tendo o medo rondando mais esse aspecto de sua vida.

Outros graves problemas são a transfobia e a desinformação de profissionais e de outros usuários dos serviços de saúde. O psicólogo Beti Mazalotti é um homem trans e trabalha no Grupo Dignidade, que atua na defesa e promoção da cidadania e dos direitos humanos da população LGBTQIA+. Ele já deixou de ir a consultórios médicos devido à discriminação e ao despreparo dos profissionais. “Às vezes, eu me percebo deixando minha saúde física muito de lado. Tenho que me policiar para marcar médico, ir às consultas. Dá medo de sofrer transfobia, apesar de eu estar em um lugar de privilégio muito grande porque tenho acesso a plano de saúde. É muito assustador para uma mulher trans, para uma travesti ou para uma pessoa não binária que tem próstata ir a um urologista, assim como, para mim, é assustador marcar uma consulta ginecológica. Nunca sabemos o que esperar. Há muitos relatos de violência médica, é muito ruim marcar com um profissional e não saber se será respeitado. Isso impacta muito a saúde mental”, desabafa.

“Imagine a dificuldade desta pessoa se dirigir a um posto de saúde e esperar pelo atendimento médico, a dificuldade começa já no preenchimento de um cadastro, no olhar de uma atendente, no chamar de uma enfermeira, e finaliza com o atendimento médico e nem sempre os médicos estão preparados pra isso. Não existe um preparo dos profissionais para atendimento a estas pessoas. A gente foi treinado para classificar as pessoas como masculino e feminino e quando se fala em feminino, você tem um fenótipo feminino, e no masculino, da mesma forma. Quando aquilo não se encaixa fisicamente você tem muita dificuldade em aceitar aquilo, sem contar com a formação, e a falta de informação, existe toda a parte de preconceito, seja religioso, de achar que não é de Deus, que é sem vergonhice, que é doença, então esse é o real motivo da paciente ter dificuldade de acesso”, complementa José Carlos Martins, cirurgião e diretor da clínica Transgender Center Brazil, especializada no atendimento de pacientes trans em transição. 

Cuidados preventivos

No caso do câncer de mama, é importante que mulheres trans, travestis e pessoas não binárias de qualquer idade apalpem as mamas para identificarem possíveis alterações. Caso seja identificado algum nódulo sólido, é preciso procurar um médico com urgência. Para as mulheres trans, travestis e pessoas não binárias a partir de 40 anos, a mamografia e o exame ginecológico com a realização de papanicolau precisam ser realizados anualmente. Além da consulta anual ao ginecologista, é importante evitar tabagismo e relações sexuais desprotegidas, manter alimentação saudável e praticar atividades físicas com regularidade para manter a saúde em dia.

Existem alguns cuidados importantes para evitar o câncer de próstata: adotar uma alimentação saudável, manter o peso corporal adequado, praticar atividade física, não fumar, evitar o consumo de álcool e realizar exames de prevenção. Recomenda-se que pessoas com mais de 50 anos (ou 45 se existirem casos de câncer de próstata na família) façam o exame anualmente. Um deles é o toque real, que sinaliza se há alguma alteração na próstata. Caso isso seja detectado, o urologista pode solicitar outros exames para confirmar o diagnóstico, como o Antígeno Prostático Específico (PSA), o ultrassom transretal e a biópsia da glândula. 

Vale enfatizar que travestis e mulheres trans devem fazer a prevenção mesmo que tenham realizado a cirurgia de redesignação sexual. “Os exames para prevenção são os mesmos de qualquer pessoa cisgênero, o que vai mudar é a particularidade de uma mulher trans redesignada, que ao invés de fazer o toque retal para exame de próstata, acaba fazendo o toque vaginal, que se encontra mais perto da próstata e de mais fácil manipulação. O restante é igual aos exames de qualquer pessoa”, diz José Carlos Martins.

ISTS

A Cartilha Mitos e Verdades sobre a saúde da população LGBTIA+, elaborada pelo Grupo de Trabalho de Gênero, Sexualidade, Diversidade e Direitos da Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, ressalta que se comparado à população em geral, o grupo têm maior risco de desenvolver problemas de saúde devido à estigmatização, ao estresse causados pelo preconceito e à falta de capacitação e atualização dos profissionais que não sabem atender suas especificidades. Consequentemente, todos esses grupos têm menos acesso a serviços de saúde e recebem assistência insatisfatória. Além do sofrimento mental que pode causar maiores índices de ansiedade, depressão, suicídio e outros transtornos, há maior vulnerabilidade às infecções sexualmente transmissíveis (ISTs) como clamídia, sífilis, HPV, gonorreia, HIV e AIDS.

Diariamente, surgem 1 milhão de novos casos de IST no mundo entre pessoas de 15 a 49 anos, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). Por isso, é importante ir ao urologista pelo menos uma vez ao ano e realizar exames preventivos que façam o diagnóstico preciso dessas infecções, o que auxiliará na definição do melhor tratamento e reduzirá o risco de complicações. O ID8 – Inovação em Diagnóstico possui três exames que detectam as ISTs mais comuns e podem orientar a conduta médica: o IST Start 7 patógenos, o IST Plus 11 patógenos e o Painel HPV. O primeiro detecta 7 patógenos que causam ISTS, como o Chlamydia trachomatis (bactéria causadora da clamídia) e a Neisseria gonorrhoeae (bactéria causadora da gonorreia). Já o segundo exame consegue detectar até 11 patógenos, incluindo treponema, causadora da sífilis. 

Pelo menos 13 tipos de HPV têm potencial oncogênico e podem causar diferentes tipos de câncer. Entre eles, estão o câncer peniano e o câncer anal. O Painel HPV é um exame molecular que realiza identificação e genotipagem de 35 tipos de HPV com alta precisão e agilidade, pois o resultado sai em poucas horas. É fundamental identificar os tipos de HPV, mesmo em casos assintomáticos, pois isso permite que o médico saiba o risco para o desenvolvimento de câncer e consiga proporcionar os cuidados necessários para todos os pacientes.

“Mais do que a disponibilização dos exames em formato de painéis moleculares, onde uma única amostra detecta vários patógenos, o modo de serviço do iD8 é o principal diferencial. Nosso fluxo de serviço de diagnóstico garante a liberação do laudo em poucas horas, não excedendo 24 horas. Nesse cenário, os médicos terão em mãos um laudo e poderão disponibilizar aos seus pacientes um tratamento personalizado e assertivo, evitando tratamentos empíricos, que aumentam a possibilidade de seleção de organismos resistentes. Com um diagnóstico assertivo e tratamento adequado, o acompanhamento da população é muito mais efetivo e rápido, não precisando submeter a população Trans a consultas recorrentes devido a uma IST não diagnosticada e não tratada de forma correta, por exemplo”, finaliza Chitolina, do ID8.

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  • Data: 15/11/2022 08:11
  • Alterado:15/08/2023 19:08
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