Brasil Enfrenta Proposta da União Europeia sobre Taxação de Emissões Marítimas
Governo alerta sobre impactos no comércio e PIB até 2050.
- Data: 01/01/2025 08:01
- Alterado: 01/01/2025 08:01
- Autor: redação
- Fonte: Folhapress
Crédito:Reprodução
A delegação brasileira na Organização Marítima Internacional (IMO) está mobilizada para contestar uma proposta da União Europeia que visa a taxação de todas as emissões de gases de efeito estufa provenientes de navios, incluindo aqueles que operam em rotas nacionais. O governo brasileiro argumenta que essa medida resultaria em um aumento significativo nos custos dos produtos exportados pelo país, potencialmente impactando negativamente o Produto Interno Bruto (PIB).
No ano anterior, a IMO estabeleceu um compromisso para eliminar gradualmente as emissões do setor marítimo até 2050, com um objetivo intermediário de redução de 40% das emissões até 2030, em comparação com os níveis de 2008.
Para alcançar essa meta, a IMO propõe a implementação de uma taxa sobre as emissões de cada embarcação. Inicialmente, o Brasil se posicionou contra essa taxação, mas foi minoria na votação. Atualmente, o país busca alinhar-se com outras nações em desenvolvimento para enfraquecer uma proposta que considera prejudicial ao comércio e à competitividade de suas mercadorias.
Uma decisão definitiva sobre o assunto está prevista para abril. Antes disso, encontros das delegações da IMO estão agendados para fevereiro e março em Londres, onde discutirão esse tema crucial.
A proposta europeia defende que todas as emissões dos navios sejam taxadas, independentemente das metas estabelecidas pela IMO. Com isso, estima-se que o custo por tonelada de CO2 fique entre US$ 100 (R$ 618) e US$ 350 (R$ 2.163), com os recursos gerados destinados ao desenvolvimento de tecnologias para descarbonização do setor. Essa iniciativa conta com o apoio de pequenos estados insulares em desenvolvimento, que são altamente vulneráveis às mudanças climáticas.
Em contrapartida, o Brasil sugeriu que a tributação se aplicasse apenas às emissões que excedem a meta estabelecida. Por exemplo, se a meta fosse de 100 toneladas por navio e a embarcação emitisse 110 toneladas, a taxação incidira apenas sobre as 10 toneladas excedentes. Essa alternativa tem o respaldo de aproximadamente dez países, incluindo China, Egito, Bangladesh e Togo, além do apoio da Noruega entre as nações desenvolvidas.
Dada a composição da União Europeia com 27 países e seu suporte por diversas nações desenvolvidas e pelas ilhas afetadas pelo aquecimento global, é incerto se a proposta brasileira ganhará tração. O Brasil acredita que fortalecer alianças contrárias à abordagem europeia poderá facilitar negociações futuras. A divisão nas discussões seria prejudicial à credibilidade da IMO, que também aborda questões relacionadas à segurança marítima.
Para sustentar sua posição, a delegação brasileira tem apresentado estudos a outros países em desenvolvimento sobre os impactos econômicos da taxação integral das emissões. Um levantamento realizado pela Universidade de São Paulo (USP) indica que as economias emergentes exportadoras de commodities seriam as mais impactadas pela medida, enquanto alguns países desenvolvidos poderiam se beneficiar.
O estudo revela que uma taxação de US$ 50 (R$ 309) por tonelada de CO2 poderia resultar numa diminuição global do PIB real em até 0,04% em relação aos dados de 2014. Quando analisados os efeitos por região, os países africanos seriam os mais afetados: uma queda de 0,087% no PIB da região oriental do continente e reduções variando entre 0,067% e 0,010% nas demais regiões africanas. Em contrapartida, países da América Central e do Sul apresentariam uma diminuição estimada em 0,016%, semelhante à registrada no sudeste asiático.
Os dados apontam que apenas as nações europeias teriam um pequeno aumento no PIB de aproximadamente 0,004%. Essas disparidades ocorrem devido ao impacto das taxas sobre os principais produtos exportados por cada país. Para o Brasil, commodities como soja, petróleo e minério de ferro são majoritariamente direcionadas à China. A longa distância percorrida pelos navios resulta em maiores emissões de CO2 e faz com que essas exportações sejam severamente afetadas pela proposta europeia.
A elevação dos custos do frete poderá alterar significativamente cadeias globais de suprimentos; por exemplo, a Vale enfrenta concorrência direta com mineradoras australianas no mercado chinês. Se os custos para transportar minério do Brasil aumentarem consideravelmente devido às novas taxas, há o risco de que os importadores chineses optem por adquirir mais minério australiano.
Além disso, essa taxação pode representar um ônus adicional para o transporte marítimo de mercadorias com baixo valor agregado—predominante nas exportações dos países em desenvolvimento—já que a tributação é calculada com base na distância percorrida e não no preço do produto.
Até mesmo rotas marítimas nacionais podem ser afetadas pelas discussões atuais na IMO—a cabotagem está entre os pontos contestados pelo Brasil. Luís Resano, diretor-executivo da ABCA (Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem), destaca: “Na navegação curta, os navios frequentemente entram e saem dos portos; o tempo gasto nesse processo gera emissões adicionais”. Ele enfatiza a necessidade de proteger a navegação doméstica dessas taxas.
Agora, a delegação brasileira se prepara para negociar um entendimento com representantes europeus e das ilhas em desenvolvimento. O objetivo é encontrar uma estrutura tributária que não penalize excessivamente as nações menos desenvolvidas enquanto ainda possibilita a criação de um fundo robusto. Parte desse fundo será destinada aos pequenos estados insulares afetados pelas mudanças climáticas—uma questão central no apoio contínuo desses países à proposta da UE.
Flávio Mathuiy, assessor da Comissão Coordenadora do Brasil para Assuntos da IMO, declara: “Nosso posicionamento é contrário a qualquer medida cujo foco seja apenas gerar receita; buscamos soluções que incentivem a transição energética”. Contudo, ele observa que o valor arrecadado será fundamental para atender às necessidades dos pequenos estados insulares e garantir uma transição efetiva.