Naomi Klein e a Crise de Identidade no Contexto Político Atual
Naomi Klein enfrenta dilema de identidade e crítica ao neoliberalismo em "Doppelgänger"; descubra as lições para a esquerda e o futuro da democracia.
- Data: 22/01/2025 02:01
- Alterado: 22/01/2025 02:01
- Autor: redação
- Fonte: Folhapress
Crédito:Divulgação
Naomi Klein, renomada intelectual canadense, tem enfrentado um dilema de identidade que transcende questões pessoais e se insere no campo político. O que inicialmente parecia ser uma simples confusão de identidade evoluiu para uma sensação de desorientação profunda, à medida que a autora se via submersa em um redemoinho de debates ideológicos.
Considerada uma das vozes mais influentes da esquerda na América do Norte, Klein frequentemente é confundida com sua homônima, Naomi Wolf. Essa confusão não é surpreendente, pois ambas compartilham semelhanças físicas e ideológicas, além de terem surgido em períodos semelhantes. Enquanto Klein se destacou por suas críticas contundentes ao neoliberalismo em obras como “Sem Logo” e “A Doutrina do Choque”, Wolf ganhou notoriedade com “O Mito da Beleza”, que critica as imposições sociais sobre o corpo feminino.
A situação se complicou quando Wolf começou a ser vista como uma figura cada vez mais afastada dos princípios progressistas, adotando teorias conspiratórias que a distanciaram dos fatos históricos e científicos. Essa transformação alarmou Klein, que observou a evolução de Wolf para um símbolo do negacionismo climático e da pandemia, especialmente após sua participação no podcast “The War Room” de Steve Bannon, estrategista próximo a Donald Trump.
No seu livro mais recente, intitulado “Doppelgänger”, Klein explora sua experiência pessoal e analisa as táticas que o trumpismo empregou para atrair eleitores, imitando algumas estratégias tradicionais da esquerda. A autora argumenta que esse fenômeno reflete uma mudança alarmante nas democracias contemporâneas, descrevendo essa fase como a parte mais aterrorizante de sua “jornada doppelgänger” — um termo que refere-se a pessoas com aparência similar.
Klein sugere que tanto indivíduos quanto nações podem ter seus próprios “gêmeos sinistros”. Para ela, o crescimento da extrema direita representa um “irmão gêmeo ubíquo das democracias liberais ocidentais”, resultando em versões sombrias do nosso coletivo.
O lançamento recente do livro no Brasil destaca a sensação crescente de desconfiança sobre o que é real e o que não é, um fenômeno que Klein descreve como um “jet lag coletivo”. Em entrevista à Folha, a autora refletiu sobre os erros do campo progressista, particularmente após a eleição de Trump, e discutiu as estratégias da direita para conquistar novos eleitores.
Segundo Klein, a nova direita emergente após o neoliberalismo carece de um projeto econômico claro. Embora promova discursos antielitistas, suas políticas frequentemente beneficiam as elites. Essa incoerência permite à direita formar coalizões explorando os descuidos da esquerda, já que figuras como Bannon estudam cuidadosamente os temas negligenciados pela esquerda tradicional.
A autora critica o comportamento dos partidos de esquerda, sugerindo que eles tendem a ser mais críticos com seus eleitores em comparação com a direita. O Partido Democrata, por exemplo, é descrito por Klein como dominado por uma elite educada que teme o populismo progressista, como o representado por Bernie Sanders. Para Klein, é vital que uma esquerda robusta enfrente o fascismo emergente em tempos de crise sistêmica.
Discutindo como a esquerda pode recuperar esses eleitores sem comprometer suas convicções fundamentais sobre questões climáticas e sociais, Klein enfatiza a importância de não rotular os votantes como “direitistas”, mas sim reconhecê-los como cidadãos que podem flutuar entre diferentes ideologias dependendo do contexto político.
A autora também aponta para uma crise espiritual na sociedade contemporânea e propõe que líderes carismáticos são necessários para guiar as pessoas através dessas intersecções de crises. Ela menciona o papel crucial das narrativas apocalípticas presentes nas tradições religiosas ao analisar o crescimento da ultradireita no Brasil.
Por fim, na obra “Doppelgänger”, Klein divide a sociedade entre um “mundo real” e um “mundo espelho”, destacando como essa polarização pode obscurecer as semelhanças entre diferentes grupos políticos. Ela conclui que tanto à direita quanto à esquerda há uma falta de autocrítica que impede avanços significativos nas lutas sociais e climáticas.
DADOS BIOGRÁFICOS:
Klein nasceu em Montreal e é reconhecida por suas obras críticas ao consumismo e às crises sociais. Atualmente, ocupa cargos acadêmicos na Universidade da Colúmbia Britânica e Rutgers nos Estados Unidos e contribui regularmente para publicações como The Guardian.