Boulos e Nunes disputam termo frente ampla em estratégias opostas em SP
PT e PSOL querem nacionalizar pleito municipal, enquanto MDB dilui Bolsonaro entre outros apoios
- Data: 18/02/2024 08:02
- Alterado: 18/02/2024 08:02
- Autor: Redação
- Fonte: Carolina Linhares/Folhapress
Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB)
Crédito:Vinicius Loures/Câmara dos Deputados; e Isadora de Leão Moreira/Governo do Estado de SP
A disputa entre Guilherme Boulos (PSOL) e Ricardo Nunes (MDB) pelo uso do termo “frente ampla” na corrida pela Prefeitura de São Paulo expõe a estratégia oposta em relação à nacionalização da eleição municipal.
“Nós temos é que trazer essa frente ampla democrática para derrotar os extremistas, para derrotar os autoritários”, disse Boulos em ato no último dia 2.
“A gente tem uma frente ampla, uma verdadeira frente ampla no processo eleitoral com várias forças políticas e vários partidos”, afirmou Nunes no dia anterior, em evento na zona leste.
Com o apoio do presidente Lula (PT) e do PT, Boulos quer replicar a lógica que elegeu o petista em 2022 – a criação de uma aliança de partidos e personalidades unidos pelo objetivo de evitar a ameaça à democracia imposta por Jair Bolsonaro (PL). Até o MDB de Nunes integrou o movimento no segundo turno, com o apoio de Simone Tebet (MDB) a Lula.
A tática da esquerda se ancora no apoio declarado de Bolsonaro a Nunes e foi resumida por Lula no último dia 23, quando o petista declarou que em São Paulo haveria uma “confrontação direta entre o ex-presidente e o atual presidente, é entre eu e a figura”. Para os petistas, a reeleição de Lula em 2026 seria impulsionada pela vitória na capital paulista.
Em reação à frente ampla de Boulos contra o bolsonarismo, os emedebistas pregam representar o que dizem ser a verdadeira frente ampla contra o que chamam de extrema esquerda e em defesa da cidade, já que eles têm a expectativa de reunir 12 partidos na coligação de Nunes.
São siglas da centro-esquerda à direita, incluindo algumas da base do governo Lula: MDB, PL, PP, Republicanos, União Brasil, PSD, PSDB, Cidadania, Solidariedade, Podemos, Avante e PRD (fusão do PTB e do Patriota).
Boulos por sua vez tem uma coligação de centro-esquerda, com PSOL-Rede, PDT e PT-PV-PC do B.
Na cidade de São Paulo, Lula venceu Bolsonaro por 53,54% a 46,46% e, por isso, a pré-campanha de Boulos vê vantagem na repetição desse embate em outubro, apostando no domínio do eleitorado progressista e na alta rejeição ao ex-presidente na capital.
Por essa mesma razão Nunes busca o contrário – descolar o pleito municipal da polarização nacional e colocar a gestão no centro do debate.
O desafio do emedebista é atrair o voto dos bolsonaristas anti-Boulos sem se tornar um representante da extrema direita, principalmente depois do desgaste de Bolsonaro como alvo da operação da PF que investiga uma tentativa de golpe.
Aliados do prefeito têm dito que Bolsonaro não é o dono da candidatura, e sim mais um apoiador entre outros, como o governador Tarcísio de Freitas (Republicanos), o ex-ministro Aldo Rebelo (que pediu licença do PDT) e o deputado Paulinho da Força (Solidariedade).
Nunes afirma que nem Lula nem Bolsonaro serão prefeito, evitando que o embate seja feito entre os padrinhos em vez dos candidatos. “Aqui em São Paulo não é ringue, aqui a preocupação é cuidar da cidade”, reagiu ao petista.
“Trazer a eleição municipal para uma discussão nacional é covarde, irresponsável e falta de amor pela cidade”, disse o prefeito a jornalistas, acrescentando que é desonesto replicar a polarização e colocar questões “ideológica e partidária acima dos interesses da cidade”.
Nas palavras de um articulador que apoia Boulos, o candidato que conseguir incorporar o espírito de união do centro democrático deve levar a melhor nas urnas, assim como ocorreu com a campanha de Bruno Covas (PSDB) em 2020 – com a diferença de que o tucano não se ligou a Bolsonaro nem Lula.
O discurso de frente ampla se evidenciou na pré-campanha de Boulos com a adesão da ex-prefeita Marta Suplicy, que era secretária municipal de Nunes há um mês, mas migrou para o PT para ser vice na chapa do psolista a pedido de Lula.
Marta era, para o prefeito, um símbolo de que seu arco de apoiadores ia da esquerda a Bolsonaro. Defensora da estratégia de frente ampla, conceito que aplicou à candidatura de Covas que apoiou em 2020 e à de Lula que apoiou em 2022, Marta buscou transferir para Boulos, e não mais para Nunes, esse ativo da amplitude.
No almoço em que selou a chapa com Boulos, a ex-prefeita resgatou um manifesto por uma frente ampla que divulgou pela primeira vez em 2019. Em seu evento de refiliação, que reuniu Lula e Boulos, os discursos foram marcados pelo antagonismo com Bolsonaro.
Em reação, aliados de Nunes como Tarcísio, Fabio Wajngarten e Baleia Rossi, presidente do MDB, passaram a usar com frequência o termo “frente ampla” – que, segundo o dirigente, seria “sinônimo de MDB, partido de centro que nasceu como frente contra a ditadura”.
Aldo, que tem trajetória comunista, por sua vez, sucede a Marta na Secretaria de Relações Internacionais da prefeitura e passou também a substituí-la como símbolo da frente ampla de Nunes.
Neste sábado (17), para se defender das acusações de golpismo, Bolsonaro compartilhou vídeo de Aldo e uma mensagem “até o ex-ministro da Dilma sabe que não teve golpe”.
Emedebistas pregam que, com Marta, Boulos só somou à esquerda com ela mesma, já que a ex-prefeita manteve a identidade com o PT – “estou de volta ao partido que nunca saiu de mim”, declarou ela.
Boulos, em seu canal no YouTube, respondeu à tese de que a frente ampla seria a de Nunes, com mais partidos. “Frente ampla não se constrói pelo número de partidos. Frente ampla se constrói por uma agregação da sociedade no sentido de valores democráticos“, disse ele, pregando derrotar o bolsonarismo.
Além da aliança com Marta, outros fatores reforçaram a estratégia de nacionalização de Boulos, como a operação da Polícia Federal que mirou Bolsonaro e deu munição para que o psolista ligasse Nunes ao golpismo.
Nesta sexta (16), o prefeito afirmou que deve comparecer à manifestação de apoio a Bolsonaro, marcada para o dia 25.
Como mostrou a Folha, Bolsonaro, que assumiu seu apoio a Nunes mais claramente em janeiro, subiu o tom contra Boulos, o que também serve ao propósito da campanha da esquerda de trazê-lo para o jogo como alvo.
Auxiliares de Nunes dizem que as suspeitas contra Bolsonaro não necessariamente vão colar no emedebista e que o eleitor, no pleito municipal, avalia as melhorias na cidade. Eles afirmam acreditar que, nesse quesito, o prefeito tem uma série de vitrines para apresentar.
Para eles, a reprodução da polarização nacional por Lula e Boulos é descrita como uma tentativa desesperada e a única tática que restou ao psolista, que não tem experiência em gestão pública para credenciá-lo.
O argumento de estrategistas de Nunes é o de que os partidos da base de Lula que integram a coligação do prefeito, a começar pelo MDB, e o apoio de parte do sindicalismo desmontam a tese de que a disputa seja entre lulismo e bolsonarismo.
Nos bastidores, porém, esses interlocutores esperam contar com a cooperação de Bolsonaro para que ele não responda às provocações de Lula e Boulos e evite protagonizar a disputa paulistana. O ex-presidente, no entanto, indicou um coronel da PM bolsonarista para a vice de Nunes, o que realça a ligação do prefeito e da extrema direita.