Rússia dá calote após sanções impedirem pagamento, diz Casa Branca

Kremlin nega descumprimento de obrigações

  • Data: 27/06/2022 15:06
  • Alterado: 27/06/2022 15:06
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Estadão Conteúdo
Rússia dá calote após sanções impedirem pagamento, diz Casa Branca

Crédito:Reprodução

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A Rússia deixou de pagar títulos de dívida pela primeira vez em décadas, de acordo com a Casa Branca, em um momento em que o país está cada vez mais isolado do sistema financeiro internacional em razão das sanções impostas pelo Ocidente após o início da guerra na Ucrânia. O Kremlin nega descumprimento de obrigações.

Os pagamentos em questão, na ordem de US$ 100 milhões (R$ 526 milhões) em juros sobre dois títulos, um em dólares e outro em euros, deveriam ter sido efetuados até 27 de maio. Após um período de carência de 30 dias, expirado no domingo, 26, credores afirmaram não ter recebido os valores até esta segunda-feira, 27.

De acordo com as autoridades americanas, esta é a primeira vez em mais de um século que a Rússia entra em moratória em uma situação envolvendo títulos internacionais – a última vez que a Rússia teria dado calote em sua dívida externa foi em 1918, durante a Revolução Bolchevique, quando os revolucionários se recusaram a aceitar as dívidas internacionais acumuladas durante a era czarista, após a derrubada de Nicolau II. Porém, a Rússia deu calote em sua dívida interna mais recentemente, em 1998, quando o país passou por uma crise financeira e o rublo entrou em colapso, recuperando-se após ajuda internacional.

A configuração do calote russo pode ser mais complexa no cenário atual. O Kremlin, que tem dinheiro para fazer os pagamentos graças às receitas de petróleo e gás impulsionadas por vendas a China e Índia, rejeitou as alegações e acusou o Ocidente de criar uma espécie de moratória artificial.

O Ministério das Finanças da Rússia informou que fez os pagamentos em euros e dólares ao National Settlement Depository (NSD), uma instituição financeira não bancária russa e depositária central de títulos, acrescentando que cumpriu com suas obrigações.

“Há dinheiro e também a disponibilidade para pagar”, disse o ministro das Finanças russo, Anton Siluanov, no mês passado. “Esta situação, criada artificialmente por um país hostil, não afetará a qualidade de vida dos russos.”

O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, afirmou que Moscou realizou o pagamento em moeda estrangeira ainda em maio, mas que os valores foram bloqueados pela empresa de serviços financeiros europeia Euroclear, por causa das sanções ocidentais à Rússia, classificando as alegações de calote como “absolutamente ilegítimas”. “Não há razão para descrever esta situação como uma cessação de pagamentos”, disse Peskov.

Em contrapartida, autoridades ocidentais classificaram o que consideram um calote como um sinal do sucesso da política de sanções e embargos à Rússia, adotadas desde o início da invasão à Ucrânia.

“As notícias desta manhã sobre a descoberta do default da Rússia pela primeira vez em mais de um século, situam o quão fortes são as ações que os EUA tomaram, juntamente com aliados e parceiros, bem como quão dramático foi o impacto sobre economia da Rússia”, disse uma autoridade americana à margem de uma cúpula do G-7 na Alemanha.

Desde o final de maio, o Escritório de Controle de Ativos Estrangeiros (Ofac, na sigla em inglês) do Departamento do Tesouro dos EUA vem impedindo que Moscou faça pagamentos internacionais.

“Desde março, pensamos que um calote russo era provavelmente inevitável, e a questão era quando”, disse Dennis Hranitzky, chefe de litígios soberanos do escritório de advocacia Quinn Emanuel, à Reuters antes do prazo de domingo.

O impacto de um calote russo neste momento seria em grande parte simbólico. Moscou está impedido de tomar empréstimos internacionalmente, e não precisa fazê-lo graças às abundantes receitas de exportação de petróleo e gás. No entanto, o estigma provavelmente aumentaria os custos de empréstimos no futuro.

Sem um prazo exato especificado, advogados dizem que a Rússia teria até o final do dia útil seguinte ao encerramento do prazo para pagar os credores de títulos antes de se configurar o calote.

Em uma situação normal, um descumprimento desta natureza faria com que agências de classificação de crédito rebaixassem formalmente a classificação de crédito do país, a fim de refletir a inadimplência. Isso, porém, não se aplica ao caso, pois a maioria das agências não classifica mais a Rússia.

Dívida

Moscou deve cerca de US$ 40 bilhões (R$ 209 bilhões) em títulos em moeda estrangeira, cerca de metade disso para credores estrangeiros. Antes do início da guerra, a Rússia tinha cerca de US$ 640 bilhões (R$ 3,3 trilhões) em moeda estrangeira e reservas de ouro, muitas das quais eram mantidas no exterior e agora estão congeladas.

Investidores esperavam que o país entrasse em moratória há meses. Contratos de seguro que cobrem a dívida russa precificaram, por semanas, uma probabilidade de inadimplência de 80%.

Quem decide se um país está inadimplente?

Agências de classificação de risco podem reduzir o rating de um país para inadimplente ou um tribunal pode decidir a questão. Os detentores de títulos que têm swaps de inadimplência de crédito – contratos que funcionam como apólices de seguro anticalote – podem pedir a um comitê de representantes de empresas financeiras que decida se a falta de pagamento da dívida deve desencadear uma execução, que ainda não é uma declaração formal de inadimplência.

O Comitê de Determinação de Inadimplência de Crédito – um grupo industrial de bancos e fundos de investimento – decidiu em 7 de junho que a Rússia não pagou os juros adicionais exigidos após o pagamento de um título após a data de vencimento de 4 de abril. Mas o comitê adiou a tomada de novas medidas devido à incerteza sobre como as sanções podem afetar qualquer acordo.

O que os investidores podem fazer?

A maneira formal de declarar inadimplência é se 25% ou mais dos detentores de títulos disserem que não receberam seu dinheiro. Quando isso acontecer, as provisões dizem que todos os outros títulos estrangeiros da Rússia também estão inadimplentes, e os detentores de títulos podem buscar uma decisão judicial para fazer cumprir o pagamento.

Em circunstâncias normais, os investidores e o governo inadimplente geralmente negociam um acordo no qual os detentores de títulos recebem novos títulos que valem menos, mas que pelo menos lhes dão alguma compensação parcial. Mas as sanções impedem as negociações com o Ministério das Finanças da Rússia. E ninguém sabe quando a guerra terminará ou quanto títulos inadimplentes podem acabar valendo.

Quando um país entra em moratória, ele pode ser cortado dos empréstimos no mercado de títulos até que a inadimplência seja resolvida e os investidores recuperem a confiança na capacidade e disposição do governo para pagar. Mas a Rússia já foi cortada dos mercados de capitais ocidentais, então qualquer retorno aos empréstimos está muito distante de qualquer maneira. O Kremlin ainda pode emprestar rublos internamente, onde depende principalmente de bancos russos para comprar seus títulos.

Impacto do calote da Rússia

As sanções ocidentais sobre a guerra na Ucrânia levaram empresas estrangeiras a fugir da Rússia e interromperam os laços comerciais e financeiros do país com o resto do mundo. A moratória seria mais um sintoma desse isolamento e ruptura.

Analistas de investimento calculam que um calote da Rússia não teria o tipo de impacto nos mercados financeiros e instituições globais que vieram da moratória anterior, de 1998.

Os detentores dos títulos – por exemplo, fundos que investem em títulos de mercados emergentes – podem sofrer sérias perdas. No entanto, a Rússia desempenhou apenas um pequeno papel nos índices de títulos de mercados emergentes, limitando as perdas aos investidores de fundos.

Embora a guerra em si esteja tendo consequências devastadoras em termos de sofrimento humano e no aumento de preço dos alimentos e da energia em todo o mundo, a inadimplência dos títulos do governo “definitivamente não seria sistemicamente relevante”, disse a diretora-gerente do Fundo Monetário Internacional (FMI), Kristalina Georgieva.

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  • Data: 27/06/2022 03:06
  • Alterado:27/06/2022 15:06
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Estadão Conteúdo









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