RACHADINHA: Cinco ex-assessores de Bolsonaro receberam R$ 165 mil em auxílios
Suspeitos de serem funcionários “fantasmas” pelo MPF quando Bolsonaro era deputado, os cinco foram investigados pelo esquema da “rachadinha” e tiveram o sigilo quebrado
- Data: 26/04/2021 08:04
- Alterado: 26/04/2021 08:04
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
Jair Bolsonaro. Foto de 2015
Crédito:Reprodução
Investigados pelo Ministério Público do Rio sob a suspeita de serem “fantasmas”, cinco ex-assessores do presidente Jair Bolsonaro quando ele era deputado federal receberam R$ 165 mil só em auxílios enquanto estiveram nomeados na Câmara dos Deputados. Esses funcionários tiveram sigilo quebrado na investigação contra o senador e ex-deputado estadual Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho mais velho do presidente da República.
Os dados ali obtidos também apontaram supostos indícios da prática de “rachadinha” no gabinete de Bolsonaro. Em dois casos, os valores equivalentes aos auxílios eram os únicos que permaneciam nas contas dos assessores. Todo o restante depositado pela Câmara era sacado em caixas eletrônicos. A prática é considerada indício da “rachadinha”, a devolução dos salários para o político que os nomeou.
É justamente essa a suspeita que recai sobre os cinco na investigação contra Flávio, já denunciado por peculato, lavagem de dinheiro, organização criminosa e apropriação indébita pelo MP. No caso dele, os desvios teriam acontecido quando ele era deputado estadual no Rio de Janeiro.
Ao quebrar o sigilo dos cinco, a investigação encontrou mais do que procurava. Eram indícios de desvios que teriam ocorrido quando trabalhavam para Jair Bolsonaro. O período da quebra – 2007 a 2018 – incluiu datas em que também estiveram contratados pelo gabinete do atual presidente, já que a família Bolsonaro mantinha o hábito de trocar funcionários entre si.
Em março, o portal UOL mostrou que Fernando Nascimento Pessoa, Nelson Alves Rabello, Jaci dos Santos e Daniel Medeiros da Silva sacaram 72% do que receberam do gabinete de Bolsonaro. Já Nathália Queiroz transferiu 65% para o pai, o suposto operador do esquema de Flávio, Fabrício Queiroz.
CONFIANÇA
A reportagem cruzou esse porcentual e o montante financeiro com os valores pagos em auxílios – obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação e no site da Câmara. Constatou-se que em dois casos, de Pessoa e Rabello, as verbas de benefícios foram quase idênticas ao pouco que permaneceu nas contas.
Homem de confiança da família, Pessoa teve nos auxílios o equivalente a 24% de todos seus vencimentos. Ele sacava 77% do montante que recebia. Rabello, por sua vez, recebeu 27% das verbas da Câmara em auxílios, sendo que retirou 70% dos rendimentos totais. Segundo a Câmara, o único auxílio que os cinco ex-assessores receberam foi o de alimentação. Pessoa foi funcionário de Jair entre 2009 e 2014; Rabello, de 2005 a 2011, tendo voltado para o cargo em 2017 e permanecido até 2018.
Como Rabello já era nomeado dois anos antes do início das informações contidas na quebra de sigilo, a reportagem considerou os valores de auxílios a partir de 2007 para chegar ao porcentual. Na soma geral dos valores, R$ 165 mil, as verbas dos dois anos anteriores foram incluídas.
Ambos são tidos como homens de confiança da família presidencial, com passagens por mais de um gabinete. Rabello, inclusive, não se limitou a Jair e Flávio: passou ainda pelo mandato do vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos) na Câmara Municipal do Rio.
O filho ‘zero dois’ do presidente também é investigado por suspeitas de rachadinha – o peculato, apropriação de dinheiro público – por meio de assessores “fantasmas”. No caso dele, a investigação ainda não culminou em denúncia. Pessoa, por sua vez, é um dos advogados que atuaram em causas da família Bolsonaro ao mesmo tempo em que tinham cargos nos gabinetes. Atualmente, está nomeado como assessor parlamentar de Flávio no Senado. Seu salário foi R$ 22,9 mil no último mês.
BENTO RIBEIRO
Outros dois dos cinco assessores chamam atenção por motivos distintos. Um deles é Daniel Medeiros da Silva. Ele tinha oficialmente salários de cinco dígitos na Câmara enquanto vivia numa casa humilde em Bento Ribeiro, bairro da zona norte do Rio onde a família de Bolsonaro tem escritório político. Só em auxílio, ele recebeu R$ 36,3 mil, o que dá uma média de R$ 885 por mês no tempo em que esteve nomeado.
Medeiros sacou 71% de tudo o que recebeu da Casa, enquanto o porcentual em auxílios era de 9%. Como o benefício tem valor fixo independentemente do salário, representava fatia pequena das receitas do assessor. Num mês com 22 dias úteis, Medeiros tinha direito a R$ 40 por dia para se alimentar.
Na vizinhança da casa em que seu endereço está registrado, uma placa anuncia a venda de sacolé – ou “geladinho” – por R$ 2. Com a verba da Câmara, o ex-assessor poderia comprar 20 deles diariamente.