“O Cinema Underground de Roberta e Michael Findlay” começa no dia 20 de março no Estação Botafogo
A retrospectiva pretende apresentar, pela primeira vez no Brasil, a filmografia do casal, que influenciou um time de cineastas consagrados de várias gerações.
- Data: 28/02/2025 20:02
- Alterado: 28/02/2025 20:02
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Assessoria
“O Cinema Underground de Roberta e Michael Findlay”, que acontece de 20 a 26 de março na Sala 2 do Estação Botafogo, vai exibir 27 filmes do casal que deixou seu nome marcado na história do cinema underground – importantes nomes dos gêneros “exploração” e de “terror”, especialmente em filmes de baixo orçamento feitos nos Estados Unidos durante os anos 60 e 70. Sob curadoria do cineasta e jornalista Mário Abbade, a intensa programação conta com filmes como “Possua-me nua” (Take me naked), “O maníaco da carne” (The touch of her flesh), “O grito dos mutilados” (Shriek of the mutilated) e “Snuff” (1975), entre outros. Programação completa aqui.
A retrospectiva pretende apresentar, pela primeira vez no Brasil, a filmografia do casal, que influenciou um time de cineastas consagrados de várias gerações. É o caso dos americanos Wes Craven, Sam Raimi e Rob Zombie, do canadense David Cronenberg, do holandês Paul Verhoeven, do espanhol Álex de la Iglesia, do francês Alexandre Aja, do italiano Abel Ferrara e do argentino Gaspar Noé, em uma extensa lista de diretores que flertam com esse subgênero. Segundo o curador, não houve no mundo uma mostra sobre a obra de Roberta e Michael Findlay. “Do alto dos seus 81 anos, ela disse que estava emocionada com esta inciativa, porque nunca fizeram uma mostra desta magnitude em homenagem a eles”, diz Abbade.
Ao mesmo tempo, a mostra quer ressaltar como Roberta e Michael trabalhavam em completa sintonia naquilo que se pode catalogar como uma relação igualitária entre uma mulher e um homem em todas as funções de uma equipe de produção para o cinema. Roberta tinha voz ativa no set e é considerada uma importante representante feminista do cinema underground.
Em outra abordagem, historicamente, a arte frequentemente desafia normas morais e explora temas tabus, como violência, sexualidade transgressora ou decadência humana, com o objetivo de provocar, questionar ou expor aspectos sombrios da condição humana. Obras como as do Marquês de Sade, a literatura de autores como Georges Bataille abordam a depravação não como mero choque, mas como crítica social, investigação filosófica ou expressão de liberdade criativa.
Michael Findlay
Michael Findlay (1938 – 1977) foi um cineasta e produtor que ficou conhecido principalmente por seus filmes de terror e exploitation, muitas vezes com um estilo gráfico e transgressor para a época. Ele é mais lembrado por seu trabalho em filmes que exploravam temas sensacionalistas, como o sexo e a violência, características típicas do gênero exploitation.
Findlay dirigiu e produziu uma série de filmes de baixo orçamento. Um dos seus filmes mais famosos é The Touch of Her Flesh (1967), um thriller psicológico e de vingança, que aborda temas de erotismo e violência. Ele também foi responsável pela direção de filmes como Shriek of the Mutilated (1974), um filme de terror que se tornou um cult, apesar de sua produção de baixo orçamento.
Os filmes de Findlay frequentemente se distanciam das produções convencionais e tentam chocar a audiência com suas cenas de violência explícita e sexualidade. Eles eram voltados para um público mais niche e, com o tempo, se tornaram parte do movimento exploitation, que envolvia uma abordagem mais ousada e provocativa ao cinema.
Roberta Findlay
Roberta Findlay (1943), esposa de Michael Findlay, é cineasta e atriz que também se destacou no gênero exploitation e terror. Ela é conhecida por seu trabalho em filmes de baixo orçamento, nos quais muitas vezes se envolvia como diretora, roteirista e produtora.
Roberta Findlay dirigiu diversos filmes no mesmo estilo de seu marido, com grande foco em elementos sensacionalistas e de horror. Ela é conhecida por filmes como Snuff (1976), um dos filmes mais infames de sua carreira, que foi envolto em controvérsias. Snuff é um filme exploitation que, embora não seja realmente um “snuff film” (como o título sugere), explora o tema de violência extrema e manipulação da mídia.
Roberta também foi uma das poucas mulheres a trabalhar de forma consistente no gênero exploitation, em um período em que esse campo era dominado por homens. Ela se destacou não apenas como cineasta, mas também como produtora, atriz e em outras funções de produção.
NOTA DO CURADOR
O meu primeiro contato com Roberta e Michael Findlay foi em 1982, quando aluguei “Snuff” em uma locadora em Ipanema que trabalha com fitas de VHS importadas. O longa, o mais alugado durante mais de três meses, ficou famoso por, supostamente, trazer uma cena real de assassinato – assunto mais comentado então na locadora. Convenhamos que a baixa qualidade das fitas de VHS ajudou a disseminar a lenda, já que não dava para ver detalhes com precisão.
Depois dessa primeira experiência, saí em busca de mais filmes do casal de diretores. Na época, não era fácil conseguir informação sobre as produções mais novas, então, era uma alegria quando se conseguia ler algo a respeito do tema ou ver um filme recém-lançado lá fora. Tais fitas eram importadas e a grande maioria provinha de companhias independentes como a Something Weird Video, fundada em 1990.
De lá para cá, tivemos a chegada do DVD, do Blu-ray e dos arquivos digitais na internet, o que facilitou, finalmente, planejar a mostra “O Cinema Underground de Roberta e Michael Findlay”. Com o adendo de receber a bênção da própria cineasta, aos 81 anos de idade. Já Michael, infelizmente nos deixou em maio de 1977, vítima de um acidente de helicóptero. Praticamente desconhecidos do grande público, Roberta e Michael Findlay são famosos entre os pesquisadores como a dupla mais notória nos acervos da “exploração” a combinar sexo e violência.
Em meados da década de 1960, Michael foi destaque entre um pequeno grupo de cineastas underground de Nova York (incluindo Joseph W. Sarno, Joseph P. Mawra e Lou Campa) que produziam filmes de baixíssimo orçamento de “exploração”. Assim são chamadas as primeiras produções a combinar histórias de terror ou suspense convencionais com cenas de sexo sadomasoquista para o mercado de grindhouse (especializado em filmes violentos com temas explorativos). Às vezes, sob o pseudônimo de Julian Marsh, Michael, além de dirigir, atuava nos filmes usando o nome Robert West.
Uma marca do casal era empregar os mesmos atores repetidamente, em especial, Uta Erickson e Marie Brent, também conhecida como Janet Banzet. Todos adotavam pseudônimos por causa dos órgãos de censura. Os Findlays eram amigos de George Weiss, produtor do longa “Glen ou Glenda”, dirigido por Ed Wood, e de uma série de filmes fetichistas com a personagem Olga (“House of Shame de Olga” e “Olga’s Girls”, entre outros). Foi em 1964 que, encorajados por Weiss, Roberta e Michael começaram a fazer filmes no novo subgênero de exploração que aliava sexo e violência.
A série da HBO “The deuce”, criada por David Simon e George Pelecanos, foi inspirada nos Findlay, principalmente em Roberta. Ambientada nos anos 1970, exibe o mundo da prostituição nas ruas de Nova York para depois chegar ao mercado do cinema pornográfico e do cinema marginal. Os personagens principais, interpretados por Maggie Gyllenhaal e David Krumholtz, são uma espécie de representação ficcional da trajetória dos Findlays numa Nova York machista, dominada pela máfia e por uma polícia corrupta, muito antes do projeto Tolerância Zero implementado pelo prefeito Rudy Giuliani, nos anos 1990.
A série televisiva ilustra como Roberta e Michael precisaram lançar mão de pseudônimos para poder se relacionar com amigos e familiares, ao mesmo tempo que corriam perigo por negociar com mafiosos, autoridades e censores. Também na trama, a personagem de Maggie Gyllenhaal revoluciona seu meio ao dirigir filmes com temática adulta em uma indústria dominada por homens. Antes de ser diretora e de assinar a fotografia de filmes de Michael, atuava como coadjuvante nos filmes do casal com o pseudônimo de Anna Riva.
O objetivo da mostra “O Cinema Underground de Roberta e Michael Findlay” é revelar ao público brasileiro quem são esses pioneiros do cinema underground e marginal nos Estados Unidos, mas que acabaram esquecidos. Roberta, que continuou produzindo conteúdo após a morte de Michael, ainda é um importante símbolo do movimento feminista, apesar de não gostar do rótulo. A atual discussão sobre uma maior participação da mulher nas diversas funções de uma produção cinematográfica reforça quão oportuno é redescobrir o trabalho de Roberta Findlay.
Serviço:
Mostra “O Cinema Underground de Roberta e Michael Findlay”
Classificação etária: 18 anos
Estação NET Botafogo 2
Rua Voluntários da Pátria, 88 – Botafogo
Ingressos: R$18