Nunes defende muro na Cracolândia em meio a críticas e espera decisão do STF
O padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua em São Paulo, descreveu a obra como o "muro da vergonha"
- Data: 17/01/2025 16:01
- Alterado: 17/01/2025 16:01
- Autor: Redação
- Fonte: Terra
Crédito:Paulo Pinto/Agência Brasil
Em uma coletiva de imprensa, o prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, abordou as recentes críticas direcionadas à construção de um muro na Cracolândia, afirmando que aguarda um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o tema. “Estamos falando do Supremo Tribunal Federal, de um ministro”, declarou. “Estamos aguardando e, ao questionar, vamos responder conforme necessário.”
Nunes também se defendeu das críticas de entidades da sociedade civil que contestam a edificação do muro, erguido no ano passado entre as ruas dos Protestantes e General Couto de Magalhães. “As pessoas estão muito desocupadas e ficam criando questões infundadas“, comentou. “Eu gostaria que elas se empenhassem em ações como as realizadas pela nossa equipe de saúde e assistência social.”
A construção do muro, finalizada em maio de 2022, intensificou as discussões sobre a abordagem da administração municipal aos problemas da dependência química e da violência na área central. De acordo com informações do Portal da Transparência, a prefeitura investiu quase R$ 96 mil na obra.
Em resposta às reclamações sobre o muro, a Defensoria Pública do Estado recomendou a remoção das barreiras físicas na Cracolândia. Em um relatório divulgado em junho passado, o órgão havia classificado o local como um “curral humano” devido à instalação dos gradis.
Na quinta-feira, 16, após um pedido feito por parlamentares do PSOL para a retirada do muro, o ministro Alexandre de Moraes também solicitou explicações sobre a obra. O ministro pretende ouvir a Prefeitura antes de tomar qualquer decisão sobre a questão, que está relacionada à Política Nacional para a População em Situação de Rua.
Nunes contestou o pedido de Moraes e afirmou: “Não há decisão do ministro e nenhum fundamento legal que justifique qualquer ação. Fazer um ofício hoje para que um ministro do STF perca tempo com uma questão que ocorreu em maio do ano passado é absurdamente sem sentido. Não compreendo qual é o objetivo disso.”
A gestão municipal tem reiterado que os gradis já existiam na área antes da construção do muro. “A troca foi realizada para proteger pessoas em situação de vulnerabilidade, bem como moradores e pedestres, não para ‘confinamento’“, esclareceu a Prefeitura em nota.
O prefeito Nunes ainda mencionou que a mudança se deu também para prevenir acidentes com os antigos tapumes de metal. “Houve casos em que pessoas se feriram gravemente”, destacou.
Além disso, Nunes argumentou que a nova estrutura facilitaria o acesso das equipes de saúde e ambulâncias ao fluxo de usuários. A Defensoria Pública havia solicitado dados que comprovassem essa eficiência.
“É lamentável que estejamos perdendo tempo com essa questão ao invés de focar no cuidado das pessoas e convencê-las a buscar tratamento”, lamentou Nunes. Ele informou que cinco usuários foram encaminhados para tratamento na última quinta-feira e ressaltou que atualmente mais de 2.500 pessoas estão em tratamento na cidade. “Os dados mostram uma redução significativa no número de usuários nesta região”, afirmou.
Conforme dados fornecidos pela Prefeitura, houve uma diminuição no fluxo diário: em janeiro deste ano foram registrados em média 139 usuários durante o dia e cerca de 240 à noite, enquanto no mesmo período do ano anterior esses números eram significativamente maiores.
No entanto, comerciantes da região relataram que os usuários têm se dispersado por outras ruas próximas à Cracolândia. Durante uma visita ao local, o Estadão constatou uma diminuição visível no número de pessoas concentradas ali.
Organizações sociais criticam abertamente a construção do muro, classificando-a como uma medida isolacionista. O padre Julio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo de Rua em São Paulo, descreveu a obra como o “muro da vergonha“, argumentando que ele impede soluções viáveis para os problemas enfrentados pelos usuários.
A ONG Craco Resiste também manifestou seu descontentamento com as condições criadas pelo novo espaço delimitado para os usuários, ressaltando a falta de infraestrutura adequada como banheiros ou pontos de água potável nas proximidades.
O psiquiatra Flavio Falcone, atuando na Cracolândia desde 2007, enfatizou que o muro apenas agravou a situação dos usuários ao dispersá-los pela região e dificultar o acesso das equipes médicas ao fluxo. Ele questiona se há realmente uma relação entre segurança e atendimento adequado à população afetada.