Ninho artificial substitui ninho queimado e é adotado por antigos “inquilinos”
Casal de tuiuiús que anualmente se reproduzia no ninho original adotou ninho artificial após queimadas
- Data: 20/05/2021 16:05
- Alterado: 20/05/2021 16:05
- Autor: Redação
- Fonte: Embrapa
Crédito:Divulgação
Um dos cartões postais do Pantanal, localizado às margens da BR-262, no município de Corumbá, Mato Grosso do Sul, pode se tornar um monumento vivo ao ser adotado pelo casal de tuiuiús que anualmente se reproduzia no ninho original, que foi totalmente destruído pelas queimadas ocorridas em 2020. O casal de tuiuiús voltou a encantar quem passa pelo local, e têm sido visto já trazendo material para o novo ninho, como galhos e fibras vegetais mais finas. O ninho artificial foi construído para oferecer uma alternativa ao casal dessas aves símbolo do Pantanal, já que o ninho era um referencial turístico muito apreciado, que era tombado por lei do municipal. O fogo destruiu, além do ninho original, a estrutura de galhos que davam suporte a ele na piúva (nome pantaneiro do ipê) que ainda se mantém ao lado.
O ninho artificial vinha sendo monitorado desde a sua construção, em 23 de outubro de 2020. Em janeiro de 2021, os tuiuiús foram vistos nas proximidades do ninho artificial e até pousados na árvore do antigo ninho. Já em 16 de maio deste ano, houve o primeiro registro do casal pousado no ninho artificial. Além disso, Walfrido Tomás, pesquisador da Embrapa Pantanal idealizador do projeto do ninho artificial, registrou o fato dos tuiuiús estarem trazendo material para o ninho, numa clara indicação que estão preparando o local para procriação. Isso confirma a adoção do novo ninho pelo casal, confirmando a esperança dos pesquisadores.
Construção do novo ninho
Walfrido conta que, durante o trabalho de levantamento de animais mortos pelas queimadas, realizado no ano passado, ele observou diversas vezes tuiuiús pousados em árvores próximas ao ninho que foi queimado cerca de um mês antes, e então teve a ideia de instalar uma estrutura alternativa para a um novo ninho. “Assim os tuiuiús poderiam retornar, pois essas aves são fiéis ao local de nidificação”, detalhou Walfrido.
A proposta foi apresentada à Fundação de Meio Ambiente do Pantanal, que prontamente adotou a ideia, e estabeleceu uma parceria com a Energisa para a instalação de uma estrutura próxima ao local do ninho original. O Instituto Arara Azul foi também convidado a assinar o projeto, já que tem experiência com ninhos artificiais para araras azuis, na forma de caixas-ninho. Segundo o pesquisador, essa é a primeira experiência de ninho artificial com espécie: “Me inspirei nos ninhos artificiais de cegonhas, comuns na Europa, já que o tuiuiú pertence à mesma família destas aves, sendo tecnicamente uma cegonha”.
O ninho construído possui estrutura que consiste de um poste de concreto de 12 metros, com uma plataforma hexagonal de metal de 2m de diâmetro no topo, em formato de taça, de forma a comportar o volumoso material que os tuiuiús utilizam na construção de ninhos. “A estrutura foi adaptada e melhorada pelos técnicos da Energisa, utilizando material disponível, que são utilizados na construção de torres de redes de energia. Sobre a plataforma, depositamos galhos e material fino para representar um ninho, na esperança de que o local fosse reconhecido pelos tuiuiús e utilizados como base para construção do novo ninho”, explica Walfrido.
Walfrido defende que o ninho artificial não tem o papel de salvar a população de tuiuiús do Pantanal, já que não representa nada em uma população que já teve mais de 20 mil ninhos ativos na planície pantaneira nos anos 1990. Para o pesquisador, o fato de ser um ninho artificial utilizado pela ave-símbolo do Pantanal, num local bastante visível às margens de uma movimentada rodovia, ele representa uma constante lembrança de que ações humanas equivocadas podem causar impactos profundos na fauna pantaneira e, por extensão, em toda a biodiversidade na região. “Assim, este verdadeiro monumento vivo deve cumprir um papel relevante na conscientização da população sobre os cuidados a serem tomados nessa relação entre homem e natureza”, completa o pesquisador.
A ave
Os tuiuiús se reproduzem após o período das cheias, quando o nível da água está baixando e os peixes e pequenos invertebrados – base da alimentação dessas aves – ficam mais disponíveis nas baías e alagados, servindo de alimento para a espécie. Segundo os pesquisadores da Embrapa, geralmente os ninhos têm ovos ou filhotes entre julho e novembro e as cheias determinam a quantidade de ninhos ativos no Pantanal a cada ano.
Uma vez construídos os ninhos, os tuiuiús permanecem fiéis ao local de reprodução, o qual usam por muitos anos, sempre fazendo reparos e melhorias com a adição de galhos, capim e fibras de plantas aquáticas. Esses ninhos podem ter mais de 2m de diâmetro, e são sempre colocados em grandes árvores com galhos abertos, para facilitar que as aves cheguem ao ninho com suas asas abertas, as quais podem ter 3m de uma ponta a outra.
Ninho tombado pelo Patrimônio Histórico Natural
O ipê é uma das árvores símbolo do Pantanal, onde é mais conhecido como piúva. É uma das árvores mais altas da região e, pela sua copa aberta, é adequada para pousos e decolagens do tuiuiú, o que explica a alta frequência de ninhos nesta espécie. A piúva onde o ninho da BR-262 estava construído fica a uns 15 m do asfalto, e era uma referência turística nos períodos de reprodução. Assim, a prefeitura de Corumbá criou, em 2011, o decreto municipal 964/2011 que tombou o ninho de tuiuiú como patrimônio. Sua perda em função dos incêndios catastróficos que atingiram 30% do Bioma Pantanal causou comoção, e o ninho artificial ora monitorado resgata essa referência para a região