Moreira Franco teria atuado em dois negócios da Aviação Civil por propinas de Temer
Lava Jato reuniu documentos que reforçam relato de delator da Engevix sobre sociedade com a Argeplan, do amigo do ex-presidente, no setor aeroportuário para gerar recursos de corrupção
- Data: 23/03/2019 12:03
- Alterado: 23/03/2019 12:03
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
Crédito:
O ex-ministro Moreira Franco teria atuado em dois projetos na Secretaria de Aviação Civil para viabilizar pagamentos de propinas para o esquema liderado por Michel Temer que envolvia as obras de construção da Usina Termonuclear de Angra 3, no Rio, afirma a Operação Lava Jato.
Preso desde a quinta-feira, 21, por ordem do juiz federal Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio, o ex-ministro foi apontado como alguém de “papel de destaque” no esquema de propinas ao MDB, homem de “extrema confiança” de Temer e encarregado da ‘intermediação’ de propinas.
Moreira Franco foi ouvido pela Polícia Federal nesta sexta-feira, 2, e negou envolvimento em crimes. Sua defesa entrou no mesmo dia com pedido de liberdade no Supremo Tribunal Federal (STF). O argumento é que a ação na qual sua prisão foi decretada afronta a decisão da Corte, que na semana passada decidiu que é competência de a Justiça Eleitoral julgar crimes como corrupção quando há conexão com delito eleitoral.
Ontem no final da tarde, o ministro do Supremo Marco Aurélio Mello negou o habeas corpus pedido para soltar Moreira Franco.
Segundo a Lava Jato, em meados de 2013 João Baptista Lima Filho, o Coronel Lima, que foi assessor de Temer e seu suposto operador financeiro, cobrou propinas da empreiteira Engevix relacionado à obra que era conduzida pela Eletronuclear.
“Após Coronel Lima, em meados de 2013, ter informado a José Antunes Sobrinho sobre a necessidade de pagar propina aos integrantes da cúpula do MDB, sob o pretexto de doação de campanha foram iniciadas tratativas para viabilizar os pagamentos”, registram os procuradores da força-tarefa da Lava Jato do Rio, no pedido de prisão de Temer, Moreira Franco, Coronel Lima e outros seis investigados.
A fase batizada de Operação Descontaminação é decorrente de duas frentes deflagradas em 2015 e 2016 em Curitiba, a Operação Radioatividade, que gerou a força-tarefa do Rio, e a Operação Pripyat, sobre crimes de formação de cartel e prévio ajustamento de licitações de Angra 3, além do pagamento de propina a empregados da Eletronuclear. Foram as apurações que geraram a criação da força-tarefa do Rio.
CAIXA
“Inicialmente, José Antunes Sobrinho, por afirmar não ter margem de lucro suficiente no contrato de Angra 3 para viabilizar os pagamentos, sugeriu que a empresa Engevix fosse beneficiada em outros dois projetos ligados à Secretaria de Aviação Civil, na época comandada por Moreira Franco”, informa a Lava Jato.
Quadro histórico do MDB do Rio, Moreira Franco foi governador do Estado, deputado federal, prefeito de Niterói. Ocupou cargo de ministro da Aviação Civil de 2013 a 2015, no governo Dilma Rousseff, indicado por Temer, então vice-presidente. No governo do MDB, de 2016 a 2018, foi secretário-geral da Presidência e ministro de Minas e Energia.
A Lava Jato descobriu com o delator que os projetos que beneficiariam a Engevix seriam: “a construção de Centro Nacional de Aviação (empreendimento que implicaria a construção de prédio para a Infraero, ANAC e Secretaria de Aviação Civil), que custaria aproximadamente R$ 250 milhões; contrato de consultoria para definição do futuro da área aeroportuária no Brasil, no valor estimado de R$ 16 milhões”.
Um consórcio chegou a ser montado entre a Engevix e a Argeplan Arquitetura e Engenharia, do Coronel Lima supostamente usada para lavar propinas de Temer: o Consórcios Aeroportos Brasileiros.
“Para viabilizar o pagamento de propina, restou acertado que a Engevix ficaria com 70% do consórcio e a Argeplan com 30%”, destaca documento da Lava Jato. O objetivo era vencer a concorrência 1/2014 da Secretaria de Aviação Civil, aberta em 3 de junho de 2014. O objeto do certame era contratar “consultoria especializada para execução de serviços técnicos de assistência e subsídio às atividades” da SAC.
Os investigadores quebraram os sigilos telefônicos dos investigadores e destacam que entre janeiro e maio daquele ano o sócio da Engevix e Moreira Franco “conversaram mais de duas dezenas de vezes”. “O que comprova as afirmações do colaborador de que alinhavam juntos os procedimentos para a contratação da Engevix.”
O Diário Oficial da União publicou no dia 27 de outubro de 2014 o vencedor da concorrência, o Consórcio Aeroportos Brasileiros, formado pela Engevix e pela Argeplan.
PROBLEMA
Os planos acabaram arruinados depois que um concorrente do certame (consórcio PWC/Strategy/Eace/Tecnosolo) ter entrado com uma ação judicial e desclassificado o consórcio montado pela Engevix e Argeplan. O governo acabou anulando todo processo de contratação, com a impossibilidade de vitória do Consórcio Aeroportos Brasileiros, o que para a Lava Jato comprova o direcionamento do certame.
“Com a inabilitação do Consórcio Aeroportos Brasileiros, tendo em vista que a mencionada contratação foi concebida exclusivamente para que a empresa Engevix gerasse caixa para pagamento de propina, a Secretaria de Aviação Civil declarou a licitação como sendo fracassada com a inabilitação dos demais concorrentes”, informa o MPF no pedido de prisão dos alvos.
Com os planos fracassados, foi buscada uma alternativa para gerar as propinas da Engevix para Temer. “A propina relativa ao contrato com a Eletronuclear acabou sendo paga co transferência de valores entre as empresas Alumi Publicidades e PDA Projeto e Direção Arquitetônica, também controlada por Coronel Lima”, informa a Lava Jato.
O delator da Engevix diz que mesmo assim “o desembolso da propina continuou sendo acompanhado por Moreira Franco, que, inclusive, foi avisado quando houve o efetivo pagamento”.
Almoço. Sobrinho narrou ainda que no primeiro semestre de 2014, antes de iniciarem os acertos e a abertura da concorrência 01/2014 da SAC, ele foi levado por Moreira Franco parra um almoço com Temer no Palácio Jaburu, residência oficial do vice-presidente da República.
“O colaborador José Antunes Sobrinho relata, inclusive, que no primeiro semestre de 2014 foi levado por Moreira Franco a um almoço com o então vice-presidente da República, Michel Temer, ocasião em que ficou claro o papel que cada uma das partes deveria desempenhar para o pagamento das vantagens ilícitas, sendo certo que coube a Moreira Franco viabilizar as licitações, de responsabilidade de sua pasta a fim de que a Engevix pudesse gerar caixa para pagar a propina solicitada”, registra o pedido de prisão.
Os procuradores lembram ainda no documento que não é a primeira vez que um empreiteiro com negócios em aeroportos cita reunião no Jaburu com Temer, cobrança de propina de Moreira Franco e negócios no setor aeroportuário. O ex-executivo da Odebrecht Benedicto Barbosa da Silva Junior detalhou em sua delação com a Lava Jato jantar na residência oficial e acerto de propina no contrato do Aeroporto do Galeão, no Rio.
COM A PALAVRA, O ADVOGADO ANTONIO SERGIO MORAES PITOMBO, QUE DEFENDE MOREIRA FRANCO
Wellington Moreira Franco prestou depoimento e refutou, ponto a ponto, as conjecturas e presunções usadas pelos Procuradores. Se houver interesse pela verdade, o caso tomará outro rumo.