Itaú Cultural estreia coluna em seu site pautada no conceito de Filosofia Pop
Assinada pelo professor Marcos Carvalho Lopes, a coluna mensal A Caminho estreia com uma análise do autor sobre o Brasil e sua própria trajetória como filósofo, com referências à literatura, música e cinema.
- Data: 15/02/2024 08:02
- Alterado: 15/02/2024 08:02
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Já está no ar a nova coluna do site do Itaú Cultural, A Caminho. Mensal, ela é conduzida por Marcos Carvalho Lopes, doutor em filosofia e professor universitário, pautada no conceito de Filosofia Pop, termo que dá nome a um podcast apresentado por ele e em um diálogo entre filosofia, cultura e artes. Disponibilizada sempre na segunda sexta-feira de cada mês, a coluna trará, ainda, dicas culturais, como filmes e músicas inspiradas no assunto abordado.
No texto de estreia, intitulado O que é nosso, o autor faz uma análise do Brasil e da sua própria trajetória como filósofo, com referências à literatura, música e cinema. A partir do conceito de que a filosofia está contida no cotidiano, Lopes traça a história recente do país, entrelaçando sua experiência como filho de caminhoneiro com a de José Henrique Bortoluci, autor do livro O que é meu (Fósforo, 2023), no qual apresenta entrevistas realizadas com seu pai, também motorista de caminhão por 50 anos.
No texto, Lopes reflete sobre as realidades, vivências e culturas dos personagens-base: ele, Bortoluci e ambos os pais. Ao citar a paralisação dos caminhoneiros em maio de 2018, por exemplo, contextualiza a década na qual nasceu Seu Didi, pai de Bertoluci, em 1943, e o seu período de exercício da profissão, de 1965 a 2015. Nestes anos, passou da ditadura militar à promessa do Brasil Grande, acelerando a marcha para o oeste e a ocupação do território, seguindo uma cartilha de modernização que significou devastação ecológica, latifúndios, monocultura, genocídio de populações indígenas, extrativismos e violência naturalizada.
“Se o caminhão era o que movia essa promessa de Brasil Grande, a decadência das condições de vida desses profissionais coincide com o fracasso das possibilidades de sonhar um futuro diferente e melhor”, escreve o autor da coluna. “Por isso, os anseios reacionários continuam ecoando e, aqui no interior de Goiás, talvez deem certa densidade ao silêncio que não permite pensar ou questionar esse caminho de autodestruição”, complementa.
Para Lopes, Bortoluci é certeiro quando avalia em O que é meu que os caminhoneiros são uma espécie de vanguarda da ambição neoliberal em converter trabalhadores em pequenos empreendedores desprovidos de direitos ou garantias. Como exemplo, o autor do livro cita em suas páginas: “todo risco que esses trabalhadores assumem é privado, e as surpresas no caminho podem arrasar seus sonhos de ascensão.”
Lopes conta que a diferença entre os dois pais é que o seu, Gilberto, 15 anos mais novo que Seu Didi, não se considerava um trabalhador, mas sim um explorador de fronteiras, alguém que queria “se dar bem” sem se colocar como empregado de ninguém. “Sendo uma daquelas crianças pardas (sem consciência racial) que são parcialmente adotadas por boas famílias brancas, ele sempre teve uma dívida impagável para cobrar do mundo e, por vezes, efetivamente não conseguia voltar para casa”, fala. “Algumas viagens demoravam seis meses e o resultado era sempre precário e de promessas tão vazias quanto ditas com sinceridade.”
Baseado no questionamento “como herdar a trajetória de meu pai?”, expresso em O que é meu, em conjunto com a pergunta sobre como justificar a manutenção desses valores autoritários e a normalização da violência, Lopes afirma que o desafio que esse livro enfrenta permanece válido, já que reivindicar uma herança e uma continuidade é um dilema para o Brasil. “Precisamos aprender a pensar nossa paisagem, o que é nosso, tentar traduzir o melhor no mais comum e seguir viagem.”
Ao final, o leitor encontra dicas de músicas, como Sonho de um caminhoneiro, de Milionário e José Rico, e Motorista de caminhão, de Léo Canhoto e Robertinho; e do filme Falcão – o campeão dos campeões (1987), dirigido por Menahem Golan, no qual Sylvester Stallone vive um caminhoneiro que luta pela guarda e o amor do filho. Também, além dos livros citados no texto, outra indicação é o Cowboys do asfalto. Música sertaneja e modernização brasileira (2015), de Gustavo Alonso.
SERVIÇO:
Coluna A Caminho
De Marcos Carvalho Lopes
Disponível em www.itaucultural.org.br