Entrevista com Paulo Serra: fora da curva
Em entrevista exclusiva ao ABCdoABC, Paulo Serra fala sobre sua gestão em Santo André, sua vida e suas perspectivas para o futuro
- Data: 09/05/2024 14:05
- Alterado: 09/05/2024 16:05
- Autor: Rodilei Morais
- Fonte: ABCdoABC
Paulo Serra em entrevista ao ABCdoABC
Crédito:Alex Cavanha/PSA
Em seu oitavo ano ocupando o cargo executivo na prefeitura de Santo André, Paulo Serra se colocou fora da curva entre seus pares. Pesquisas de opinião no último ano apontavam uma faixa de 28 a 68% de aprovação para os prefeitos das 10 maiores capitais brasileiras — a média, por volta dos 57%. O gestor andreense, por outro lado, supera os 80%. Esta ainda foi a aprovação mais alta em todo o estado de São Paulo, isso após uma reeleição com quase 77% dos votos.
Para entender este sucesso, a equipe do ABCdoABC visitou Paulo Serra em seu gabinete no fim da tarde desta quarta-feira (08) — e uma gestão com tamanho destaque exige uma entrevista que também saia dos padrões. Conversamos com o prefeito a respeito de sua trajetória e das transformações pelas quais a cidade passou em seus dois mandatos, falando ainda sobre os ideais que norteiam o trabalho de sua equipe e suas perspectivas para o futuro.
Confira a seguir a entrevista completa ou assista na íntegra no canal do YouTube do ABCdoABC.
Amor por Santo André
A prolífica atuação de Paulo Serra na prefeitura se traduz em obras e projetos que figuram nas matérias do ABCdoABC — e elas não são poucas. Começamos nossa conversa falando sobre este número e questionando as motivações do prefeito.
ABCdoABC: Primeiramente, prefeito, obrigado por nos receber em seu gabinete. Nós notamos um volume enorme de publicações no nosso portal com o termo “Paulo Serra,” somente em 2023 foram mais de 1.800. A grande pergunta é: como Paulo Serra tem energia para tudo isso?
Paulo Serra: Eu gosto muito de ser prefeito da cidade e tenho um orgulho muito grande em poder ser prefeito da cidade em que eu nasci. E o combustível também é o carinho das pessoas. Mas para acordar cedo todo dia e trabalhar até tarde, o principal é ter amor pelo que você faz. Eu tenho muito amor por essa cidade, pelas pessoas e por esse trabalho que é cuidar de tanta gente sendo de prefeito de Santo André. Então acho que o pique vem daí, de algo que a gente planejou há muito tempo também. Desde que eu entrei na política, e eu comecei em 2002, e o planejamento sempre foi ser prefeito da cidade.
Fui vereador duas vezes e prefeito duas vezes, então sempre muito focado na cidade aqui. Às vezes até eu mesmo me surpreendo, pra falar a verdade, quando eu vou ver a rede social, dar uma olhada na quantidade de publicações, de eventos, de vistorias e de obras. Mas a gente surpreende positivamente e a gente faz porque gosta.
ABCdoABC: Você mencionou um pouco do início da sua trajetória política. O seu avô foi candidato a vice-prefeito, seu pai também esteve na vida pública. Como foi crescer nesse ambiente, com com essas referências, e como isso influencia a sua atuação nos dias de hoje?
Os meus dois avôs, um chegou aqui na década de 20, meu avô paterno, Américo Pinto Serra e meu avô Leonardo Caruso, o pai da minha mãe, chegou na década de 30. Um de descendência italiana, outro portuguesa e formaram toda a família aqui em Santo André. A família é muito grande e praticamente toda na cidade. Eu já sou da segunda geração de “andreense da gema,” como a gente diz. A influência que meu avô teve, pode parecer estranha, mas não foi nem tanta política, porque meu avô foi candidato à vice do Brandão por ser amigo do Dr. Brandão.
Ele conheceu meu avô paterno, que era dono de uma alfaiataria. Naquela época o prefeito podia ter vários vices — inclusive, a escolha era separada, tanto que ganhou um prefeito de uma raia partidária e o vice era de oposição, na época. E meu avô foi para ajudar o Brandão mesmo, ele nunca se envolveu diretamente na política, tanto que nunca mais foi candidato. As paixões do meu avô eram Santo André, o 1º de Maio Futebol Clube, e a Beneficência Portuguesa, que ele fundou.
Meu pai já, também por uma herança do meu avô, foi candidato a vereador mesmo, e já entrou na política mais direta. Ficou primeiro como suplente, em 96 foi um vereador bem votado e depois, por vários motivos, não quis mais sair candidato.
Já em 2004, eu fui candidato a vereador, consegui a vitória e chegamos aqui. Mas a influência foi essa: mais até do que a própria política partidária, foi essa relação com a cidade. Isso é muito forte dentro de casa.
ABCdoABC: Vivendo a vida pública há algumas décadas e à frente do município há duas gestões, você com certeza vê os frutos do seu trabalho. Mas, como habitante da cidade, como você sente essa transformação no seu dia a dia?
Paulo Serra: Eu sinto, principalmente, a mudança da relação que as pessoas têm com a cidade. Acho que isso pra mim é a coisa mais tangível até do que as obras. Claro que as obras são importantes, a gente gosta de ver o parque bem cuidado, o Guaraciaba novinho, o Pedroso com vida; gosta de ver os teatros que a gente entregou funcionando, a saúde, tudo isso faz parte. Mas Santo André é uma cidade muito diversa e cada um enxerga e usa a cidade de um jeito. 40% da cidade nunca colocou o pé numa unidade de saúde pública da cidade. Então, quando a gente fala de saúde, a gente fala só para uma parte da população.
A nossa rede de educação tem 42 mil alunos, ela não é tão grande assim para uma cidade de quase 800 mil habitantes. Isso mostra que grande parte das pessoas também não usa a educação pública da cidade, que tem uma ótima qualidade. A mesma coisa se a gente colocar a questão do transporte coletivo. O que eu acho que une as pessoas é a relação com Santo André. E acho que aí é o nosso principal ponto, a gente ressuscitou o orgulho de viver em Santo André, esse sentimento de pertencimento. E isso eu percebo todo dia como cidadão, como morador.
Essa relação para mim é muito especial. E claro, as pessoas materializam isso para mim. Eu, a Carolina, a Maria, a gente é tratado sempre com muito carinho em qualquer canto da cidade. Isso é muito legal porque mostra que, ainda que a gente tenha desafios, muita obra ainda para tirar do papel, muita coisa para fazer, mas que hoje tem uma relação de confiança com Santo André.
Um trabalho em equipe
A transformação que Paulo Serra vê em Santo André não foi construída unicamente por ele. Em seus discursos, o prefeito sempre destaca e agradece os membros de sua equipe. Entre secretários e o corpo técnico da administração pública, mais de 10.000 pessoas estão envolvidas. Veja o que o gestor fala a respeito desse esforço em conjunto.
ABCdoABC: vimos a implementação da Faixa Azul na Prestes Maia e nós estamos em um trabalho com o Detran-SP em um trabalho sobre redução de velocidade visando diminuir acidentes. Existe algum planejamento para isso em Santo André?
Paulo Serra: A gente faz estudos constantes. Onde temos aumento do número de sinistros, de acidentes, a gente faz uma análise mais apurada. As nossas vias hoje são muito monitoradas — e a gente acabou com os radares móveis, mas mantivemos os fixos, que são sinalizados, com o intuito, não de multar, mas de proteger as pessoas. A fiscalização impede que haja abusos. Passamos de 30 para 3 mil câmeras.
Hoje a gente não vê, a priori, nenhuma necessidade imediata de reduzir. Na própria Prestes Maia, onde foi instituída a faixa, nós não reduzimos a velocidade no primeiro momento. Mexer só a velocidade, isoladamente, não faz sentido para mim. Eu acho que é mais um fator importante, mas que tem que ter toda uma conjuntura de análise para a gente mexer nisso.
ABCdoABC: Durante entregas e inaugurações, a gente sempre ouve muitos elogios à sua equipe. Isso vale para a mobilidade, saúde, educação, cultura: sempre sua fala se refere ao trabalho coletivo. As ideias e iniciativas costumam partir do seu grupo, ou de você para eles?
Paulo Serra: É um mix, né? Primeiro a gente partiu de um conceito aqui pra formatar essa equipe do técnico com o político. Em todas as secretarias você vê um adjunto político e um secretário técnico, ou vice-versa. A partir daí, tem ideias que eu mesmo trago pra equipe, e o pessoal brinca aí que eu lanço a flecha, o pessoal sai atrás. Quando a gente vai a Barcelona ou Dubai, na COP28, por exemplo, é claro que a gente traz ideias, mas a equipe também sugere.
A Faixa Azul partiu da equipe. É complexo pra você ter autorização do SENATRAM, é um processo que é até demorado. E a equipe criou um moto anel de 22 quilômetros, que já está aí para ser implementado. A gente conseguiu a primeira autorização de cinco quilômetros e vamos pedir os outros 17 para poder implementar.
E a gente também não tem nenhuma vergonha de copiar boas ideias de outras cidades, eu fico muito feliz porque Santo André, que no início da gestão era só importadora de ideias, hoje ela é uma exportadora uma referência. Acabamos de sediar a SmartCity Regional aqui, enfim, nós temos muita coisa boa para contar para as outras cidades.
A nossa equipe é muito dedicada, é muito apaixonada pela cidade. É muito legal que quase a totalidade dos secretários também vive em Santo André. Então eu brinco aqui que eles são personalidades da cidade hoje. E isso cria também neles uma obrigação de fazer o melhor. Porque ele também vai na pizzaria, vai na feira, vai na igreja, vai no restaurante, ele vive a cidade como cidadão.
ABCdoABC: ainda em relação a isso, o que um membro da sua equipe precisa ter no currículo ou de perfil para fazer parte deste grupo?
Paulo Serra: a primeira coisa é ser dedicado, ter respeito e carinho pelas pessoas. Que tenha uma consciência muito grande de que tudo que ele fizer vai impactar a vida de alguém. Esse é o primeiro conceito. Desde a hora que ele acorda até a hora que ele vai dormir, que tudo, qualquer atitude, pode ser uma secretaria meio, pode ser uma secretaria fim, pode ser um cargo meramente administrativo, burocrático, mas tem consequência.
Um processo que você não libera no dia, por qualquer motivo, pode ser a diferença de não olhar uma obra e de salvar uma vida. Então esse é um conceito que, para mim, é fundamental. Ter humildade para ouvir também, para conviver em equipe. Aqui ninguém, absolutamente ninguém, faz nada sozinho. Então essa coisa da convivência, essa coisa de ter a inteligência emocional para poder dividir espaço, às vezes dar um passinho para trás, ouvir o outro, para criar essa grande força coletiva, ela é fundamental.
Lidando com as críticas e com o futuro
ABCdoABC: Você teve uma vitória expressiva no primeiro turno da última eleição e a sua taxa de aprovação é altíssima. Isso com certeza é um sinal de que a população realmente está vendo o resultado do trabalho. Mas também aparecem pessoas querendo falar mal com ou sem fundamento. Como você enxerga isso e que mensagem você deixaria para quem critica?
Paulo Serra: Acho que eu vou começar pela crítica com o fundamento. Essa crítica tem que ser levada a sério e acho que ela tem um aspecto positivo. Quando a pessoa vem me pedir ou me criticar por alguma questão real, que está prejudicando a vida dela ali, ou que está prejudicando a cidade, nós temos que ter a humildade de admitir, de avaliar e, se for o caso, resolver o problema.
Eu acho que essa ligação que a gente tem mostra que as pessoas também chegam para nós porque confiam que a gente vai resolver o problema ou pelo menos dar um retorno. Tem uma questão de credibilidade. Eu acho que quando as pessoas desistem de reclamar é pior, porque ela se desconectou completamente do poder público e a gente viveu isso 20 anos antes da nossa gestão. Uma desconexão.
Dois políticos são muito importantes no cotidiano das pessoas: o presidente da república e o prefeito. São os dois mais importantes, com todo respeito aos demais. O presidente pela questão geral, economia, emprego, qualidade de vida. O prefeito é o dia a dia, a zeladoria, o buraco, a árvore, a saúde, a escola, o material do filho, o uniforme, o remédio imposto e esse sentimento de que a cidade é o local que a gente vive. Quando você fala: onde você mora? Você não fala no Brasil, fala em Santo André, você fala o nome da cidade.
Na questão da crítica infundada, neste ano mais politizado, acaba sendo mais comum. O que eu acho que não pode haver, mas infelizmente acontece, é uma ideologia partidária, é um preconceito, às vezes ideológico, que faz com que a pessoa seja mais apegada ao partido ou à política do que à cidade.
Primeiro quando a pessoa coloca uma questão partidária acima do interesse coletivo da cidade. Para mim não faz nenhum sentido. O partido errou, errou, acertou, acertou. Segundo quando a pessoa não considera nada de bom, só porque parte de alguém que pensa diferente dela.
A gente fez um belo trabalho na cultura aqui, e a cultura, só para dar um exemplo, a cultura sempre foi uma política pública que a esquerda tenta monopolizar como dela. Não é só a esquerda que faz cultura, a cultura é de todo mundo.
Então a gente às vezes nem responde, a gente ignora mesmo, porque não contribui com nada. Quando contribui, a gente tem que ouvir. E o mesmo preconceito que alguns políticos têm com relação a nós, a gente não pode ter com eles. Eu sempre digo, eu acho que essa coisa extrema direita e extrema esquerda atrapalha muito o Brasil. Mas tanto na direita quanto na esquerda tem coisas boas. E a gente tenta fazer um governo aqui equilibrado, governo que mostra que dá para fazer boa gestão, cuidar bem do dinheiro público, aquela gestão mais rígida, com responsabilidade fiscal que teoricamente é uma bandeira só da direita.
Mas fazer isso com olhar social, cuidando das pessoas que teoricamente é uma bandeira só da esquerda, a gente fez aqui. Dá para a gente fazer emprego, renda, empreendedorismo, facilitar a vida do empreendedor, incentivar a iniciativa privada, o governo liberal, economicamente falando — mas preservando patrimônio, preservando o meio ambiente. Não queremos que a cidade viva de tudo concreto, mas a gente quer que a cidade cresça.
ABCdoABC: Esse olhar social é uma influência da Ana Carolina?
Paulo Serra: Total, 100%. Até porque ela é mestre em Direito Social. A Ana Carolina, pra mim, não foi surpresa, porque, claro, eu sei da formação dela; mas causou uma certa surpresa como ela converteu tudo isso pra ir pra prática da política social e a quantidade de vidas que ela transformou. E aí ela teve reconhecimento também na candidatura a deputada.
Jamais a gente poderia imaginar que a Carolina ia ultrapassar os 100 mil votos de Santo André. É que de alguma forma as pessoas tiveram a vida delas tocada pela política social. E aí a hora delas reconhecerem isso, é ali no voto.
ABCdoABC: Sobre o PSDB, a partir de primeiro de janeiro você deve continuar presidente estadual do partido e sabe que ele precisa de muito trabalho pra voltar. Isso é o seu plano de trabalho agora?
Isso é um dos planos, um dos projetos que me agradam muito. Eu acho que o PSDB não é só a sigla em si, é o conceito. Ele é necessário pro Brasil. Alguém precisa puxar essa fila pra mostrar que existe vida inteligente longe dos extremos. E o PSDB tem quadros, tem capilaridade para fazer isso.
Não é visando só ganhar uma eleição nacional de novo, não. É dar alternativa pro Brasil, pra gente ter alternativa fora da radicalização da política. A gente polarizou com o PT a discussão nacional por um bom período — mas era saudável, muito mais do que é hoje, porque se discutia a política macroeconômica, se discutia inflação,reforma agrária, se discutia o planejamento do Brasil, a relação federativa.
Hoje a discussão ficou muito rasa e eu não estou dizendo aqui que a discussão de costumes não seja importante, mas não pode ser limitado a isso na eleição. A gente tem problemas mais urgentes, tem gente passando fome no Brasil, milhares de pessoas que ainda passam fome, o Brasil ainda tem miseráveis. Nós temos cidades com 80% de esgoto que não é tratado, quer dizer, nós temos problema de segurança pública ou generalizado, aqui nas grandes cidades, nos grandes centros, que é uma questão também nacional. Então eu acho que é absolutamente necessário pro Brasil, eu quero fazer parte desse processo.
ABCdoABC: Uma última pergunta, sobre uma pauta que também é polarizada nesses extremos, que são as mudanças climáticas. Nos seus Como você enxerga com seus essa consciência que é mostrada aqui na política pública relacionada ao meio ambiente de Santo André? Você se vê como um influenciador para que essa consciência se espalhe?
Paulo Serra: Tomara, eu não me enxergo assim ainda, mas tomara que eu esteja influenciando porque a gente precisa evoluir muito ainda nessa pauta no Brasil, muito, principalmente nas administrações municipais. E aí é compreensível porque a gente tem problemas muito urgentes de saúde, de zeladoria. Essa coisa da mudança climática há alguns anos atrás ainda estava muito distante, mas ela já chegou.
Nós estamos vivendo isso agora no Rio Grande do Sul e esse calorão aqui. Podia ser o contrário, ninguém pensou isso. 800 milímetros em três dias. A última grande chuva aqui do ABC em 2019, foram 180 milímetros, só pra gente ter uma ideia, e as cidades aqui, algumas cidades ficaram três dias debaixo d’água.
A mudança climática já chegou, pelo aquecimento, emissão de glases de efeito estufa, que aceleram também o aquecimento, os polos derretendo, enfim… Desde aquela chuva de 2019, comecei a estudar isso com mais profundidade. Estive em Dubai agora como convidado, e acho que foi incrível, foi a primeira vez que a ONU abre para as cidades, e eu vi o quanto o Brasil está atrasado.