Cidades do litoral de SP têm 25 mil imóveis em áreas de risco

A quantidade de pessoas em locais sujeitos a desastres no litoral preocupa

  • Data: 29/02/2024 12:02
  • Alterado: 29/02/2024 12:02
  • Autor: Redação
  • Fonte: CARLOS PETROCILO, GUSTAVO QUEIROLO, DIANA YUKARI E LUCAS LACERDA - FOLHAPRESS
Cidades do litoral de SP têm 25 mil imóveis em áreas de risco

Deslizamento de terra

Crédito:Reprodução

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A Baixada Santista e o litoral norte de São Paulo reuniam em 2022 ao menos 25.481 endereços domiciliares em áreas de risco, quase metade deles classificados como de “alto risco”.

Os dados foram obtidos a partir de um cruzamento entre as coordenadas geográficas do Censo Demográfico 2022, do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), e um mapeamento de suscetibilidade a deslizamentos feito pelo Serviço Geológico do Brasil (antiga CPRM).

As construções nesses endereços sofrem com exposição aos desastres naturais e lidam com riscos de desabamentos e inundações. No caso do litoral, boa parte dos imóveis foi edificada em encostas de montanhas, em áreas de alagamento ou de erosão costeira processo no qual a praia perde seus sedimentos.

Os endereços em locais de risco representam 1,93% do total de 1,32 milhão nas 13 cidades analisadas. Na combinação dos dois conjuntos de informações (domicílios do Censo e suscetibilidade a deslizamentos), 896 imóveis estavam em áreas sem classificação de risco (0,07% do total).

A quantidade de pessoas em locais sujeitos a desastres no litoral preocupa.

“Com o aumento da frequência e da intensidade desses eventos [climáticos] o risco aumenta, consequentemente expondo muitos cidadãos a catástrofes”, diz o especialista em gestão de risco Rodrigo Lilla Manzione, professor da Unesp em Ourinhos (SP).

“Um ano é em Petrópolis [RJ], em outro ano é em São Sebastião [SP]. Não é mais questão de se vai acontecer ou quando vai acontecer, é questão de onde vai acontecer”, afirma Manzione.

A estimativa é que ao menos 75 mil pessoas convivam em áreas de risco apenas no litoral de São Paulo. O cálculo é feito de acordo com a contagem do IBGE de três pessoas para cada domicílio no país.

“É um grande problema social e do crescimento desorganizado. A valorização do litoral atraiu pessoas para o trabalho em áreas turísticas e que acabaram ocupando áreas próximas por uma questão de sobrevivência”, afirma o engenheiro Luiz Fernando Orsini, um dos coordenadores da Abes (Associação Brasileira de Engenharia Sanitária e Ambiental).

De acordo com o levantamento, em 2022 São Sebastião contabilizava 3.402 domicílios classificados nas regiões de risco alto e de risco médio —isto é, 6% do total de imóveis na cidade.

Um ano atrás, em 19 de fevereiro de 2023, um temporal que provocou deslizamentos e desabamentos deixou 64 mortos em São Sebastião. Mais de 500 pessoas forçadas a deixar suas casas.

De acordo com a prefeitura, há obras de contenção em andamento na Vila Sahy e em outras áreas, e o governo de São Paulo entregou 704 casas para famílias afetadas pela tragédia. Há ainda dois terrenos que deverão ser usados para atender mais moradores de áreas de risco.

A Prefeitura de São Sebastião disse também que o governo do estado está fazendo obras de recuperação em Camburi e Juquehy, e o federal, em Boiçucanga —todas são praias que ficam no município.

A administração municipal afirma que desde o ano passado realizou nove simulados de saída de áreas de risco com voluntários dos bairros e que a cidade recebe informações diárias do Cemaden (Centro Nacional de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais), do Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia) e da Defesa Civil estadual.

Em termos percentuais, Ilhabela é a cidade com o maior índice de imóveis em áreas sujeitas a desastres. Dos 19.015 domicílios espalhados pela cidade, 3.918 estão em áreas de risco alto ou médio (21%).

Procurada pela Folha, a Prefeitura de Ilhabela não respondeu até a publicação deste texto. De acordo com a gestão Tarcísio de Freitas (Republicanos), a cidade recebeu um radar para monitorar tempestades e rajadas de vento em toda a costa paulista.

Os dados do IBGE comprovam que cidades litorâneas registraram aumento no número de habitantes nas últimas décadas, e a ocupação das encostas é um dos reflexos da expansão desordenada. O primeiro salto populacional ocorreu entre 1950 e 1970, período que coincide com a construção da rodovia Rio-Santos, rotulada na época como Estrada do Turismo.

A construção de casas de veraneio e prédios impulsionou, por sua vez, a chegada de mão de obra para a construção e o turismo.

Apesar da explosão demográfica, o litoral quase não foi contemplado pelas políticas de habitação do Governo de São Paulo nos últimos dez anos.

Cidades como Ilhabela, Praia Grande, Guarujá, Iguape e Mongaguá não tiveram nem sequer uma moradia popular entregue pelo poder público. Santos, o maior município da região e o mais beneficiado por políticas habitacionais, recebeu 1.146 casas populares entre fevereiro de 2013 e março de 2023.

Para Manzione e Orsini, diante de eventos climáticos extremos, a falta de investimentos em obras hidráulicas nas gestões públicas anteriores compromete ainda mais a segurança dos moradores.

O Governo de São Paulo, por exemplo, não investiu a totalidade das verbas previstas no orçamento para serviços e obras no combate às enchentes por 14 anos consecutivos. O montante supera R$ 8,1 bilhões deixados para trás desde 2010.

Esse dinheiro é previsto no orçamento do estado como a rubrica de Infraestrutura Hídrica e Combate a Enchentes. Nela estão projetos como implantação dos sistemas de drenagens, preservação das regiões de várzea e afluentes com o propósito de mitigar inundações, construções de reservatórios de águas pluviais os piscinões e manutenção da rede hidráulica.

“Infelizmente os governantes despertaram tardiamente. É preciso investimento pesado para lidar com eventos climáticos extremos. Isso inclui inclusive realocação de bairros inteiros em determinadas regiões”, afirma Manzione. “Passamos por um período grande de inércia quanto a obras hidráulicas capazes de auxiliar nesse processo, o que só agravou o quadro.”

O QUE DIZEM GOVERNO E PREFEITURAS

Em nota enviada à Folha de S.Paulo, a gestão Tarcísio afirmou que investiu, desde a tragédia de fevereiro de 2023, mais de R$ 1 bilhão no litoral norte, e que a verba foi destinada para construção de moradias e linha de crédito para fomento do turismo e economia, além de obras de infraestrutura, prevenção e incentivos para recuperação do local.

O governo do estado também disse que, no final de 2023, lançou o programa SP Sempre Alerta, com investimento de R$ 188 milhões para ampliar “ações de alertas em áreas de riscos com tecnologia de ponta para monitoramento meteorológico e proteção da população”.

Uma dessas ações, diz a nota, é o uso de sirenes para temporais em áreas de risco. Duas delas foram instaladas até o momento, uma na Vila Sahy, em São Sebastião, e a outra em Guarujá.

A Prefeitura de Guarujá citou, entre as ações, obras de contenção nos morros da Bela Vista (Macaco Molhado) e Barreira do João Guarda, atingidos por deslizamentos em 2020. Afirmou, ainda, que entregou 1.554 moradias entre 2017 e 2023.

A Prefeitura de Santos diz que promove obras de contenção e drenagem e de remoção de moradias em risco, além de ter entregue 2.133 casas nos últimos dez anos a moradores de palafitas e áreas de risco em morros —boa parte em parceria com a CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo) e o Minha Casa, Minha Vida, do governo federal.

Em Mongaguá, a prefeitura afirma que está em curso a criação de um programa habitacional. Destaca, ainda, a comunicação de alertas de desastre do Cemaden e de outras instituições por meio de redes sociais.

A Prefeitura de São Vicente diz, em nota, que usa no planejamento a carta geotécnica de aptidão à urbanização, do Serviço Geológico do Brasil, recebida em 2023, e planeja um mapeamento de perigo para este ano.

Em Cubatão, a prefeitura afirma que 156 famílias que vivem em local de risco no morro da Mantiqueira devem ser realocadas após a conclusão de obras feitas pela CDHU. Já as famílias do núcleo da Água Fria, diz a gestão, receberão 700 moradias na Ilha Caraguatá. Estão previstas ainda obras para abrigar 630 famílias da Vila Noel e parte dos Pilões.

A Prefeitura de Caraguatatuba diz que investiu ao menos R$ 300 milhões em drenagem desde 2017, pediu 144 moradias populares por meio do Minha Casa, Minha Vida e realocou 31 famílias que precisaram deixar suas casas no ano passado. Os moradores da cidade também recebem notificações sobre chuva em seus celulares.

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  • Data: 29/02/2024 12:02
  • Alterado:29/02/2024 12:02
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