Campanhas de educação no trânsito funcionam?

As campanhas educativas podem reduzir acidentes e criar um trânsito mais seguro, mas sua eficácia depende do planejamento e da escolha correta dos canais de comunicação

  • Data: 19/02/2025 14:02
  • Alterado: 19/02/2025 14:02
  • Autor: Luiz Vicente Figueira de Mello Filho
  • Fonte: ABCdoABC
Campanhas de educação no trânsito funcionam?

Crédito:Rovena Rosa/Agência Brasil

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Depende. O sucesso das campanhas de educação no trânsito está diretamente ligado à forma como o público-alvo é alcançado e sensibilizado. A engenharia de tráfego se insere na vida da maioria das pessoas no momento em que surge o desejo de conduzir um veículo motorizado. No entanto, o trânsito é um espaço compartilhado por motoristas, motociclistas, ciclistas, passageiros de transporte público e pedestres, o que evidencia a necessidade de uma educação contínua, independentemente do modo de locomoção escolhido.

Nos centros urbanos, a crescente presença de câmeras de monitoramento tem desempenhado um papel relevante não apenas na segurança patrimonial, mas também na captação de imagens que revelam imprudências. Essas imagens evidenciam a urgência de aprimorar a conscientização da população para promover um trânsito mais seguro, solidário e empático. Nesse contexto, as campanhas educativas surgem como ferramentas fundamentais para a prevenção de acidentes e a construção de uma cultura de respeito e responsabilidade.

Os três pilares da segurança no trânsito

A engenharia de tráfego sustenta-se em três pilares essenciais: engenharia, educação e fiscalização.

A engenharia é o ponto de partida, abrangendo o planejamento e o desenvolvimento de infraestruturas urbanas, como ruas, calçadas, semáforos e sinalização viária. O objetivo é garantir a fluidez do tráfego e a segurança de todas as pessoas nas vias.

A educação representa o pilar central para um trânsito mais consciente e humano. As campanhas de conscientização orientam a população sobre o cumprimento das normas estabelecidas pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e reforçam que o espaço público é coletivo. Afinal, mesmo dentro de um automóvel, o comportamento do condutor impacta diretamente o ambiente ao seu redor.

Por fim, a fiscalização garante o cumprimento das leis. As penalidades, muitas vezes vistas como punição, são, na verdade, instrumentos de dissuasão para reduzir comportamentos de risco. A ideia de “indústria da multa” se torna infundada quando se compreende que, ao respeitar as normas, as infrações deixam de existir.

O sucesso das campanhas de educação no trânsito depende, sobretudo, de um trabalho de base realizado nas escolas, especialmente no ensino fundamental. Ensinar às crianças os perigos do trânsito e as formas de se protegerem contribui para a segurança imediata e forma futuros cidadãos mais conscientes. Entretanto, esse ensino pode ser comprometido quando os exemplos dados pela família e pela sociedade contradizem o que é aprendido na escola.

O impacto do exemplo familiar na educação no trânsito

É comum observar pais parando em fila dupla na porta das escolas ou atravessando fora da faixa de pedestres, transmitindo mensagens contraditórias às crianças. Esse tipo de comportamento gera um conflito de valores que pode influenciar a percepção do que é certo ou errado. Quando essas crianças crescem, tendem a questionar a legitimidade das normas de trânsito, perpetuando práticas imprudentes.

Por isso, a educação no trânsito deve ser uma responsabilidade compartilhada entre a família, a escola e a sociedade, criando um ambiente de coerência e respeito às regras. E, consequentemente, as campanhas para o público adulto têm um papel fundamental na promoção do respeito aos limites de velocidade, no incentivo ao uso da faixa de pedestres e na prevenção da combinação de álcool e direção.

O Artigo 320 do CTB determina que 5% do valor arrecadado deve ser depositado mensalmente no Fundo Nacional de Segurança e Educação de Trânsito (FUNSET), sob a gestão da Secretaria Nacional de Trânsito (Senatran). Esses recursos devem ser aplicados em melhorias na sinalização, instalação de semáforos e adequação de calçadas, contribuindo para a segurança nas vias.

Um exemplo de campanha bem-sucedida é a da “mãozinha” em São Paulo, feita em 2011, cujo objetivo era incentivar o respeito à faixa de pedestres. A ampla divulgação em diferentes meios de comunicação alcançou um grande público e ajudou a reduzir atropelamentos na cidade. Por outro lado, algumas campanhas não obtêm o resultado esperado devido à escolha inadequada do meio de divulgação. Campanhas em rádio voltadas a motociclistas, por exemplo, têm baixa eficácia, pois esse público geralmente não ouve rádio enquanto pilota. Nesse caso, ações em redes sociais, aplicativos de entrega e plataformas de streaming seriam mais eficazes.

A eficácia das campanhas educativas está diretamente relacionada ao seu planejamento e à escolha dos canais de comunicação. Campanhas bem estruturadas, com linguagem adequada e veiculadas nos meios corretos, têm um alto potencial de reduzir acidentes e tornar o trânsito mais harmonioso. Por outro lado, campanhas realizadas apenas para cumprir exigências legais, sem considerar o perfil do público-alvo e o contexto local, resultam em desperdício de recursos e pouco impacto na sociedade.

Em suma, campanhas de educação no trânsito funcionam quando são bem planejadas, adequadas ao público-alvo e integradas a ações de engenharia e fiscalização. A conscientização deve começar nas escolas, com o apoio da família e da sociedade, para formar cidadãos mais responsáveis. Para os adultos, campanhas focadas na prevenção de comportamentos de risco, como o excesso de velocidade e o consumo de álcool ao volante, são essenciais para a redução de acidentes. O sucesso dessas ações depende tanto da correta aplicação dos recursos previstos em lei quanto da escolha dos meios de comunicação mais eficazes para cada público. Dessa forma, é possível transformar o trânsito em um espaço mais seguro, solidário e humano.

Luiz Vicente Figueira de Mello Filho

Luiz Vicente Figueira de Mello Filho
Divulgação/ABCdoABC

Especialista em mobilidade urbana e agente de transformação nesse setor. Atualmente, é colunista de mobilidade do portal ABCdoABC. Atua como pesquisador no Programa de Pós-Doutorado em Engenharia de Transportes e é professor credenciado na Faculdade de Tecnologia da Unicamp. Possui doutorado em Engenharia Elétrica pelo Departamento de Comunicação da FEEC/Unicamp (2020), mestrado em Engenharia Automotiva pela Escola Politécnica da USP (2009) e pós-graduação em Comunicação e Marketing pela Faculdade Cásper Líbero (2005). Formado em Administração de Empresas (2002) e Engenharia Mecânica (1999) pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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  • Data: 19/02/2025 02:02
  • Alterado:19/02/2025 14:02
  • Autor: Luiz Vicente Figueira de Mello Filho
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