Brasil e União Europeia travam disputa diplomática sobre como taxar carbono de navios

Taxação de US$ 50 (R$ 309) por tonelada de CO2 poderia resultar em uma diminuição global do PIB real em 0,04%, comparando-se aos dados de 2014.

  • Data: 01/01/2025 11:01
  • Alterado: 01/01/2025 11:01
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: FOLHAPRESS
Brasil e União Europeia travam disputa diplomática sobre como taxar carbono de navios

Navio

Crédito:Husni/Marine Traffic / Reprodução

Você está em:

A delegação brasileira na Organização Marítima Internacional (IMO) está intensificando suas ações para contestar uma proposta da União Europeia que visa taxar todas as emissões de gases de efeito estufa provenientes de embarcações, incluindo aquelas que operam em rotas nacionais. O governo brasileiro argumenta que essa iniciativa resultaria em um aumento nos custos dos principais produtos de exportação do país, potencialmente impactando negativamente o Produto Interno Bruto (PIB).

A IMO estabeleceu, no ano passado, um objetivo ambicioso de eliminar gradualmente as emissões da indústria marítima até 2050, exigindo que os navios reduzam suas emissões em 40% até 2030, em comparação com os níveis de 2008.

Para alcançar essa meta, a IMO está considerando a implementação de taxas sobre as emissões de cada navio. Embora o Brasil tenha inicialmente se oposto à introdução dessas taxas, acabou por ser derrotado na votação. Atualmente, o país busca consolidar um grupo de nações em desenvolvimento para atenuar uma proposta que considera prejudicial ao custo do transporte marítimo e, consequentemente, à sua economia.

A decisão final sobre a questão deverá ocorrer em abril. Antes disso, haverá reuniões em Londres nos meses de fevereiro e março entre as delegações dos países membros da IMO para discutir o assunto.

A proposta da União Europeia sugere a tributação de todas as emissões dos navios, independentemente das metas estipuladas pela organização. Sob este modelo, cada tonelada de CO2 emitida custaria entre US$ 100 (aproximadamente R$ 618) e US$ 350 (cerca de R$ 2.163), com a arrecadação sendo direcionada a um fundo destinado ao desenvolvimento de tecnologias voltadas à descarbonização do setor. A proposta conta com o apoio dos pequenos estados insulares em desenvolvimento, um grupo de 39 nações que enfrentam desafios significativos devido ao aquecimento global.

Em contrapartida, o Brasil apresentou uma alternativa na qual a taxação se aplicaria apenas às emissões que excederem as metas estabelecidas. Por exemplo, se a meta fosse de 100 toneladas por navio e a emissão real fosse de 110 toneladas, a taxa seria aplicada apenas sobre as 10 toneladas adicionais. Esta proposta é respaldada por aproximadamente dez países, incluindo China, Egito, Bangladesh e Togo. A Noruega também se manifestou favoravelmente à abordagem brasileira.

Considerando que a União Europeia representa um bloco significativo com seus 27 países e conta ainda com o apoio de outras nações desenvolvidas e das ilhas afetadas pelo clima, a ampliação do suporte à proposta brasileira parece improvável. Entretanto, o Brasil acredita que aumentar o número de países contrários ao modelo europeu poderia facilitar negociações futuras, visto que uma divisão nas discussões poderia comprometer a credibilidade da IMO em assuntos relacionados à segurança marítima.

Para embasar sua posição, a delegação brasileira tem compartilhado estudos com países em desenvolvimento sobre os impactos econômicos da taxação integral das emissões. Um levantamento realizado pela Universidade de São Paulo (USP) sugere que as economias emergentes dependentes da exportação de commodities seriam as mais afetadas pela medida, enquanto alguns países desenvolvidos poderiam se beneficiar.

O estudo indica que uma taxação de US$ 50 (R$ 309) por tonelada de CO2 poderia resultar em uma diminuição global do PIB real em 0,04%, comparando-se aos dados de 2014. Contudo, as repercussões variam significativamente entre as regiões analisadas.

Na África, os efeitos seriam especialmente severos: estima-se uma redução de 0,087% no PIB das nações orientais do continente e 0,067% nas ocidentais. As regiões sul e norte do continente enfrentariam reduções menores. Nas Américas Central e do Sul, espera-se uma queda equivalente a 0,016%, semelhante à observada nas nações do sudeste asiático. Em contraste, os países europeus poderiam experimentar um leve aumento no PIB em torno de 0,004%.

Essas discrepâncias são atribuídas ao impacto diferenciado da taxação nas principais exportações dos países. No caso específico do Brasil, onde soja, petróleo e minério de ferro são os produtos mais exportados – tendo como principal mercado a China – as embarcações que transportam esses bens precisam percorrer longas distâncias e acabam emitindo quantidades maiores de CO2. Assim, esses produtos estariam sujeitos aos impactos diretos da taxação proposta pela União Europeia.

Além disso, o aumento nos custos do frete pode levar a alterações nas cadeias globais de suprimentos; por exemplo, no setor mineral onde atualmente a Vale enfrenta forte concorrência das mineradoras australianas no mercado chinês. Se o transporte da commodity brasileira se tornar mais oneroso devido às novas taxas, é provável que os importadores chineses optem por aumentar suas compras do minério australiano.

A preocupação se estende também ao transporte marítimo nacional (cabotagem), cuja taxação poderia incentivar empresas brasileiras a recorrerem ao transporte rodoviário sem limites legais para emissões. Luís Resano, diretor-executivo da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (ABCA), expressou: “Na navegação curta há constantes entradas e saídas dos portos e o combustível consumido durante esses períodos deve ser contabilizado como emissões.”

Visando encontrar um meio-termo com os países europeus e insulares, o Brasil pretende propor uma estrutura tributária que não onere excessivamente as economias em desenvolvimento enquanto ainda garanta recursos significativos para iniciativas climáticas. Flávio Mathuiy, assessor da Comissão Coordenadora do Brasil para Assuntos da IMO, declarou: “Nos opomos a medidas cujo propósito seja apenas gerar receita; buscamos soluções que promovam uma transição energética eficiente.”

No cenário futuro das discussões sobre política ambiental no comércio internacional destaca-se a possível participação dos Estados Unidos sob a liderança do ex-presidente Donald Trump. Os EUA têm sido críticos em relação às políticas ambientais que possam impactar negativamente a economia global e até o momento mantêm uma postura discreta nesta discussão diplomática.

Compartilhar:

  • Data: 01/01/2025 11:01
  • Alterado:01/01/2025 11:01
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: FOLHAPRESS









Copyright © 2025 - Portal ABC do ABC - Todos os direitos reservados