‘A Embrapa tem de estar mais perto do produtor’, diz presidente da instituição
O pesquisador Celso Moretti, confirmado na última sexta-feira (20) na presidência da Embrapa, diz que a prioridade agora é dar sequência ao processo de mudança da empresa
- Data: 25/12/2019 11:12
- Alterado: 25/12/2019 11:12
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
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Entre as mudanças estão a descentralização de ações hoje concentradas na sede, em Brasília; a revisão do número de cargos comissionados e aproximação com o setor privado.
Até então, Moretti ocupava interinamente a presidência da Embrapa, após a saída de Sebastião Barbosa, que havia sido indicado pelo ex-presidente Michel Temer. “Em 2019, nós dobramos o número de projetos em parceria com setor produtivo”, disse Moretti. “Queremos também revisitar a agenda das nossas unidades para que elas trabalhem de forma mais próxima e mais responsiva ao agro brasileiro.” Moretti está há 25 anos na Embrapa. Iniciou a carreira como pesquisador, foi chefe da Embrapa Hortaliças, chefe do Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento (DPD) e diretor executivo de Pesquisa & Desenvolvimento. A seguir, principais trechos da entrevista.
Qual é a prioridade, agora que o sr. foi oficializado no comando da Embrapa?
Temos uma orientação muita clara da ministra (da Agricultura, Tereza Cristina) de fazer um conjunto de mudanças que tinham de ser feitas na empresa. Estamos adotando o lema “mais Brasil, menos Brasília”. Precisamos descentralizar algumas ações que estão centralizadas aqui na sede. Também temos de rever uma série de processos na empresa, como o número de cargos comissionados. Aí há toda uma agenda externa: queremos seguir nos aproximando do setor produtivo. Eu estava na diretoria de pesquisa e desenvolvimento, e iniciamos um trabalho de aproximação forte das nossas unidades com o setor privado. Em 2019, nós dobramos o número de projetos em parceria com setor produtivo. Queremos também revisitar a agenda das nossas unidades, para que elas trabalhem de forma mais próxima e responsiva ao agro brasileiro.
Como fica o processo de “repotencialização” da Embrapa defendido pelo presidente Jair Bolsonaro?
Nós tivemos três vitórias no Congresso junto com o apoio dos parlamentares e da própria ministra. Primeiro, foi a questão do próprio PPA (Plano Plurianual) 2020 a 2023, em que nós tivemos confirmação do nosso orçamento inicialmente previsto. A segunda foi a questão da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) e a terceira foi a LOA (Lei Orçamentária Anual). Conseguimos aumentar o nosso orçamento para as despesas discricionárias (não obrigatórias) na ordem de R$ 80 milhões para 2020. A gente teria um orçamento de algo em torno de R$ 200 milhões e agora teremos algo ao redor de R$ 280 milhões. Isso é parte dessa trajetória de fortalecer o trabalho da Embrapa. Com a proximidade maior com o setor privado, queremos aumentar nossa capacidade de captação de recursos. Então vamos sentar com o setor privado, discutir a formação de fundos de financiamento de pesquisa, similares aos que existem nos EUA. Pretendemos também desmobilizar terras. A Embrapa tem uma quantidade enorme de terras, da ordem de 106 mil hectares, que não faz sentido mais manter no nosso patrimônio.
Em termos de pesquisa, qual é o direcionamento para 2020?
Há algumas frentes. A Embrapa tem uma programação de pesquisa bastante ampla, em função do próprio tamanho do agro, que representa 23% do PIB. Precisamos focar realmente nos problemas da agricultura e do produtor brasileiro. Em 2020, vai estar na nossa agenda a questão da edição genômica para, por exemplo, editar o genoma da soja para dar resistência a nematoides e adaptação à seca. Nisso estamos trabalhando em parceria com duas empresas privadas. Nós vamos seguir avançando com a intensificação sustentável, a integração lavoura-pecuária-floresta, que hoje já tem 15 milhões de hectares no Brasil. Vamos avançar muito na questão da bioeconomia, essa economia de base biológica. Tem ainda a questão da agricultura digital, e o Congresso acaba de aprovar uma legislação de conectividade (projeto que permite uso do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações para ampliar o acesso à internet no Brasil passou pelo plenário da Câmara dos Deputados e agora volta ao Senado). Só 65% do nosso território está conectado à internet, enquanto a China tem 95% do território conectado. Se queremos avançar em agricultura digital, precisamos de conectividade.
A Embrapa tem trabalhado com novas tendências, como proteínas vegetais?
Sim. A Embrapa assinou um contrato com a Marfrig para desenvolvimento de alimentos à base de proteína vegetal. A Minerva também nos procurou. Desenvolvemos um hambúrguer a partir da fibra do caju, e o Brasil produz hoje 60 mil toneladas de fibra de caju que não tinham destinação. Uma parceria com uma empresa do Rio, a Sottile Alimentos, permitiu que produzíssemos hambúrguer a partir de fibra de caju. O negócio de proteína vegetal representa algo em torno de US$ 5 bilhões, mas até 2030 nós vamos ter algo em torno de US$ 120 bilhões nesse mercado.
E na área internacional?
O Brasil é líder em tecnologia para agricultura tropical. Precisamos voltar a trabalhar fortemente na África, porque ela está no meio do caminho entre o Brasil e o nosso maior cliente, que é a China. Até 2030, 50% da classe média mundial vai estar no Sudeste Asiático. O Brasil não pode ficar longe disso. Tenho defendido em conversas com a própria ministra que nós devemos trabalhar mais fortemente em parcerias com países africanos, pois 60% das terras agricultáveis do mundo estão na África, são 400 milhões de hectares de savana. E as savanas africanas são muito parecidas com o Cerrado brasileiro.