Maior universidade da Argentina, UBA declara emergência orçamentária
Verba destinada ao ensino superior pelo governo Milei repete a de 2023, mas sem correção pela inflação, que passa de 280%
- Data: 15/04/2024 13:04
- Alterado: 15/04/2024 13:04
- Autor: Redação
- Fonte: Mayara Paixão/Folhapress
Universidade de Buenos Aires
Crédito:Reprodução
Instituição de ensino de maior prestígio na Argentina e amplamente buscada por brasileiros, a Universidade de Buenos Aires declarou situação de emergência orçamentária. A direção da UBA, como é conhecida, está em linha de colisão com o governo Milei.
O Conselho Universitário da instituição afirmou na última semana que há um risco de desfinanciamento da universidade, “comprometendo suas funções essenciais, como a educação universitária, a pesquisa científica e a atenção de saúde a mais de meio milhão de pacientes”.
O ponto-chave do imbróglio está no fato de o presidente Javier Milei ter ordenado a prorrogação do orçamento vigente em 2023 para este ano de 2024, sem ajustes ou quaisquer aumentos. A inflação dos últimos 12 meses na Argentina está em 287,9%, segundo os últimos dados.
Milei o fez por meio de um megadecreto – o pacotão do chamado DNU – que já foi rechaçado pelo Senado local, mas ainda espera análise da Câmara, onde pode ser aprovado e, assim, seguir em vigor.
Na prática, o orçamento previsto para a UBA, de 130 bilhões de pesos argentinos em 2023, foi mantido para este 2024. Ocorre que, com a inflação exorbitante no país, corrigir esse valor exigiria que para o ano corrente ele, no mínimo, fosse triplicado, o que não ocorreu.
“Com essa política decidiram pelo fechamento da UBA”, disse há poucos dias ao La Nacion o reitor Ricardo Gelpi.
“Em dois ou três meses, se não for atualizada a parte econômica, não poderemos funcionar. Acho que há um desconhecimento de como a UBA funciona. Não se pode negar que na Argentina há coisas que não estão funcionando, mas a UBA não entra nisso.”
Em março passado, quando uma paralisação levou as instituições de ensino superior a cruzarem os braços já com a demanda orçamentária, o Ministério do Capital Humano, onde está alocada a Secretaria de Educação, anunciou um aumento de 70%, mas não no orçamento geral da educação superior, e sim nos gastos de funcionamento.
O Conselho Universitário da UBA diz que, ao cabo, o recorte em seu orçamento em termos reais, de um ano para o outro, foi de 80%. “Para cada 10 pesos que a UBA contava em março de 2023, hoje dispõe apenas de 2”, disse a instância máxima da universidade.
Ao longo das últimas semanas, o cenário tem levado a repetidas mobilizações estudantis e docentes, que promovem “abraços” nos prédios das universidades e distribuem lambe-lambes pelas paredes das instituições em tom crítico a Milei.
A própria UBA declarou que se somará a uma marcha universitária convocada para o próximo dia 23 na Praça de Maio, cuja reivindicação principal é justamente o aumento no orçamento para a educação.
Estudo recente da ONG Associação Civil pela Igualdade de Justiça com base nos dados públicos disponibilizados pelo governo mostra que, se não houver nenhuma atualização, o orçamento deste ano será o mais baixo para o desenvolvimento da educação superior em 26 anos.
Ainda de acordo com o levantamento com valores já corrigidos pela inflação, para 2024 a verba destinada para esse fim é 72% mais baixa que a destinada no ano anterior. Todo esse cenário ampliou a rixa entre Milei e o alto escalão de algumas instituições como a UBA, com trocas de farpas em entrevistas e redes sociais.
Nesta segunda-feira (15), por exemplo, o presidente ultraliberal fez diversas publicações no X criticando o que chama de “doutrinação” na UBA e compartilhando cartazes na universidade com críticas a ele. “Negam a doutrinação e a perseguição, mas são inimigos das ideias de liberdade”, escreveu em um deles. “Há diversidade, sim, menos quando você tiver a péssima ideia de querer ser liberal.”
O tema do que Milei chama de “doutrinação” no sistema de ensino vem ganhando peso no país. Há pouco mais de uma semana, o governo anunciou que prepara mudanças na Lei da Educação para impedir essa prática e para criar canais de denúncia, para que pais e alunos possam falar quando sentirem que não têm sua “liberdade respeitada”.