Racismo no futebol: caso Vini Jr., caso envolvendo outros jogadores e legislação

Após o caso de racismo sofrido por Vinícius Júnior, contextualizamos o caso dele e apresentamos um histórico de outros casos de racismo no futebol, além das legislações sobre o racismo

  • Data: 23/05/2023 18:05
  • Alterado: 31/08/2023 13:08
  • Autor: Gabriel de Jesus
  • Fonte: ABCdoABC
Racismo no futebol: caso Vini Jr., caso envolvendo outros jogadores e legislação

Vinícius Júnior sofreu xingamentos racistas durante a partida Valência 1x0 Real Madrid

Crédito:Jose Jordan/AFP

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Após o caso de racismo envolvendo o jogador brasileiro Vinicius Júnior, atuando pelo Real Madrid em partida contra o Valência, pelo Campeonato Espanhol, no último domingo (21/05) ouvimos as falas do presidente da LaLiga, Javier Tebas, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cobrar punições às autoridades espanholas e também o apoio de clubes e jogadores do futebol mundial para o atacante brasileiro.

Porém, realizamos um levantamento de todo o contexto que envolve o racismo no futebol, desde o acontecimento mais recente do Vinicius Júnior até outros casos. Iremos esclarecer o que diz a legislação espanhola e brasileira a respeito; quais são os códigos de conduta em casos de racismo por parte da CBF, uma vez que no próprio futebol brasileiro já foram denunciados casos de racismo; da LaLiga; da Federação Espanhola e principalmente da FIFA.

O que aconteceu com o Vinicius Júnior na partida contra o Valência?

No início do segundo tempo da partida entre Real Madrid e Valência, torcedores do Valencia atiraram uma bola no campo para que atrapalhasse o ataque do time madrilenho. A partida teve de ser paralisada e foi possível ouvir parte do estádio gritando em castelhano “mono”, que significa macaco em português.

Vinicius Júnior reclamou para o árbitro a respeito do ocorrido direcionando para um torcedor específico. A partida foi paralisada por 10 minutos e o locutor do estádio pediu para que a torcida parasse com os cânticos.

Mata-leão

Nos minutos finais, Vini discutiu com o goleiro Mamardashvili e o clima esquentou. Foi quando ele levou um mata-leão do atacante Hugo Duro e reagiu erguendo o braço no rosto do jogador do Valencia.

Vini Jr. expulso

Inicialmente, Vinicius levou cartão amarelo. Após revisão no VAR, o árbitro De Burgos Bengoetxea expulsou o atacante do Real Madrid. Hugo Duro, que aplicou o mata-leão no brasileiro, seguiu em campo.

Após o jogo, Vinicius Júnior se manifestou no Twitter

“Não foi a primeira vez, nem a segunda e nem a terceira. O racismo é o normal na La Liga. A competição acha normal, a Federação também e os adversários incentivam. Lamento muito. O campeonato que já foi de Ronaldinho, Ronaldo, Cristiano e Messi hoje é dos racistas. Uma nação linda, que me acolheu e que amo, mas que aceitou exportar a imagem para o mundo de um país racista. Lamento pelos espanhois que não concordam, mas hoje, no Brasil, a Espanha é conhecida como um país de racistas. E, infelizmente, por tudo o que acontece a cada semana, não tenho como defender. Eu concordo. Mas eu sou forte e vou até o fim contra os racistas. Mesmo que longe daqui”.

O presidente da LiLiga, responsável pelo Campeonato Espanhol, respondeu…

“Já que aqueles que deveriam não te explicam o que é que LaLiga pode fazer nos casos de racismo, tentamos nós explicarmos, mas você não se apresentou em nenhuma das datas acordadas que você mesmo solicitou. Antes de criticar e injuriar LaLiga, é necessário se informar adequadamente, Vini Jr”, escreveu Tebas.

“Não se deixe manipular e tenha certeza de entender bem as competências de cada um e o trabalho que estamos fazendo juntos”, seguiu o presidente de La Liga.

Em resposta, ao presidente da LaLiga, afirmou que a “imagem do campeonato está manchada”.

“Mais uma vez, em vez de criticar racistas, o presidente da LaLiga aparece nas redes sociais para me atacar. Por mais que você fale e finja não ler, a imagem do seu campeonato está abalada. Veja as respostas do seus posts e tenha uma surpresa… Omitir-se só faz com que você se iguale a racistas. Não sou seu amigo para conversar sobre racismo. Quero ações e punições. Hashtag não me comove”.

Presidente Lula se solidariza com Vinícius Júnior

Na noite do mesmo domingo (21) em que Vinícius Júnior foi vítima de racismo na Espanha, o presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em viagem ao Japão, declarou apoio ao jogador brasileiro e declarou que o Governo irá cobrar punições por parte da justiça espanhola.

“Ele [Vinicius Jr.] foi fortemente atacado, sendo chamado de macaco. Não é possível que, quase no meio do século 21, a gente tenha o preconceito racial ganhando força em vários estádios de futebol na Europa. Não é justo que um menino pobre, que venceu na vida, que está se transformando num dos melhores jogadores do mundo, certamente do Real Madrid é o melhor, ser ofendido em cada estádio que comparece”

“Penso que é importante que a Fifa, a Liga Espanhola e as ligas de outros países tomem sérias providências porque nós não podemos permitir que o fascismo tome conta, e o racismo, dentro dos estádios de futebol”, completou.

Real Madrid formaliza denúncia

Na manhã desta última segunda-feira (22/05) o Real Madrid formalizou uma denúncia junto à Procuradoria Geral do Estado contra os crimes de racismo cometidos contra Vinícius Júnior, no último domingo (21), na partida contra o Valência, pelo Campeonato Espanhol.

Não é a primeira, nem a segunda vez que Vini Jr sofre racismo na Espanha

Este foi o décimo episódio noticiado como racismo contra Vinícius Junior na Espanha. E esse levantamento mostra que os episódios de racismo contra o jogador estão se intensificando: houve um caso em 2021, três em 2022 e seis neste ano.

“O Real Madrid CF manifesta a sua mais forte repulsa e condena os acontecimentos ocorridos ontem contra o nosso jogador Vinícius Junior. Esses fatos constituem um ataque direto ao modelo de convivência de nosso Estado social e democrático de direito. O Real Madrid considera que tais ataques também constituem um crime de ódio, razão pela qual apresentou a denúncia correspondente à Procuradoria-Geral do Estado, especificamente à parte que cuida de crimes de ódio e discriminação, para que os fatos sejam investigados e apuradas as responsabilidades. O artigo 124 da Constituição espanhola estabelece as funções do Ministério Público para promover a ação da justiça em defesa da legalidade e dos direitos dos cidadãos e do interesse público. Por este motivo, e dada a gravidade dos fatos ocorridos, o Real Madrid recorreu à Procuradoria, sem prejuízo de seu caráter privado no processo instaurado” – afirmou a diretoria do clube em nota.

Confira abaixo o que aconteceu em cada episódio.

1) 24 de outubro de 2021 – Barcelona 1 x 2 Real Madrid

O episódio mais antigo de racismo contra Vinícius Junior na Espanha foi noticiado em 24 de outubro de 2021, um ano depois de ele chegar ao clube madrilenho.

O incidente aconteceu no estádio Camp Nou, durante um clássico contra o Barcelona vencido pela equipe de Vinícius. Um torcedor fez ataques considerados racistas ao brasileiro e o incidente chegou a ser denunciado às autoridades espanholas.

No entanto, o caso foi arquivado porque as autoridades disseram que não conseguiram identificar o agressor.

2) 14 de março de 2022 – Mallorca 0 x 3 Real Madrid

Vinícius marcou um dos gols na vitória do Real Madrid e voltou a ouvir xingamentos racistas da arquibancada.

Novamente o caso foi denunciado às autoridades, que arquivaram as acusações, afirmando que não constataram crime de ódio.

Meses depois, o capitão do Mallorca, Antonio Raíllo, acusou Vinícius Junior de provocar seus adversários com danças. “Quando é chamado de provocador, ele usa o coringa do racismo”, disse Raíllo à imprensa espanhola.

3) 18 de setembro de 2022 – Atlético Madrid 1 x 2 Real Madrid

Vídeos circularam mostrando torcedores do Atlético chamando Vinícius Junior de macaco antes da partida, nas proximidades do estádio.

O caso foi investigado por autoridades que chegaram a conclusão que as provocações entre torcedores aconteceram dentro da normalidade da rivalidade esportiva — e que os insultos racistas duraram “apenas alguns segundos”.

Naquela semana Pedro Bravo, presidente da Associação Espanhola de Empresários de Jogadores, havia dito que Vinícius Junior precisava parar de provocar os adversários e deixar de “fazer macaquices”.

“Você tem que respeitar o rival. Se quer dançar, que vá ao sambódromo no Brasil”, disse ele.

4) 30 de dezembro de 2022 – Valladolid 0 x 2 Real Madrid

Vinícius havia sido substituído na partida e estava passando em frente a torcedores do Valladolid quando o Real Madrid fez um gol. Ele comemorou diante dos torcedores do Valladolid e foi alvo de xingamentos racistas.

Autoridades espanholas investigaram o caso e propuseram uma multa de 4 mil euros e o banimento dos torcedores envolvidos.

O próprio Valladolid baniu 11 torcedores pelo resto da temporada.

Vinícius criticou a La Liga por não agir contra o racismo.

“Os racistas seguem indo aos estádios e assistindo ao maior clube do mundo de perto e a LaLiga segue sem fazer nada… Seguirei de cabeça erguida e comemorando as minhas vitórias e do Madrid. No final a culpa é minha”, escreveu o jogador no Twitter.

O presidente da La Liga, Javier Terbas, respondeu também na rede social: “A LaLiga combate o racismo há anos. Vini Jr, é muito lamentável e não é verdade publicar que a LaLiga não faz nada contra o racismo. Se informe melhor. Estamos à sua disposição para que todos juntos, possamos caminhar na mesma direção”

5) 26 de janeiro de 2023 – Real Madrid 3 x 1 Atlético Madrid

Na véspera do jogo, torcedores do Atlético Madrid penduraram em uma ponte da cidade um boneco vestido com a camiseta de Vinícius Junior, simulando enforcamento do jogador.

O boneco estava com mensagens de ódio contra o atacante e o clube.

A atitude despertou mensagens de repúdio da Confederação Brasileira de Futebol e dos dois clubes. Na internet, a hashtag #BailaViniJr viralizou.

6) 5 de fevereiro de 2023 – Mallorca 1 x 0 Real Madrid

Um torcedor de 20 anos proferiu ofensas racistas contra Vinícius Junior durante a partida. O homem foi identificado pela polícia e o clube proibiu seu acesso a jogos no estádio.

Ele está sendo processado pelas autoridades espanholas, já que é reincidente de abusos racistas contra outro jogador.

As autoridades espanholas estudam aplicar uma multa de 3 mil euros e um banimento de seis meses nos estádios de futebol.

7) 18 de fevereiro de 2023 – Osasuna 0 x 2 Real Madrid

Vinícius Junior foi alvo de xingamentos racistas. Ele foi agredido verbalmente até mesmo durante o minuto de silêncio realizado em homenagem às vítimas dos terremotos na Turquia e na Síria.

8) 5 de março de 2023 – Betis 0 x 0 Real Madrid

Novamente Vinícius Junior foi chamado de macaco por torcedores em Sevilha quando cobrava um escanteio na partida.

A La Liga encaminhou o caso para as autoridades espanholas.

9) 19 de março de 2023 – Barcelona 2 x 1 Real Madrid

Pela segunda vez, torcedores do Barcelona foram denunciados por insultos racistas a Vinícius Junior durante a partida.

A La Liga emitiu uma nota: “Em vista dos eventos que aconteceram durante o jogo Barcelona x Real Madrid, no qual um intolerável comportamento racista foi novamente observado contra Vinícius Junior, a La Liga reportou os insultos racistas à Corte de Instrução de Barcelona. Esta é a oitava queixa feita pela La Liga às autoridades correspondentes por abusos racistas contra Vinícius Junior.”

10) 21 de maio de 2023 – Valencia 1 x 0 Real Madrid

Antes da partida, vídeos mostram torcedores do Valencia cantando músicas em que chamam Vinícius Junior de macaco.

Durante a partida, o jogador brasileiro confrontou torcedores que o xingavam na arquibancada. O árbitro chegou a interromper a partida por alguns minutos e foi feito um aviso contra racismo no alto-falante.

Após o jogo, Vinícius criticou a La Liga e foi rebatido pelo presidente da entidade.

Polícia da Espanha prende sete pessoas por racismo e crime de ódio em Valência e Madri

Sete pessoas envolvidas no caso de racismo e crime de ódio sofrido por Vinícius Júnior no último domingo (21/05) foram presas. “A Polícia Nacional deteve hoje três jovens em Valência por comportamento racista ocorrido no passado domingo no jogo entre Valencia e Real Madrid”, anunciou o órgão.

Além das três detenções na cidade de Valência (o trio foi dispensado depois de três horas prestando depoimento)), outras quatro pessoas foram presas em Madri em decorrência de um caso de crime de ódio também envolvendo Vinicius Jr., , que teve um boneco com sua camisa pendurado em uma ponte em janeiro.

Entenda o caso do boneco pendurado

Em 26 de janeiro, antes da partida diante do Atlético de Madrid, pela Copa do Rei, ultras da torcida “Frente Atlético”, penduraram um boneco com uma camisa de Vinicius Jr. do Real Madrid, em uma ponte em Valdebebas, em frente ao CT do clube merengue.

Na ocasião, o Atlético de Madrid emitiu um comunicado oficial após o ocorrido. O clube espanhol disse que “os atos foram repugnantes e inadmissíveis que envergonham a sociedade”.

O que diz a Lei espanhola à respeito do combate ao racismo?

A Lei 19/2007 tem como objetivo determinar um conjunto de medidas destinadas para erradicar o racismo, além de determinar o regime de sanções de acordo com cada situação.

Infrações graves – além do menosprezo de uma pessoa ou grupo de pessoas em relação à origem racial ou étnica, a passividade na repressão de comportamentos intolerantes e a omissão de medidas de segurança também são consideradas infrações graves.

Infrações muito graves – nestes casos a multa pode variar entre 60.000,01 e 650.000,00 euros. Além disso, podem ser impostas aos organizadores de competições a inabilitação para a organização de eventos esportivos por dois anos e o fechamento temporário do local onde ocorreu o crime.

Pessoas físicas – o acesso a qualquer recinto esportivo pode ser proibido por até cinco anos, inclusive em casos muito graves.

Casos de racismo com outros jogadores brasileiros:

Estamos contextualizando o caso do Vinícius Júnior, mas muitos outros casos de racismo já ocorreu no futebol brasileiro e mundial. Selecionamos alguns dos principais casos.

1.Tinga

Em jogo válido pela Libertadores 2014, o volante Tinga, ex-Cruzeiro foi vítima de racismo durante uma partida contra o Real Garcilaso-PER. A torcida peruana imitou sons de “macaco” toda vez que jogador brasileiro tocava na bola.

2.Daniel Alves

Ainda no mesmo ano, durante a partida entre Barcelona e Villareal, o lateral-direito Daniel Alves foi alvo de racismo. Um torcedor atirou uma banana no gramado no sentido de ofende-lo. O jogador brasileiro respondeu comendo a fruta e declarou: “Estou na Espanha há 11 anos e há 11 é dessa mesma maneira. Temos que rir dessa gente atrasada”.

3.Roberto Carlos

Assim como Daniel Alves, Roberto Carlos também foi alvo de insultos de torcedores e também envolvendo ataque de bananas jogadas das arquibancadas, o ex-lateral esquerdo reagiu de forma diferente abandonando a partida válida pelo Campeonato Russo.

4.Goleiro Aranha

Também no ano de 2014, durante a partida Grêmio 0x2 Santos, pela Copa do Brasil, o arqueiro que atuava à época pela equipe gaúcha, foi alvo de insulto racista na Arena do Grêmio, em Porto Alegre (RS), local em que a partida foi disputada. Câmeras do canal ESPN Brasil flagaram uma torcedora claramente chamando Aranha de macaco e o resto do grupo fazendo sons que lembravam o animal. O jogador optou por não prestar queixa à polícia após a partida.

5.Arouca

Em março de 2015, o volante Arouca, atuando pelo Palmeiras, foi ofendido por um torcedor do Santos depois de um clássico envolvendo as duas equipes. “Chupa preto safado, fica nesse time ai de segunda”, escreveu o rapaz. À época o jogador lamentou a atitude, alegando não ser a primeira vez.

6.Michel Bastos

Em 31 de outubro de 2015, Michel Bastos pediu “silêncio” à torcida que o vaiava no Morumbi. No dia seguinte, recebeu mensagens racistas nas redes sociais.

7.Grafite ofendido por Leandro Desábato

Em abril de 2005, durante a partida entre São Paulo e Quilmes, pela Libertadores, ocorreu um episódio de racismo partindo do zagueiro argentino Leandro Desábato para o atacante brasileiro Grafite.

Após uma dividida entre o atacante brasileiro e o zagueiro Arano. No lance, quando Grafite ainda estava no chão, Desábato se aproximou e falou em seu ouvido. O brasileiro levantou, o empurrou e foi expulso – junto de Arano por causa da dividida.

Desábato continuou em campo, mas recebeu voz de prisão ainda no gramado do Morumbi e foi encaminhado ao 34º DP de Sâo Paulo.

Grafite revelou que Desábato teria dito; “negro de m….”

8.Hulk

Em 2014, atuando como atacante do Zenit, da Rússia, Hulk foi alvo de cânticos racistas em partida contra o Spartak Moscow, no sábado, pelo Campeonato Russo. De acordo com o jogador brasileiro, pelo menos em duas ocasiões um grupo de torcedores imitou sons produzidos por macacos nas arquibancadas.

9.Andrade

Campeão brasileiro em 2009 pelo Flamengo, Andrade denunciou preconceito quando chegou ao clube em 2004 como auxiliar.

10.Obina

Quando defendia o Atlético Mineiro, em partida diante do Juventus do Acre, pela Copa do Brasil de 2010, o atacante Obina recebeu ofensas de cunho racistas durante a partida.

Legislação brasileira sobre o racismo

A Lei 7.716/89, conhecida com Lei do Racismo, pune todo tipo de discriminação ou preconceito, seja de origem, raça, sexo, cor, idade. Em seu artigo 3º, a lei prevê como conduta ilícita o ato de impedir ou dificultar que alguém tenha acesso a cargo público ou seja promovido, tendo como motivação o preconceito ou discriminação. Por exemplo, não deixar que uma pessoa assuma determinado cargo por conta de raça ou gênero. A pena prevista é de 2 a 5 anos de reclusão.

A lei também veda que empresas privadas neguem emprego por razão de preconceito. Esse crime esta previsto no artigo 4o. da mesma lei, com mesma previsão de pena.

Lei nº 7.716, DE 5 de janeiro de 1989.

Art. 3º Impedir ou obstar o acesso de alguém, devidamente habilitado, a qualquer cargo da Administração Direta ou Indireta, bem como das concessionárias de serviços públicos.

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

Parágrafo único. Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional, obstar a promoção funcional. (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

Art. 4º Negar ou obstar emprego em empresa privada.

Pena: reclusão de dois a cinco anos.

§ 1º Incorre na mesma pena quem, por motivo de discriminação de raça ou de cor ou práticas resultantes do preconceito de descendência ou origem nacional ou étnica: (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

I – deixar de conceder os equipamentos necessários ao empregado em igualdade de condições com os demais trabalhadores; (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

II – impedir a ascensão funcional do empregado ou obstar outra forma de benefício profissional; (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

III – proporcionar ao empregado tratamento diferenciado no ambiente de trabalho, especialmente quanto ao salário. (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

§ 2º Ficará sujeito às penas de multa e de prestação de serviços à comunidade, incluindo atividades de promoção da igualdade racial, quem, em anúncios ou qualquer outra forma de recrutamento de trabalhadores, exigir aspectos de aparência próprios de raça ou etnia para emprego cujas atividades não justifiquem essas exigências. (Incluído pela Lei nº 12.288, de 2010) (Vigência)

CBF instituiu no começo do ano regulamentação específica sobre racismo

Em fevereiro deste ano, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) instituiu punições por racismo em competições brasileiras. O texto foi publicado no Regulamento Geral de Competições (RGC) de 2023.

Multa de até R$ 500 mil, perda de mando de campo ou jogo com portões fechados são algumas das punições previstas. Veja o regulamento completo:

“Art. 134 – A inobservância ou descumprimento deste RGC, assim como dos RECs, sem prejuízo de outras penalidades estabelecidas no presente Regulamento, sujeitará o infrator às seguintes penalidades administrativas que poderão ser aplicadas pela CBF, de forma cumulativa ou não, não necessariamente nesta ordem:

I – advertência;

II – multa pecuniária administrativa, no valor de até R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais), a ser revertida em prol de causas sociais, inclusive através da dedução de cotas a receber;

III – vedação de registro ou de transferência de atletas; e.

IV – Perda de pontos, em relação a clubes por infração ao disposto no §1º e observado o §4º.

§ 1° – Considera-se de extrema gravidade a infração de cunho discriminatório praticada por dirigentes, representantes e profissionais dos Clubes, atletas, técnicos, membros de Comissão Técnica, torcedores e equipes de arbitragem em competições coordenadas pela CBF, especialmente injuriar alguém, ofendendo-lhe a dignidade ou o decoro, em razão de raça, cor, etnia, procedência nacional ou social, sexo, gênero, deficiência, orientação sexual, idioma, religião, opinião política, fortuna, nascimento ou qualquer outra forma de discriminação que afronte a dignidade humana.

§ 2º – Na hipótese de reincidência das infrações elencadas no parágrafo primeiro, independentemente das sanções que venham a ser aplicadas pela Justiça Desportiva e de eventual apuração e responsabilização por crime, a multa pecuniária administrativa máxima poderá ser aplicada em dobro, que será integralmente revertida para entidade representativa de proteção de direitos, conforme o caso.

§ 3º – Em conformidade com o sistema associativo do futebol e os termos do Estatuto da CBF, as penalidades previstas no caput têm natureza administrativa e serão aplicadas pela CBF independentemente das sanções de natureza disciplinar que venham a ser cominadas pela Justiça Desportiva com base no CBJD.

§ 4º – A penalidade disposta no art. 134, IV poderá ser imposta administrativamente pela CBF, encaminhado-se o caso ao STJD para apreciação, ficando sua cominação definitiva condicionada ao julgamento do STJD sobre a aplicação da perda de pontos ao clube infrator.

§ 5º – Para além das sanções administrativas e disciplinares impostas, a CBF, em linha com legislação vigente e, em especial, a Lei 14.532, de 11 de janeiro de 2023, encaminhará ofício às autoridades competentes (dentre as quais, o Ministério Público) para apuração e eventual responsabilização dos infratores, inclusive instauração de inquéritos, eventual tipificação de crime e responsabilização criminal, e poderá determinar aos infratores a promoção de campanhas, palestras e outras medidas de cunho educacional, bem como a apresentação de plano de prevenção e combate dessas infrações de extrema gravidade.”

Código disciplinar da FIFA contra o racismo

A partir de setembro de 2019, a Fifa apresentou um novo código de conduta disciplinar em casos de preconceito envolvendo racismo, homofobia, xenofobia, etc.

O documento anterior, de 2017, trazia (i) a suspensão de pelo menos 5 partidas (ii) multa de no mínimo 20 mil francos suíços e (iii) proibição de frequentar estádio para qualquer pessoa (mas lê-se, participante do jogo em si) envolvida em comportamento discriminatório. Já aos clubes e/ou federações-membros da FIFA, podiam ser punidos pelo comportamento das suas torcidas por meio de multas a partir de 30 mil francos suíços, além de perda de pontos, desqualificação das competições e jogos sem torcida.

Porém, o novo documento em seu artigo 13 prevê um aumento do número de partidas de suspensão para aqueles envolvidos em comportamento discriminatório, de 5 para 10. Aos clubes, em relação à conduta dos seus torcedores, a “mordida” financeira tem um potencial muito maior. Enquanto a multa caiu para 20 mil francos suíços (uma redução dos 30 mil francos suíços), ela agora vem concomitante com uma punição de uma partida com número limitado de torcedores. Assim, há um potencial imediato de que o valor que o clube deixará de arrecadar por ter menos torcedores no estádio excederá a diferença de 10 mil francos suíços previstos como punição mínima no documento anterior. Ademais, em caso de reincidência, a FIFA pode demandar que os clubes e/ou federações implementem um plano de prevenção. Ainda esperamos para ver como isso funcionará exatamente.

De qualquer forma, entendemos que os marcos mais importantes do novo documento são:

  1. Por meio do artigo 13.1 a FIFA “declara guerra” à homofobia! Apesar de já ter histórico de punições a federações for cânticos homofóbicos de torcedores, a FIFA em seu novo código disciplinar faz menção explicita a orientação sexual (vale a pena ouvir o podcast # 4 do Lei em Campo sobre homofobia);
  2. Pessoas diretamente ofendidas pelo comportamento discriminatório agora podem produzir uma declaração do impacto que o ato tenha causado em suas vidas. Com isso, as vítimas de tais atos terão voz direta com a FIFA. Ou seja, quando um jogador sofrer qualquer tipo de discriminação (de outros jogadores, comissões técnicas ou torcedores), ele (ela) poderá ter sua voz quanto à punição e/ou seu impacto. Imagine a contribuição que jogadores eloquentes (Raheem Sterling e cia.) terão no processo disciplinar; e
  3. Maio poder aos árbitros, que agora podem, por força do artigo 13.4, abandonar uma partida por causa de racismo e/ou discriminação. Caso ocorra, o resultado da partida será a perda por 3 a 0 da equipe culpada pelos atos. Imagine uma final de mundial sendo decidida dessa forma…
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