Nota pública da Associação Médica Brasileira

A Associação Médica Brasileira, através da sua Comissão de Combate ao Tabagismo vêm a público rejeitar a proposta do Deputado Federal Kim Kataguiri (SP), que em rede social, se posiciona favoravelmente à liberação do uso dos cigarros eletrônicos no Brasil e relata ter apresentado um Projeto de Lei neste sentido. A Resolução da Diretoria Colegiada […]

  • Data: 11/11/2021 13:11
  • Alterado: 11/11/2021 13:11
  • Autor: Redação
  • Fonte: Associação Médica Brasileira
Nota pública da Associação Médica Brasileira

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A Associação Médica Brasileira, através da sua Comissão de Combate ao Tabagismo vêm a público rejeitar a proposta do Deputado Federal Kim Kataguiri (SP), que em rede social, se posiciona favoravelmente à liberação do uso dos cigarros eletrônicos no Brasil e relata ter apresentado um Projeto de Lei neste sentido.

A Resolução da Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária  (RDC – ANVISA) Nº 46 de 28/08/2009 proíbe a comercialização, importação e propaganda de quaisquer Dispositivos Eletrônicos para Fumar (DEFs) no Brasil, como cigarros eletrônicos e outros, especialmente os que aleguem substituir os cigarros e demais produtos convencionais do tabaco ou objetivem alternativas ao tratamento do tabagismo.

Apesar da proibição, o percentual de experimentação e uso dos referidos dispositivos vem aumentando significativamente no país, como mostram os resultados de algumas pesquisas. A Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar de 2019 (PeNSE, 2019) mostrou que 16,8% dos escolares de 13 a 17 anos já haviam experimentado o cigarro eletrônico (sendo 13,6% nos de 13 a 15 anos de idade e 22,7% nos de 16 e 17 anos) e o consumo nos 30 dias anteriores à pesquisa foi de 2,8%. Na Pesquisa Nacional de Saúde de 2019 (PNS, 2019), a prevalência atual do uso dos Dispositivos Eletrônicos para Fumar entre indivíduos de 15 anos ou mais foi de 0,64% (cerca de 1 milhão de indivíduos), sendo aproximadamente 70% na faixa etária entre 15 e 24 anos de idade.

A maioria absoluta dos DEFs contém nicotina – a droga psicoativa responsável pela dependência química. Nos cigarros eletrônicos, ela se apresenta sob a forma líquida, com forte poder adictivo, ao lado de solventes (propilenoglicol ou glicerol), água, flavorizantes (cerca de 16 mil tipos), aromatizantes e substâncias destinadas a produzir um vapor mais suave para facilitar a tragada e a absorção pelo trato respiratório. Foram identificadas, até o momento, cerca de 80 substâncias nos aerossóis, sendo muitas delas tóxicas e cancerígenas.

O cigarro eletrônico em forma de pendrive e com USB entrega nicotina na forma de “sal de nicotina”, algo que se assemelha à estrutura natural da nicotina encontrada nas folhas de tabaco, facilitando sua inalação por períodos maiores, sem ocasionar desconforto ao usuário.

Em 2018, os fabricantes do cigarro eletrônico no formato de pendrive lançaram no mercado dispositivos para recarga dos cartuchos – os “pods” com concentrações entre 3% a 5% de nicotina. Cada pod do cigarro eletrônico no formato de pendrive contêm 0,7 ml de e-líquido com nicotina, possibilitando 200 tragadas, similar portanto, ao número de tragadas de um fumante de 20 cigarros convencionais. Ou seja, podemos afirmar que vaporizar um pendrive equivale a fumar 20 cigarros (1 maço).

Além da nicotina, os pods também contêm uma mistura de glicerol, propilenoglicol, ácido benzoico e flavorizantes. Eles podem ser manipulados e preenchidos com outras substâncias como o tetrahidrocanabinol (THC) – principal substância psicoativa da maconha.

Uma metanálise e revisão sistemática, publicada em 2020, demonstrou que o uso de cigarros eletrônicos aumentou em quase três vezes e meia o risco de experimentação do cigarro convencional e em mais de quatro vezes o risco de tabagismo9. Estudos epidemiológicos em vários países mostram que o uso concomitante dos DEFs com os cigarros convencionais é muito comum (uso dual).

Entre agosto de 2019 e fevereiro de 2020, ocorreu um surto de doença pulmonar aguda ou subaguda grave denominada EVALI (E-cigarette or Vaping product use-Associated Lung Injury), em usuários de cigarros eletrônicos (jovens em sua maioria), tendo sido notificados 2.807 casos nos EUA, com 68 mortes confirmadas.

O Deputado Kim Kataguiri não considera justificativa para a proibição o fato desses dispositivos fazerem mal à saúde pois, segundo suas palavras, “os indivíduos devem ter liberdade para determinar a sua vida e a sua própria saúde”. Além disso, alega que estudos científicos, especialmente os do sistema de saúde inglês, demonstram que os cigarros eletrônicos são mais saudáveis do que os cigarros convencionais.

Como falar em liberdade com o uso de uma droga psicoativa pesada como a nicotina, que torna a maioria de seus dependentes cativos da indústria do tabaco pelo resto de suas vidas e os levará ao adoecimento e morte prematura? Esta indústria perversa agora demoniza o outrora glamourizado cigarro convencional e vem afirmando que os DEFs são úteis na tentativa de cessação do tabagismo ou na redução do consumo de cigarros – a chamada Redução de Danos.

Em seu informe de 2019, a Organização Mundial de Saúde (OMS) declarou não haver suficientes evidências científicas independentes para respaldar o uso dos cigarros eletrônicos como uma intervenção para a cessação do tabagismo em nível populacional ou para ajudar as pessoas a deixarem o consumo convencional do tabaco e assinalou que estes produtos são indubitavelmente maléficos. O mesmo informe concluiu também que as evidências não mostram que os produtos do tabaco aquecido reduzirão as doenças relacionadas ao tabaco.

A União Internacional contra a Tuberculose e Enfermidades Respiratórias (The UNION),em sua 4ª declaração sobre os cigarros eletrônicos, publicada em 2020, coloca-se de acordo com a posição da OMS e ressalta a importância da divulgação do impacto dos DEFs na saúde pública, não só nos países de alta renda mas também naqueles de média e baixa renda, onde estão sendo introduzidos e comercializados de forma agressiva, geralmente com pouco ou nenhum marco regulatório e onde os jovens são particularmente vulneráveis. Por estas razões, a entidade recomenda que sejam adotadas políticas de  proibição de vendas, que são protetoras e preventivas.              

Os interesses da saúde pública e os interesses da indústria são irreconciliáveis e a relação deve ser pautada pelos ditames da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, o 1º Tratado Internacional de Saúde Pública da História da Humanidade, cujo objetivo principal é preservar as gerações, presentes e futuras, das devastadoras consequências sanitárias, sociais, ambientais e econômicas do consumo e da exposição à fumaça do tabaco14. Este tratado foi elaborado sob os auspícios da OMS, assinado pelo Brasil em 16/06/2003, ratificado pelo Congresso Nacional em 27/10/2005 e pelo Presidente da República em 03/11/2005 em vigor no Brasil desde 01/02/2006 como política pública de Estado.

A AMB e suas sociedades afiliadas apoiam a manutenção da RDC ANVISA n.46/2009 da ANVISA, que sabiamente contempla todos os dispositivos eletrônicos para fumar com o objetivo de impedir a propagação do uso desses produtos, especialmente para a juventude, como forma de mudar este cenário cruel e inexorável de adoecimento, sequelas e mortes causado pelo tabaco, nas suas mais diversas formas e disfarces para consumo.

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  • Data: 11/11/2021 01:11
  • Alterado:11/11/2021 13:11
  • Autor: Redação
  • Fonte: Associação Médica Brasileira









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