Marinho ignora pedido para abrir orçamento secreto

O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, ignorou ontem um pedido de abertura do orçamento secreto, criado no Palácio do Planalto para garantir apoio político no Congresso

  • Data: 09/06/2021 09:06
  • Alterado: 09/06/2021 09:06
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Estadão Conteúdo
Marinho ignora pedido para abrir orçamento secreto

O ministro do Desenvolvimento Regional

Crédito:Marcos Corrêa/PR

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Durante audiência na Câmara dos Deputados, Marinho caiu em contradição ao explicar a origem da emenda de relator-geral do Orçamento, que permitiu repasses milionários para compras e obras direcionadas por parlamentares. Ele disse que é “normal” que a aquisição de máquinas pesadas ocorra até “60%” acima do preço cobrado no ano passado.

Na sessão de três horas e meia, marcada pelo constrangimento, Marinho tentou minimizar as indicações de políticos no ministério. Ele negou falta transparência do governo na execução dos recursos extras, mas deixou sem resposta um pedido feito pelo deputado Rogério Correia (PT-MG) para que o ministério publique os ofícios que trataram da distribuição do dinheiro e divulgue os autores das indicações de cada um dos contratos firmados com emendas de relator-geral do Orçamento – a chamada “RP 9”.

‘Monstrengo’

O Estadão revelou que mais de cem ofícios carimbaram o destino de milhões de reais do governo, com as verbas orçamentárias classificadas com essa sigla. “Vossa Excelência envia para nós e torna públicos cada emenda e cada ofício para que a gente saiba para onde que foi e quem pediu esse recurso?”, indagou Correia, que chamou a emenda de relator-geral de “monstrengo completamente desigual”.

Ao responder, Marinho não fez menção ao pedido. Após a sessão, a reportagem questionou a pasta se o ministro atenderá à demanda do deputado, mas não houve resposta até a conclusão desta edição. Por diversas vezes, Marinho afirmou que o Congresso tem a prerrogativa de escolher onde serão investidos os valores da emenda de relator-geral do orçamento. Também insistiu que não há envolvimento do governo na criação do artifício. Ele disse que, se alguém criou o “monstrengo”, foi o Congresso. “Vocês, Parlamento. Quem pode eventualmente corrigir é o Parlamento”, disse ele ao deputado petista.

No entanto, o ministro mesmo disse, na sessão da Câmara, que o governo vetou a criação do chamado RP 9 e, “em seguida, em um processo de negociação, reapresentou“.

O Estadão já havia noticiado que partiu do Executivo, mais especificamente da Secretaria de Governo da Presidência da República, a iniciativa que deixou em patamares elevados os valores que parlamentares podem direcionar a seus redutos eleitorais e, assim, promover campanhas de reeleição.

O próprio Marinho pôde fazer indicações com as verbas oriundas de emendas de relator-geral, o que contraria, na prática, o discurso do ministro de que os recursos são definidos pelo Congresso.

R$ 130 mi para Estado natal

Marinho empenhou recursos do orçamento secreto para a compra de 90 tratores, 9 motoniveladoras e 12 pás carregadeiras para o Rio Grande do Norte, seu Estado de origem. As verbas foram direcionadas à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf).

As indicações aparecem com a sigla “GM” (“gabinete do ministro”) na planilha elaborada pelo ministério, em que se pode ler os nomes de mais de 285 parlamentares contemplados com cotas dentro dos R$ 3,3 bilhões que o Desenvolvimento Regional empenhou em dezembro.

Revelado pelo Estadão, o orçamento secreto foi criado pelo governo do presidente Jair Bolsonaro para beneficiar aliados políticos com a indicação de destinação de recursos das emendas de relator-geral (RP9) e garantir apoio no Congresso.

Apesar de declarar que o Legislativo tem o domínio do orçamento secreto, Marinho teve sua cota de indicações dentro do total dos R$ 3,3 bilhões. Dos R$ 130 milhões que o gabinete do ministro direcionou – sem ser a pedido de parlamentares -, dois terços (R$ 88 milhões) têm como destino o Rio Grande do Norte.

Os preços previstos para essas aquisições superam os valores que a Codevasf vai pagar na compra de máquinas dos mesmos tipos também com recursos originários das emendas de relator-geral do Orçamento. Além disso, estão acima da tabela de referência de preços da própria pasta.

Do montante definido pelo gabinete do ministro, R$ 76,4 milhões serão executados pela Codevasf. Além disso, a pasta firmou convênios com municípios do Rio Grande do Norte com valores que, ao todo, chegam a R$ 11,5 milhões. Os investimentos vão para pavimentação, compra de máquinas, perfuração de poços artesianos e implantação de sistema de abastecimento de água em vilas.

O valor total para a aquisição dessas máquinas pesadas para o Rio Grande do Norte soma R$ 20,4 milhões. Se fossem praticados os preços que a Codevasf pagará em outros Estados, por itens do mesmo tipo, a economia seria de R$ 5 milhões.

O uso das verbas por indicação do gabinete do ministro contradiz a versão apresentada por Marinho sobre quem controla o destino dos recursos da emenda de relator-geral do orçamento, chamada de RP9.

O ministro afirma que é “prerrogativa” do Congresso o direcionamento dos valores. O Estadão tem mostrado que a definição cabe ao governo, mas o Executivo resolveu entregar a aliados o controle do orçamento em dezembro de 2020. A destinação, como foi feita, descumpriu regras orçamentárias e vetos do presidente Jair Bolsonaro, e foi feita de maneira desigual, priorizando apoiadores do governo.

Bancada

Questionado sobre as indicações feitas diretamente por Marinho, o Ministério do Desenvolvimento Regional disse que “se trata de recursos alocados pelo relator-geral do Orçamento, fruto da solicitação encaminhada por parlamentares da bancada potiguar e pelo próprio ministério”.

A pasta atribuiu a fatores logísticos e geográficos o custo maior das máquinas que serão compradas pela Codevasf para o Rio Grande do Norte. A estatal afirmou que “fretes, impostos, quantidades e preços de insumos” podem influenciar os valores. “As licitações da Codevasf são regionalizadas, uma prática consolidada que está de acordo com recomendações de órgãos de fiscalização.”

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