Politização e desacordo com sindicatos paralisa PL dos motoristas de aplicativos na Câmara
Ataque ao projeto vira plataforma de campanha para motoristas candidatos nas eleições deste ano
- Data: 21/05/2024 13:05
- Alterado: 21/05/2024 13:05
- Autor: Redação
- Fonte: Lucas Marchesini e Victoria Azevedo/Folhapress
Câmara dos Deputados
Crédito:Marcelo Camargo/Agência Brasil
A politização em torno do projeto de lei que regulamenta o trabalho de motoristas de aplicativos e a briga entre sindicatos foram os principais motivos que paralisaram a tramitação do projeto na Câmara dos Deputados, em um revés para o governo Lula (PT).
O Executivo enviou a proposta ao Congresso sob regime de urgência – que exige a deliberação do texto em até 45 dias -, mas teve de recuar diante das críticas feitas por trabalhadores e congressistas. Além disso, se o texto fosse à votação, o governo provavelmente seria derrotado.
A regulamentação desses trabalhadores é uma promessa de campanha de Lula e representa um gesto do petista ao segmento, que é mais alinhado ao ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
O assunto ficou ainda mais sensível por ser ano de eleições municipais. Diversos motoristas de aplicativos serão candidatos a vereador e o tema do projeto apresentado pelo governo se tornou a plataforma de campanha de muitos deles.
Os ataques ao projeto focam três pontos: a limitação de 12 horas para a jornada de trabalho, o piso de R$ 32,10 para a hora rodada e a contribuição previdenciária de 7,5% a ser paga pelos motoristas.
Desses pontos, a limitação de horas é o que une as diversas correntes de representação dos motoristas, o que facilita a sua retirada do projeto.
“Os trabalhadores de plataforma são considerados autônomos e devem ter assegurada a plena autonomia na fixação de sua jornada de trabalho”, defende a Fenasmapp (Federação Nacional dos Sindicatos dos Motoristas de Aplicativos), entidade que representou a categoria nas negociações com governo e empresas.
O consenso na categoria não existe nos dois outros pontos. Em comissão geral realizada no plenário da Câmara em abril, o vereador de São Paulo Marlon Luz (MDB-SP), que se elegeu como Marlon do Uber, defendeu que o motorista seja remunerado com base na quilometragem, não por hora rodada.
“O motorista quer ganhar por quilômetro rodado. O carro roda por quilômetro. A gasolina é por quilômetro. O pneu é trocado por quilômetro. O óleo é trocado por quilômetro. Não faz sentido colocarmos um valor por hora”, disse.
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho (PT), rebate e estima que essa forma prejudicaria o motorista. “As cidades brasileiras têm muitos engarrafamentos. Neles, o relógio continua girando, mas a quilometragem não”, afirmou em participação na sessão da Comissão do Trabalho da Câmara no mês passado.
A contribuição previdenciária é prejudicial na visão dos críticos da proposta por diminuir a renda líquida dos motoristas. O projeto prevê que, além dos 7,5% pagos pelos trabalhadores, outros 20% sejam de responsabilidade das empresas.
A proposta foi elaborada após dez meses de debate entre representantes das plataformas, de sindicatos e do governo. Quem ficou de fora aproveita a discussão no Congresso para atacar o texto.
“Nós motoristas de verdade representamos, sim, a vontade do povo, a vontade que foi expressa nas ruas, a vontade dos motoristas. O PLP é danoso para o motorista e os sindicatos não nos representam”, afirmou Evandro Pereira, vice-presidente da Fembrapp (Federação dos Motoristas por Aplicativos do Brasil), em sua fala na comissão geral da Câmara.
A avaliação de membros do Palácio do Planalto é que o Ministério do Trabalho errou na maneira de comunicar o conteúdo do texto, gerando críticas e desgastes à imagem do presidente – foram registradas manifestações de motoristas contrários à proposta em algumas cidades do país.
Na mesma sessão da comissão na Câmara, Marinho fez mea culpa sobre essas críticas e disse que o governo foi “incapaz” de explicar o teor do projeto.
“O que está levando os trabalhadores a se colocar contra é a versão do que está escrito, então nós temos que debater conteúdo. Tem que falar para eles o que é verdade, se não ele vai continuar reproduzindo as mentiras que ouviu”, disse Marinho.
Já a Fenamaspp, que representou os motoristas nas negociações tripartites, defende os termos do projeto e tem 12 sugestões de melhorias. Entre elas estão a inclusão da categoria no auxílio acidente, a previsão de adicional noturno e a criação de um benefício para aquisição de veículos.
Marinho afirmou na quarta que a proposta poderá sofrer alterações nas mãos dos parlamentares. “O Congresso tem a tarefa de aperfeiçoar o texto, se acha que for necessário. O governo nunca teve a pretensão de que o projeto tem que sair do mesmo jeito que entrou.”
O movimento de retirar a urgência do projeto, acordado com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), representou uma derrota do governo, e especialmente do ministro do Trabalho. Marinho defendia a manutenção da urgência e a celeridade da tramitação do texto na Casa.
Agora, ela deverá ser analisada em três comissões temáticas da Casa (durante 20 dias em cada uma) antes de seguir para a votação em plenário, o que está previsto para ocorrer até a primeira quinzena de junho.
Na avaliação de líderes ouvidos pela reportagem, com a discussão nas comissões e posteriormente em plenário será possível fazer ajustes no texto para que ele seja aprovado.
A Amobitec (Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia) representou as plataformas nas discussões que resultaram no projeto de lei. A entidade considera o texto equilibrado. “Ele contempla algumas das demandas apresentadas por todos os participantes”, avalia.
“Defendemos que sejam preservadas a flexibilidade e a autonomia de motoristas e entregadores, a efetiva inclusão previdenciária e mecanismos para trazer mais transparência na relação com os aplicativos”, acrescentou.
Para a entidade, também é importante “a construção de um modelo que traga segurança jurídica para a atividade, com o reconhecimento do papel das plataformas tecnológicas como intermediadoras”.