O Semeador e o Ladrilhador, dois modelos de colonização distintos

Pudemos observar em nosso último artigo que, segundo Edmundo O’gorman, a América não foi descoberta, mas sim inventada. Contudo, quem a teria inventado? E como?

  • Data: 05/09/2018 10:09
  • Alterado: 05/09/2018 10:09
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Jorge Andrade
O Semeador e o Ladrilhador, dois modelos de colonização distintos

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Quando Pedro Álvares Cabral chega ao Brasil, no dia 22 de Abril de 1500, algo de novo acontece, a partir de agora os portugueses estão de frente com um povo completamente diferente de si, com costumes, crenças e língua totalmente desconhecidas ao olhar europeu. Desta forma, tanto os espanhóis que haviam chegado alguns anos antes (1492), quanto os portugueses, se veem diante de um desafio: O que fazer com esses povos e como produzir novas riquezas nessas terras?

Bem, acontece que Portugal, diferente da Espanha, não continha um poderio bélico tão poderoso, tão pouco havia contingente suficiente no país capaz de dominar um outro povo, sem que este desarmasse suas fronteiras na Europa. Desta forma, a primeira abordagem e mais coerente a ser tomada, acredite se quiser, não foi sair dizimando todos os indígenas que aqui viviam, como nós pensamos. Muito pelo contrário, a primeira abordagem dos portugueses, através dos padres da Companhia de Jesus, dentre eles, Pe. José de Anchieta, foi se aproximar dos nativos, conhecer a sua cultura, dominar a sua língua e assim criar laços de confiança, pois desta forma tanto a dominação do território seria mais tranquila, quanto a catequização destas tribos.

Sendo assim, não é difícil de entender o motivo pelo qual, entre os dois primeiros séculos de colonização portuguesa no Brasil, estes só se mantiveram no litoral, não aprofundando para o interior do território. Portanto, estabeleceram com a Colônia, não uma relação de “Colonizador e Colonizados”, no sentido violento e impositivo da palavra, mas sim uma colonização no sentido comercial, posto que ao povoar apenas o litoral brasileiro, os portugueses tinham acesso aos portos e poderiam comerciar mais facilmente. É neste sentido que Sérgio Buarque de Holanda, em sua obra “Raízes do Brasil”, nos demonstra a característica semeadora de Portugal, uma vez que os portugueses não trabalhavam a ideia de Colônia a partir do esforço de colonizar e submeter o outro povo ao seu poder, pois assim não precisariam botar em risco suas feitorias, dado que tinham pouco contingente em seu reinado. Além disso, a filosofia do colonizador português era basicamente utilitarista, ou seja: “ Posso fazer uma casa aqui, mas como tenho que nivelar esse barranco e desmatar essas árvores, vou deixar quieto e fazer ali mesmo, onde está mais fácil”.

Percebe? A nossa colonização se deu de maneira totalmente experimental. E diferentemente da espanhola, onde os colonizadores impunham o poder do homem sobre a natureza, fazendo o que era estabelecido em seus planos a longo prazo, os portugueses buscavam realizar suas obras e ações de acordo com o que fosse mais interessante perante o seu desejo pessoal.

Bom, mas aí você me pergunta: Ok, entendi o estilo português de colonização, mas como foram os espanhóis?

E eu lhe respondo:

Bem aqui do nosso lado, na América Espanhola, os espanhóis detinham um estilo completamente diferente de lidar com os povos que haviam encontrado e, a terra que pretendiam dominar. Veja bem, ao passo que os portugueses encaravam as terras por eles conquistadas, apenas como um lugar para retirar riquezas, os espanhóis enxergavam nessas terras uma possibilidade de estender o seu território. Por exemplo, um dos Vice-Reinos era o de Nova Granada, nome de uma província espanhola na época e de um município nos dias atuais, ou seja, até mesmo os nomes da terra colonizada, deveria remeter à Espanha.

Por esse motivo, já podemos perceber o quão diferente foi a postura espanhola acerca de sua colonização, em relação com a postura portuguesa. Contudo, dentre os vários aspectos que iremos abordar, cabe um em especial, que é o fato de que a Espanha, desde aquele tempo tinha constantes guerras internas em seu território. Você já deve ter visto por aí, alguma daquelas notícias da Catalunha onde eles estão protestando e tentando constantemente ser independentes da Espanha, bem como, também já deve ter visto algo a respeito envolvendo o país Basco. São exemplos de territórios espanhóis que desde aqueles tempos, estão em confronto com o governo para conseguir a sua autonomia. Posto isto, podemos entender o motivo pelo qual a Espanha em sua colonização foi muito mais impositiva do que os portugueses, pois em sua História foi comum os confrontos em seus domínios e, a fim de se manterem no poder, era necessário a implementação da força.

Neste sentido, Sérgio Buarque de Holanda denomina os espanhóis como ladrilhadores, posto que estes tinham manuais de como o colonizador deveria agir perante os colonizados, davam instruções de adentrar o interior do país, diferentemente dos portugueses, que como mencionamos acima, povoavam apenas os litorais. Além disso, visavam interpretar aquela nova parcela de terra como uma extensão da Metrópole, sendo assim, desde o século XVI já existia no México a tecnologia de impressão de livros, coisa que só irá acontecer no Brasil muito posteriormente. Isso para não mencionar Universidades, que aqui também foram proibidas pela Coroa por muito tempo, pois Portugal entendia que isso geraria uma camada de pessoas com pensamentos autônomos e fomentaria, portanto, ideais de rebeldia contra a Metrópole.  

Inclusive, em uma interpretação mais intensa desta obra, podemos refletir acerca da leitura no Brasil e, como aqui nós valorizamos ou pelo menos enxergamos de maneira diferente as pessoas que tem o hábito da leitura. Já parou para pensar o significado disso e quando isso pode ter surgido?

Pois é, esses ainda são reflexos da nossa colonização, pois ao passo que na América Espanhola se fomentava essa cultura de cursar Universidades, ser letrado, etc… Aqui no Brasil, por intervenção da Metrópole portuguesa, tal privilégio era restrito a pouquíssimas pessoas e, não que na América Espanhola também não seja, pois só a elite tinha direito a estes cursos. Contudo, a nossa elite, diferentemente dos nossos vizinhos, tornou-se uma elite voltada para costumes efêmeros, onde vestir roupas caras, utilizar joias e ter um alto número de escravos, bem como de terras, denotaria um status social mais elevado. Conjuntamente com isto, a ideia de cursar a Universidade de Coimbra (opção dos brasileiros na época), fazia com que a cultura letrada fosse vista de maneira diferente, pois com poucas escolas técnicas e sem cursos superiores, a leitura passou a ser, para a nossa infelicidade, um fator de status social, onde quem consome livros é considerado superior a quem não tem este acesso.

Não atoa os livros são peças tão caras aqui no Brasil, na verdade trata-se de uma cultura excludente, onde os mais privilegiados, desde a época da colônia, veem-se em condições de se sobressaírem socialmente através das letras. Claro que também não poderia deixar de mencionar as “brincadeiras” infantis praticadas em sala de aula, onde os alunos mais esforçados, são constantemente desprezados e atacados pelos outros, como se estudar fosse algum tipo de demérito, pois na verdade ostentar um tênis, camisa ou boné de marca, é o que caracteriza a imagem do descolado da turma. Afinal, em uma sociedade que valoriza a ignorância e o letrado, contanto que seja abastado, desde a época da colônia, não é de se espantar tais comportamentos.

Espero ter suscitado minimamente algumas reflexões, pois daqui para frente, através das várias Histórias que contaremos neste caderno, os mistérios que muitas vezes julgamos sem razão, serão desvendados.

Grande abraço,

Jorge Andrade.

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  • Data: 05/09/2018 10:09
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