O embate entre Trump e o Tribunal Penal Internacional e os riscos para a justiça global
As sanções dos EUA ao TPI geram tensões e alertam para a ameaça de impunidade e enfraquecimento do Direito Internacional
- Data: 20/02/2025 18:02
- Alterado: 20/02/2025 18:02
- Autor: Celeste Leite dos Santos e Luciana Sabbatine Neves
- Fonte: Assessoria
As recentes sanções impostas pelos Estados Unidos da América (EUA) ao Tribunal Penal Internacional (TPI), que tem a prerrogativa de processar acusados de crimes contra a humanidade, ampliaram as tensões entre a potência mundial e a Corte criminal.
Importante voltar ao tempo e lembrar que os Estados Unidos se retiraram do TPI na gestão do então presidente George W. Bush (2001/2009). Na época, o republicano promulgou uma lei que proíbe a cooperação daquele país com o Tribunal Penal e concede poder ao chefe do Executivo Nacional – inclusive, para utilizar todos os meios necessários que impeçam que seus cidadãos sejam julgados pela Corte criminal.
Desde então, a relação com o Tribunal em tela oscila. A gestão do democrata Barack Obama (2009/2017) retomou a cooperação. Porém, a hostilidade retornou no primeiro mandato de Donald Trump (2017/2021), do Partido Republicano, que, de volta ao poder, em 2025, para uma nova gestão, mira suas baterias e a bandeira dos Estados Unidos contra a Corte mundial.
Estabelecido em 1998, na Conferência de Roma, e em vigor desde 2002, o TPI é o primeiro Tribunal permanente com jurisdição para processar pessoas por crimes contra a humanidade, delitos de guerra, e genocídios – só para citar algumas possibilidades. Trata-se de uma instituição independente, de substancial importância na luta contra a impunidade e na busca por Justiça por parte de vítimas que tiveram de forma grave violados os seus direitos.
Desde sua criação, o órgão se vê diante de desafios, como a falta de cooperação de algumas nações, a dificuldade em garantir a execução de suas decisões e a necessidade de ampliar sua representatividade. Enfrenta, ainda, a resistência de algumas nações, como é o caso dos Estados Unidos, que, agora, adotam medidas coercitivas contra a instituição.
A comunidade internacional expressou sua inquietação diante da escalada de Trump contra a Corte. Uma declaração conjunta, chancelada por 79 países, incluindo Alemanha, Canadá, Reino Unido e França, alertou que “as sanções aumentam o risco de impunidade para os crimes mais graves e ameaçam minar o Estado de Direito internacional”. Líderes da União Europeia (UE) também criticaram as ações dos Estados Unidos e defenderam o TPI.
As sanções à esta Corte são um alerta sobre os riscos do abandono do multilateralismo e as limitações do campo de ação e da influência do Direito Internacional num momento em que a cooperação global é essencial. E, mais: ameaçam a independência e a eficácia das ações do Tribunal e podem desencorajar futuras investigações, criar um ambiente de impunidade para perpetradores de crimes, além de comprometer a segurança de vítimas e de testemunhas.
A solução para este cenário complexo – de um lado, o Tribunal Penal e seus desafios, e, de outro, as investidas contrárias e extremistas por parte do governo Trump — não passa por sanções e intimidação, mas, sim, por diálogo e por reformas institucionais, mas, sobretudo, por entendimento entre as nações. A luta por Justiça, afinal, não pode ser travada de forma isolada – ela exige solidariedade, engajamento e um compromisso inabalável e genuíno com os princípios do Direito Internacional e da dignidade humana.
Dra. Celeste Leite dos Santos e Dra. Luciana Sabbatine Neves
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Dra. Celeste Leite dos Santos é presidente do Instituto Brasileiro de Atenção Integral à Vítima (Pró-Vítima); promotora de Justiça em Último Grau do Colégio Recursal do Ministério Público (MP) de São Paulo; doutora em Direito Civil; mestre em Direito Penal; e idealizadora do Estatuto da Vítima.
Dra. Luciana Sabbatine Neves é advogada; doutoranda em Direito Público; mestre em Direitos Humanos; coordenadora-geral do Projeto Humanitas – Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Guarulhos-SP; e embaixadora e conselheira do Instituto Pró-Vítima.