Haitiano que sobreviveu a terremoto se torna defensor dos direitos de refugiados no Brasil
Robert Montinard: da tragédia do terremoto no Haiti à luta por direitos de refugiados e uma nova esperança no Mural do Clima no Brasil.
- Data: 01/02/2025 09:02
- Alterado: 01/02/2025 09:02
- Autor: redação
- Fonte: Folhapress
Crédito:Reprodução/ X
Robert Montinard, um haitiano que deixou seu país em decorrência de um terremoto devastador, transformou sua dor em uma missão. “Eu saí do Haiti em um terremoto. Esse terremoto me tornou uma vítima. Agora o trabalho me dá a oportunidade de, como vítima, ser protagonista”, declarou Montinard, que se estabeleceu no Brasil em 2010 e, recentemente, se juntou ao Mural do Clima, um projeto voltado para a educação sobre as mudanças climáticas.
O terremoto que alterou sua vida ocorreu há 15 anos, quando Robert estava em sua residência. Em poucos segundos, ele foi surpreendido por um estrondo ensurdecedor e viu sua casa desabar. Após o colapso, conseguiu escapar dos escombros com 60% dos ossos do pé fraturados, acompanhado por sua esposa Melanie e seu filho mais novo, que na época tinha apenas dois anos. Tragicamente, seu filho mais velho, de três anos, e seu melhor amigo ficaram presos entre os destroços.
Com o Haiti em ruínas, Robert recebeu atendimento médico somente três dias depois do desastre e foi transferido para Guadalupe para tratamento adequado. Durante este período, aguardava notícias de seu filho desaparecido e começou a se ver como uma vítima das circunstâncias.
Felizmente, seu filho foi encontrado com vida e hoje tem 17 anos; porém, seu melhor amigo não sobreviveu ao desastre. Após meses de recuperação e cirurgias, Robert retornou ao Haiti. Ele continuou seu trabalho na mediação de conflitos no país devastado, mas a limitação física decorrente do ferimento no pé dificultou sua atuação.
Com o desejo de recomeçar a vida em outro lugar, Robert considerou países como Estados Unidos, França e Canadá antes de decidir solicitar asilo no Brasil. Desde então, ele tem trabalhado arduamente para promover os direitos dos refugiados e migrantes. Em 2012, fundou a Mawon, uma associação dedicada à integração socioeconômica da comunidade haitiana.
Um ano atrás, Robert decidiu diversificar suas atividades e encontrou uma nova paixão no Mural do Clima. Este projeto consiste em um jogo educativo com 42 cartas que aborda as causas e consequências da crise climática e é baseado em relatórios científicos do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU). O jogo é utilizado em workshops voltados para escolas e empresas e proporciona uma fonte de renda para Robert e outros refugiados.
“Esse jogo mostra para a gente de onde saiu o problema e o que cada um precisa fazer no sentido individual e coletivo”, afirmou Montinard. Ele acredita que a iniciativa oferece uma plataforma valiosa para discutir soluções e mobilizar engajamentos sociais.
Embora o terremoto não tenha sido causado por mudanças climáticas, Robert reconhece que desastres subsequentes como furacões e surtos de doenças foram exacerbados por alterações climáticas que impactaram ainda mais a já fragilizada infraestrutura do Haiti.
No Brasil, as tragédias naturais também têm afetado comunidades vulneráveis; as chuvas intensas no Rio Grande do Sul no ano passado atingiram cerca de 43 mil refugiados, incluindo haitianos.
Montinard observa que as vítimas mais afetadas pelas catástrofes climáticas frequentemente pertencem a grupos marginalizados: “Pobres, mulheres, pessoas negras, imigrantes, indígenas e membros da comunidade LGBTQIA+ são sempre os mais vulneráveis. Não são apenas eles que sofrerão com as catástrofes; eles ficarão ainda mais fragilizados”.
Apesar de ter tentado se distanciar do tema da migração nos últimos tempos, Robert se viu compelido a lutar por uma causa que ressoa profundamente com sua própria história: as pessoas deslocadas pelas mudanças climáticas. Ele está empenhado em conquistar um reconhecimento legal para esses indivíduos independentemente de sua nacionalidade. “Eles precisam de um nome e proteção legal que defina seus direitos”, argumenta Montinard. Para ele, não é suficiente fornecer abrigo temporário ou colchões; é necessária uma abordagem mais robusta para garantir dignidade aos deslocados.
“Eu sei o que é ser uma vítima”, conclui Robert Montinard.