Governo Lula Libera R$ 51,2 Bi em Empréstimos; Economistas Alertam para Crise Financeira
Entenda os riscos e impactos para estados e municípios.
- Data: 09/01/2025 00:01
- Alterado: 09/01/2025 00:01
- Autor: redação
- Fonte: Folhapress
Crédito:Reprodução
O governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) anunciou a liberação de R$ 51,2 bilhões em novos empréstimos para estados e municípios no ano de 2024, conforme dados levantados pela Folha com informações do Banco Central.
Esse montante representa um crescimento nominal de 18,1% em relação aos R$ 43,3 bilhões contratados no ano anterior. A mudança na política de financiamento para os governos regionais reflete uma estratégia de maior acesso ao crédito, com destaque para a atuação dos bancos públicos federais.
Nos primeiros dois anos do atual mandato, foram injetados R$ 94,5 bilhões, embora esse número não inclua operações realizadas com organismos multilaterais. De acordo com dados do Tesouro Nacional, em 2023 foram autorizadas transações que podem chegar a US$ 3,29 bilhões (aproximadamente R$ 20 bilhões na cotação atual).
Porém, essa expansão de empréstimos levanta preocupações entre economistas e técnicos da área. Existe o temor de que essa situação se assemelhe ao que ocorreu entre 2012 e 2014, durante o governo de Dilma Rousseff (PT), quando uma flexibilização similar contribuiu para uma grave crise financeira que culminou em parcelamento de salários e calotes nas dívidas com a União.
Até o momento, o Ministério da Fazenda não se manifestou sobre os dados apresentados.
O BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) foi responsável pelo maior aumento na concessão de créditos entre 2023 e 2024. A instituição afirmou que essa ampliação no financiamento ao setor público representa um retorno à sua atuação tradicional. Por outro lado, o Banco do Brasil, que se destaca em termos absolutos de contratações, atribui seu desempenho a uma “decisão estratégica”.
Com a facilitação do acesso a créditos e impulsionados por transferências adicionais, governadores e prefeitos têm acelerado seus gastos. Essa situação é mais crítica nos municípios: após registrar um superávit primário de R$ 25,9 bilhões em 2022, as contas municipais apresentaram um déficit de R$ 9,8 bilhões em 2023, piorando ainda mais com um rombo de R$ 18,1 bilhões entre janeiro e novembro do ano passado.
Os governos estaduais também apresentam um superávit considerável em 2024 (R$ 36 bilhões), mas suas finanças estão pressionadas pelo elevado custo das dívidas. Ao considerar os pagamentos dessas obrigações, o resultado se transforma em um déficit nominal de R$ 38,9 bilhões.
Vale destacar que uma parte significativa dos empréstimos aos estados foi aprovada no último trimestre do ano anterior e as despesas correspondentes deverão ser contabilizadas somente a partir de 2025. Isso cria um cenário de risco para a saúde fiscal futura das contas públicas.
A ampliação dos empréstimos é uma diretriz clara do governo Lula, que já havia se comprometido durante a campanha eleitoral a facilitar o acesso a recursos visando aumentar investimentos e fomentar a atividade econômica. Contudo, esse impulso também aproveita lacunas deixadas pela gestão anterior de Jair Bolsonaro (PL).
Em dezembro de 2022, uma decisão do Executivo retirou os limites impostos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) às operações feitas por estados que renegociaram suas dívidas com a União desde 1997 ou que aderiram a programas recentes de socorro fiscal. Essa mudança resultou em uma verdadeira “esteira paralela” de empréstimos. No ano passado, por exemplo, o limite era fixado em R$ 26 bilhões; no entanto, as contratações efetivas dobraram esse valor. Em 2024, o limite estabelecido é de R$ 15 bilhões, mas outros R$ 42 bilhões podem ser contratados sem restrições.
A preocupação dos especialistas está relacionada ao potencial desequilíbrio financeiro gerado por essas operações. Embora alguns estados e municípios estejam utilizando os recursos para expandir investimentos, outros estão desviando esses fundos para cobrir despesas correntes — como salários — criando um fenômeno conhecido como “troca de fontes” no jargão orçamentário.
Esse cenário pode se agravar caso ocorra uma desaceleração econômica ou uma diminuição na arrecadação do ICMS, principal fonte de receita dos estados. Tal situação tornaria difícil honrar obrigações financeiras com servidores e credores.
De acordo com Jeferson Bittencourt, chefe da macroeconomia do ASA e ex-secretário do Tesouro Nacional, “com todo esse aperto da política monetária [devido ao aumento da taxa de juros], haverá um arrefecimento da atividade econômica”. Ele alerta que isso pode provocar novas dificuldades financeiras nos estados.
A recente aprovação do Programa de Pleno Pagamento de Dívidas dos Estados (Propag) também gera apreensão adicional. Este programa diminui os juros das dívidas estaduais com a União e pode liberar mais recursos para gastos dos estados antes das eleições de 2026.
A elevação das despesas por parte dos estados e municípios traz à tona preocupações sobre as consequências para o PIB e sobre a eficácia da política monetária adotada pelo Banco Central. O aumento do gasto público pode exacerbar uma atividade econômica já aquecida e contribuir para pressões inflacionárias.
Bráulio Borges, economista-sênior da LCA 4intelligence e colunista da Folha, observa que no terceiro trimestre de 2024 as despesas totais alcançaram cerca de R$ 630 bilhões — valor superior aos R$ 510 bilhões registrados até o início de 2022 por trimestre. Parte desse crescimento deve-se às transferências da União por meio de fundos e royalties, mas também pode estar relacionada à expansão dos empréstimos.
Paulo Ziulkoski, presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), critica essa nova onda de recursos: “O fluxo financeiro está enterrando os municípios”, afirma ele. Segundo Ziulkoski, os novos empréstimos são destinados a cumprir obrigações específicas que nem sempre são as mais urgentes.