Crônicas de um Profeta de Todas as Tribos

Pelas Barbas do Profeta! É uma crônica? Um artigo? Uma poesia? Não, é o resultado de uma alma questionadora e irrequieta que nos faz refletir ... muito

  • Data: 02/12/2016 13:12
  • Alterado: 02/12/2016 13:12
  • Autor: Redação ABCdoABC
  • Fonte: Paulo Porto é roqueiro do ABC. Músico, Compositor, Pesquisador Cultural e Advogado
Crônicas de um Profeta de Todas as Tribos

 

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Ao me deparar cotidianamente com as certezas e entendimentos das pessoas, por suas arguições acerca dos mais variados assuntos pelas redes sociais; ao refletir e analisar os pensamentos de quem produz saber; as opiniões sobre quem comanda aonde, quem e o quê; as divulgações sobre isso em seu conjunto de formas, técnicas e intenções; além de outras, confesso que senti, a princípio, uma pequena desesperança, uma preguiça intelectual, a fraqueza febril da picada dos males que, prevalentemente, conduziram nossa história, posto que sempre expostos à exaustão: Senti uma vontade dissimulada de sair, de viajar pra outro lugar…

Dissimulei, pois, e, sem perceber, fiz uma digressão… E fui pra bem longe, me percebendo, assim, estar em outro lugar… E lá, nesse novo lugar, o ambiente, assim como sua atmosfera, no entanto, não se parecia em nada diferente de onde, até então, me encontrara. Apenas sentia ser outro lugar.

Nesse novo lugar, minha visão permitia enxergar apenas pequenas e sutis alterações no todo. Havia um toque de modernidade, eu diria, posto que as coisas ao redor parecessem mais novas, no entanto, ao mesmo tempo, notei também que as pessoas se pareciam mais velhas…

Mas que lugar é esse? – Pensei. Via prédios, casas, carros, luzes, seus habitantes e suas roupas. Sentia estar por aqui mesmo, no ABC, a 650 metros da altitude do mar, pois muitos dos que via, eram-me familiares. Mas, à minha direita, de repente, o mar… Também praças e ruas, feiras livres baldeando mercados fechados, com todos cheios de gente igualmente iguais e semelhantes… E, de certa forma, igualmente íntimos… E eu bem ali, ao mesmo tempo, no morro e ao nível do mar…

E na natural confusão das ruas fui tomado pelo braço, pelo que me pareceu um supetão… Uma dessas pessoas familiares que, ao me notar com certo atordoamento por contemplação, me questionou:
– Estás bem?
– Estou. Por que me questiona?
– Para saber se estás bem. E sua resposta já me bastou.
– Desculpe. É que estava agora mesmo em num lugar onde pouco se questiona e muito se explica, no entanto, sempre muito superficial, com parcas razões e muitas certezas…
– Mas você está no mesmo lugar. Essa é a sua terra…
– Ah, é? E como pode afirmar isso?
– Ora, olhe ao seu redor, para você… Olhe para mim. Somos semelhantes… Iguais! Não lhe pareço familiar?
– Parece, sim. Desculpe-me, novamente. Carrego certos vícios que insistem repulsar esse pensamento igual…
– Não deverias se questionar sobre isso, pois sendo isso uma conclusão, ela é rasa… Digo isso porque, mesmo com ela, você acabará por fazer de tudo para que seja também inquestionável. Mesmo assim… Mesmo contra você… Mesmo quando gentilmente se culpa…

Fiquei olhando para o velho, que, mesmo parecendo ofensivo, pouco tinha de soturno ou agressivo em seus dizeres. Na verdade, pareceu-me óbvio, sem perder o tempo que eu me acostumei a perdê-lo de onde vim, e fez-me sentir prolixo diante de minhas poucas palavras… Mas como gosto de um bom papo, ousei perguntar-lhe:
– Se essa é minha terra e se somos realmente iguais a ponto de senti-lo como a um próximo, porque a sua rasa razão me soou inquestionável diante do lugar de onde imagino vir?
– Oras, porque para ser inquestionável no Brasil de onde estás, não precisas ser profundo – ouvi, sem que tivesse ele, ao menos, puxado o ar para responder.

Caramba… E pode ser, pensei. Tenho visto isso na prática. No meu dia a dia. Devo mesmo estar no mesmo lugar. Mas, queria arrancar-lhe mais informação, posto que sua brevidade nas palavras não me abastecesse e tampouco me saciava.

E o tempo parecia parado. Não sentia o vento, apesar de seus longos cabelos brancos estarem irrequietos! Essa falta de referência de tempo/espaço, certamente se demonstrava de dentro para fora de mim e não ao contrário. E, para não me arrepender de minha estranha visita em minha própria terra, uma provocativa e irônica pergunta, sem que eu quisesse, haveria de me render um silencioso entendimento:

– Não entendi. Pode me explicar melhor? Por que o sinto profundo em sua superficial resposta, se me coloquei superficial em minha profunda dúvida? – destarte, finalmente ouvi um poético e profundo discurso que compartilho com vocês (que, espero, leiam mais de uma vez):
– Creia que é porque nessa nossa terra não há uma só alma que conheça a escuridão dos mares; que tenha visto uma só pérola numa concha aberta lá, no fundo do mar. Dessa forma, ninguém provou ainda do brilho da luz desse conhecimento, que assim represento como o de tantos outros,  porque, para se chegar a ela, antes, é necessário conhecer a escuridão…

Mas isso se dá porque ainda temos muitos problemas na superfície, sobre quem somos; o que, de fato, desejamos; e o que queremos como povo. Nossas raízes, dessa forma, não atingem o centro da terra, posto que sejam rasas como nossas certezas.  Mas certamente se entrelaçam no raso das relvas, e nos fazem brotar novas flores, posto que, ainda que superficialmente, cavam a terra, quem sabe para invocar incautos Deuses ou saberes ou, ainda, diante do Sol, por ele e para ele…

E é porque, em dúvida, não temos por aqui uma etnia. É o brasileiro e assim você, a melhor tradução da raça humana, finalmente retratada por sua miscigenação, do sangue de todos os povos que fez brotar a nova vida. Somos todos um único povo: O ser humano! E tristes são os que ainda pensam em sobreviver com seus simples e pueris pactos de sangue. Nossa mistura sanguínea há de não lhes caldear sabores por nossos descuidados pingos na terra, como assim esperariam os miseráveis que rodeiam mesas em busca de migalhas. Não germinamos assim. E nem por isso… Não somos mais dos mesmos…

Nossos olhos rasos e inexperientes, perante a sistemática que nos aviva, permite que não nos interessemos pelo que não funcionou no homem até os dias de outrora: pelo que nos protraiu por dor, pelo que nos destruiu por amor.

As lideranças da Terra nos colocaram mais pertos da alma e mais distantes do corpo. Ultrapassamos a metade inútil em que nos empurraram a fim de que nos perdêssemos e, assim, o tal desprezo nos colocou mais pertos do fim, posto que, depois de nos encaminharem para qualquer nada por suas próprias razões, atingimos a metade desse caminho e, agora, cada nosso próximo passo fora, senão, o caminho que não nos adentra mais à mata, mas a nova metade que nos faz dela sair, em uma saída que não nos permite voltar, infelizmente, nem para resgatar a eles próprios. Sem desejar a estoica razão do homem e suas fantásticas fábulas de sucesso que se traduzem na felicidade da certeza de que não prosperarão por suas próprias mortes…

Aprendemos a não saber exatamente o que é a vida e, por conta disso, do pouco que sabemos e diante da felicidade que desejamos, ainda que rasos e ignóbeis em nosso governo, a formar uma nova constelação, pois o infinito Universo sempre nos caberá.

E assim cuidará a luz de nos formar em nova cor. Que seu brilho reluzente lhes seja objeto de pesquisa e entendimento aos que de lá restarem. Que seus atuais tortuosos caminhos lhes tragam composições e poesias para que se adorem. A fim de que suas estradas lhes sejam mais retas.

Ainda que temam, como temem ao Senhor. Ainda que chorem pela perda próxima. Ainda que a dúvida lhes reste como a única forma de amar. Mas que a singela e exclusiva verdade lhes prevaleça, em detrimento dos descaminhos das mil faces da mentira. E que sejam guiados pelo interior de si mesmos, assim como fazem as borboletas, hesitantes em pousar em suas belas e falsas flores de plástico.

E ainda que desesperadamente busquem, que os anais históricos dessa futura lenda não os façam adorar a um novo e outro e mais um Deus, posto que ainda seja Ele único, mas que lhes rodeiem nós, como rasos anéis de poeira em contorno ao que lhes restara de seu planeta, assim como o é Saturno que, pressinto, vive ou viveu essa experiência aos os que lá restaram. Porque a mesma atemporalidade proposta aos hoje conformados rasos e miscigenados desse entorno, lhes será testada. Para que se lembrem; para que se perpetuem nesse espaço que lhes restam. E que não se fechem os anéis e que nem os apertem como cintas de um único furo…

Porque assim caminharão os rasos, os desentendidos do saber imposto em sua nova metade. Os mesmos mansos que receberam a vida como um presente do qual só quem lhes deu pode tirar. Em vida ou até mesmo na morte. À margem das ondas e dos rios. Ao pé da árvore e de ti. No entanto, caminhantes pari passu, seja por qualquer estrada determinada ou criada, seja ainda como bicho. Ainda que nem de longe o final feliz dos homens na Terra… Mas muito perto dos desejos daqueles que nos puseram a pisar por aqui…

Um êxtase sublime por mim curtido arrancou a profundidade da minha visão e me percebi retornar, pois, ao olhar de novo da sacada de minha varanda, reconheci que as árvores seculares da minha rua balançavam fortemente diante da força presente do vento, bem à minha frente. E elas não estavam diferentes em nada. Eram as boas amigas de sempre, companheiras de minhas humildes e solitárias reflexões.

No entanto, eu me sentia diferente, estranho, ainda alheio… E por isso, senti um pouco de vergonha ao olhar pra elas. E aquela mesma força primaveril do vento que as fazia dançar sem parar, cuidou em tomar o mesmo cuidado de soprar em meus ouvidos como uma suave brisa que fala, recobrando em mim, por fim, a minha consciência:

– Você não está diferente. Você continua otimista quanto ao homem, que é igual ao homem. O que você vê e ouve das pessoas de um modo individual, ainda o entristece, mas é o caminho de nossas evoluções, que alcançarão suas reais convicções, ainda no passo da metade em que se encontras. Você acabou de ver agora a mesma coisa, o mesmo pensamento desses mesmos homens, no entanto, para a sua coletividade, que contaminará ao Planeta, fazendo da raça humana a única raça… Você acabou de visitar o futuro de seu País! Mas não se envergonhe do tempo em que vives, pois o que vês agora, são as suas velhas amigas e companheiras árvores, que estão saudando a sua volta…

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  • Data: 02/12/2016 01:12
  • Alterado:02/12/2016 13:12
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