Repatriação de artefatos indígenas pauta Caminhos da Reportagem
Atração da TV Brasil aborda memória e identidade dos povos originários
- Data: 29/09/2023 09:09
- Alterado: 29/09/2023 09:09
- Autor: Redação
- Fonte: TV Brasil
Glicéria Tupinambá é uma liderança indígena no sul da Bahia
Crédito:Divulgação / TV Brasil
A edição inédita do Caminhos da Reportagem, programa jornalístico da TV Brasil, destaca o movimento de repatriação de artefatos dos povos originários neste domingo (1º), às 22h. Para explicar a importância desse processo, a equipe da emissora pública consulta indígenas e especialistas.
A produção reflete sobre como a restituição dos acervos nacionais, alguns dos quais levados para o exterior, contribui para valorizar as tradições e resgatar a memória e a identidade das populações indígenas. O conteúdo fica disponível também no app TV Brasil Play.
Exemplo de manto Tupinambá
Liderança indígena da Serra do Padeiro, no sul da Bahia, Glicéria Tupinambá comenta o retorno do manto Tupinambá, que há quase quatro séculos está no Museu Nacional da Dinamarca, em Copenhague. “Esse manto vem para fortalecer e dizer que nós existimos, resistimos e permanecemos aqui na resistência, sempre”, afirma a pesquisadora e artista.
A volta do manto, que será doado ao Museu Nacional, no Rio de Janeiro, ainda neste ano, segue um movimento de repatriação de artefatos aos países colonizados e seus povos originários, especialmente os do sul global. Funciona também como um fator de unidade e de restauração do território Tupinambá, comunidade que foi apagada com a chegada dos colonizadores europeus.
O antropólogo João Pacheco analisa esse contexto. “Os jesuítas começaram a empreender um processo de catequização nas aldeias, e [os indígenas] eram, de certa maneira, forçados a abandonar as práticas tradicionais deles de cultura, de religião, para se converter ao catolicismo. De lá para cá foi sempre uma história de invisibilidade”, explica.
Além disso, para os Tupinambá, os objetos são entidades, destaca a antropóloga Renata Valente: “É um antepassado que dialoga com eles, que ensina o caminho, que de uma certa maneira orienta na luta pelo território deles”, menciosa a estudiosa.
Reparação histórica
O programa da emissora pública aborda os benefícios dessa restituição. A partir do momento que o manto Tupinambá passa a ser reativado, há o ganho de espaço de uma nova discussão, reforça a secretária de Articulação e Promoção de Direitos Indígenas Joziléia Kaingang. “A gente pertence a um lugar. Para os Tupinambá também é assim. A reconstrução do manto, a reaproximação faz com que o território Tupinambá também se fortaleça e os Tupinambá se apropriem do território do manto”, declara.
A historiadora Márcia Chuva acrescenta que o retorno desses objetos ajuda a recompor histórias, identidades e cidadanias. “A repatriação, restituição ou devolução de artefatos dos povos originários é um movimento que mostra que esses objetos estão vinculados às populações do presente e não é um problema do passado. Na verdade, quem reivindica são as populações que vivem hoje e sentem a perda daquele objeto. As demandas por restituição são no sentido de reparar dores, sofrimentos, feridas”, diz.
Retorno de acervo nacionais
O Caminhos da Reportagem ainda apresenta outra situação relacionada a acervos nacionais que podem ser enquadradas no movimento de repatriação. O Museu do Índio, no Rio de Janeiro, conseguiu a devolução de mais de 600 artefatos indígenas, que estão de forma irregular no Museu de História Natural de Lille, na França.
O conjunto ficou pelo menos 15 anos no museu europeu e deveria ter retornado em 2009, segundo o governo brasileiro. Entre os itens, um tronco de madeira usado pelos Kamaiurá durante o Kuarup, ritual de despedida dos mortos.
A indígena Kanaiaku Kamaiurá fala sobre o assunto. “Ele é um ritual onde a família que perdeu seu ente querido faz esse processo para retirada do luto. É um dos rituais mais longos que tem. O pajé entra na mata e escolhe o tronco que vai receber o espírito daquela pessoa que se foi para ser levado para o centro da aldeia e ser enfeitado. A família poder chorar pela última vez”, elucida.
Juliano Almeida, coordenador de patrimônio cultural do Museu do Índio, afirma que trazer esses acervos de volta significa oferecer instrumentos de luta e garantir os direitos dos povos indígenas. “As comunidades, os povos indígenas que têm relação com os objetos, eles precisam ter resguardado a eles o direito de se aproximar das peças, de interagir com as peças, porque tudo para nós tem uma conceituação espiritual”, enfatizou Joziléia Kaingang.