HISTÓRIA: O primeiro ônibus elétrico no Brasil
A imagem carnavalesca de 1917 no Rio de Janeiro não revela apenas que o Brasil é o país do samba. Linha teve por dez anos ônibus com baterias no Rio de Janeiro entre 1918 e 1928
- Data: 17/07/2017 15:07
- Alterado: 15/08/2023 19:08
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Diário do Transporte
O primeiro bonde elétrico do Brasil e de toda América do Sul foi o carro de nº 104 da Cia. Ferro-Carril do Jardim Botânico
Crédito:Charles Dunlop
Na última sexta-feira, 14 de julho de 2017, o prefeito de São Paulo, João Doria, e o secretário de mobilidade e transportes, Sérgio Avelleda, apresentaram um ônibus elétrico fabricado em Campinas, no interior paulista, pela chinesa BYD, que recebeu carroceria Caio, de Botucatu, também no interior paulista. De acordo com anúncio, é o primeiro ônibus elétrico brasileiro.
Apesar da inegável importância de uma frota 100% limpa, com ônibus elétricos, e de todos os méritos aos investimentos feitos pela BYD no Brasil, a informação do prefeito não é verdadeira.
Vale ressaltar que o intuito desta matéria não é contestar o prefeito e tampouco rivalizar as empresas fabricantes. A necessidade de transportes limpos, eficientes e modernos é tão grande que há espaço para todos: Eletra, BYD, Volvo, Mercedes-Benz e todas que querem investir e têm bons projetos. Não se diz nesta matéria que foi o intuito do prefeito de passar esta informação sem o detalhamento que seria o primeiro ônibus nacional elétrico comercializado para a cidade de São Paulo. Esta matéria trata-se, entretanto, apenas de uma reprodução de fatos históricos.
Em 2013, a Eletra, empresa que atua desde os anos 1990, em São Bernardo do Campo, pertencente ao Grupo ABC, genuinamente nacional, apresentava o E-Bus, também com carroceria Caio Millennium, de 18 metros de comprimento. O modelo foi o resultado de uma parceria com as empresas japonesas Mitsubishi Heavy Industries e Mitsubishi Corporation. O veículo foi desenvolvido em São Bernardo do Campo e sua tração é por um motor elétrico cuja única fonte de energia é um banco de baterias, instalado a bordo do veículo. É o mesmo sistema de tração de um trólebus comum, porém sem a necessidade de rede aérea externa. Segundo a Eletra, o ônibus foi dotado de conjunto de 14 baterias, que exigem apenas três horas para recarga total, garantindo autonomia operacional de 200 km. Foi desenvolvido um sistema de recarga rápida, que pode ser feita em 5 minutos, oferecendo mais 11 km de autonomia.
Na edição de 2013 da Feira Transpúblico, em São Paulo, a Iveco apresentava o minibus Daily Electric 50C/E. Dotado de baterias de sódio e níquel foi desenvolvido em parceria com a Itaipu Binacional.
Em dezembro de 2015, a empresa brasileira Agrale entregou o primeiro miniônibus elétrico desenvolvido em parceria com a Itaipu Binacional.
O veículo foi montado sobre Agrale MA 8.7 com carroceria Mascarello. O sistema de propulsão foi feito pela Siemens. O modelo que integrou o projeto piloto Curitiba Ecoelétrico da capital paranaense, recebeu dois motores elétricos de 67 kW e uma caixa de engrenagens que une a força dos dois motores em uma única saída de eixo cardan. Também fizeram parte do veículo dois inversores de frequência para o gerenciamento dos motores elétricos e cinco baterias com capacidade total de 105 kWh, que garantia autonomia de até 150 quilômetros. O tempo de recarga completa era de oito horas.
O Projeto Veículo Elétrico (VE) começou em maio 2006, com a formalização de uma parceria entre Itaipu Binacional, a maior geradora de energia limpa e renovável do Planeta, e a KWO – Kraftwerke Oberhasli AG, que controla usinas hidrelétricas na região dos Alpes, na Suíça. O acordo foi formalizado em maio de 2006.
Programa VE desenvolveu seu primeiro projeto de ônibus 100% elétrico em 2010, mesmo ano que estreou de fato um ônibus híbrido foi durante a Cúpula de Presidentes do Mercosul, em Foz do Iguaçu, em dezembro.
Em 18 de fevereiro de 2016, a empresa Imobrás, do Rio Grande do Sul apresentou um micro-ônibus elétrico totalmente brasileiro.
O projeto e o protótipo do veículo foram desenvolvidos na cidade de Feliz. A sede da empresa fica no outro município, Alto Feliz, onde está instalada desde 2001.
De acordo com nota da Prefeitura de Feliz, a Imobrás adquiriu um ônibus de pequeno porte Volare, ano 1999, e reformou totalmente o veículo.
O motor a combustão foi retirado e no lugar foi colocado o sistema com o motor elétrico, feito pela empresa gaúcha, e baterias.
Em dezembro de 2016, uma reformulação do E-Bus, da Eletra, entrou em operação experimental na UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina. Com a novidade: a energia elétrica do ônibus vem da energia solar. Placas fotovoltaicas captam a luz do sol, a estação transforma em energia elétrica, que é direcionada às baterias do ônibus na hora da recarga.
Sistema com o mesmo conceito deve ser instalado pela BYD na garagem da Ambiental Transportes, na zona Leste de São Paulo, como anunciou em 14 de julho de 2017 o secretário Sérgio Avelleda.
Mas, você sabia que bem antes dos BYD e dos Eletra, o Brasil teve uma linha de ônibus 100% elétricos com bateria? E bota bem antes nisso. O veículo foi apresentado em 1917 e circulou entre 1918 e 1928, mas a fabricação era norte-americana.
Em 2014, o Diário do Transporte trazia esta matéria histórica, que reproduzimos aos leitores:
O ÔNIBUS ELÉTRICO PURO DE 1917 NO BRASIL
A imagem carnavalesca de 1917 no Rio de Janeiro não revela apenas que o Brasil é o país do samba. Mostra também que desde o início do século passado, o mundo já buscava alternativas de se deslocar com veículos que não dependessem de combustíveis com origem no Petróleo.
Atualmente a dobradinha Brasil-Japão, com a Eletra e a Mitsubishi, e a chinesa BYD testam seus ônibus elétricos que, diferentemente dos trólebus, se movem apenas com baterias sem a necessidade da fiação aérea.
No entanto, a notícia que se tem do primeiro ônibus elétrico a baterias que circulou no Brasil foi de 1917. E não rodou por alguns meses apenas.
De acordo com o Museu do Transporte da NTU – Associação Nacional das Empresas de Transportes Urbanos, os ônibus foram fabricados nos Estados Unidos. Em 1917, a prefeitura do Rio de Janeiro aprovou uma linha para estes ônibus a baterias que passava pela Avenida Rio Branco, entre a Praça Mauá e o Palácio Monroe, onde ficava o antigo Senado Federal – o Rio tinha sido capital de república.
Claro que não é o intuito de comparar as tecnologias, obviamente mais avançadas nos veículos da Eletra/Mitsubishi e da BYD hoje no Brasil. Mas vale ressaltar que o serviço de ônibus a bateria no Rio de Janeiro durou 10 anos, entre 1918 e 1928.
E hoje apregoados como novidades, os ônibus elétricos puros no Brasil poderiam ser comuns se houvesse mais autonomia econômica do país e a vontade de investir.
Não é informado ao certo o motivo pelo qual estes veículos deixaram de circular. Mas analisando o contexto da época, é possível traçar algumas linhas de explicações.
O Brasil viveu entre 1926 e 1932 um período de seca imensa (só houve uma trégua em 1919). O racionamento de água desestimulava qualquer tecnologia que dependesse de eletricidade.
A Primeira Guerra Mundial, entre 1914 e 1918, provocou uma crise na indústria do petróleo. Passando este período, as companhias petrolíferas queriam recuperar mercado e crescer e já nesta época era forte a influência destas empresas nas políticas econômicas de todo o mundo.
O que se sabe é que foi justamente por causa dos fatores que marcaram este período que os trólebus chegaram tarde ao Brasil.
O País já tinha Bondes Elétricos. Mas a busca era por veículos mais autônomos, que continuassem a depender dos fios, mas que não necessitassem dos trilhos.
De acordo com pesquisas de Waldemar Corrêa Stiel, historiador na área de transportes, em 1914, a revista “A Cigarra Paulistana” publicava o seguinte anúncio: “Bondes elétricos sem trilhos para transporte de passageiros e mercadorias, entre as cidades do interior servidas por iluminação elétrica. Informações e fotografias, Rua Direita n° 8-A, sala 5”
No entanto, nada se soube mais a respeito dos trólebus até que em 30 de junho de 1922 foi aprovado o Decreto Municipal de São Paulo 2506 que autorizava uma ligação de “Electrobus” que acabou não saindo do papel:
“Artigo 1°- Fica a Prefeitura autorizada a conceder licença a título precário e intransferível, sem consentimento da Câmara, a Ascário Cerquera e Edgard de Azevedo Soares ou empresa que os mesmos organizarem para o estabelecimento de bondes elétricos. Obs.: sem trilhos, sistema “Electrobus”, ligando o alto de Sant’Ana às divisas de Juqueri, Lapa, Freguesia do Ó e Penha, às divisas de Guarulhos. “
Não ficava claro se o sistema “Electrobus” era referente a trólebus ou ônibus elétricos com baterias.
Em 14 de agosto de 1938, na sede do Instituto de Engenharia de São Paulo, Charles Burgeois fez uma palestra sobre os trólebus no mundo. Um ano antes, em 1937, já se cogitava em ônibus elétricos pelo fato de a Light demonstrar que não tinha mais interesse em operar os bondes de São Paulo.
Ainda de acordo com as pesquisas de Waldemar Correa Stiel, em 1939, a imprensa noticiava que a prefeitura pretendia comprar ônibus elétricos para São Paulo: “administração municipal pretende adquirir 10 ônibus ou Trolley-Coaches a fim de experimentá-los nesta capital, com o objetivo de procurar uma solução para o problema dos transportes coletivos em virtude de expirar em 1941 o contrato que a cidade mantém com a Light and Power”
Os trólebus chegariam ao Brasil somente em 1947, sendo que o início das operações foi em 22 de abril de 1949 pela CMTC – Companhia Municipal de Transportes Coletivos.
“Eram vinte de fabricação norte-americana, da Westram; seis de fabricação Pullman, também norte-americanos, e quatro de procedência inglesa, da British United Transit Co. (BUT). O itinerário da primeira linha (Aclimação) foi o seguinte: Praça João Mendes, Ruas Conselheiro Furtado e Pires da Mota, Avenidas Aclimação, Turmalina e Praça General Polidoro, numa extensão de 2.500 metros”. – diz a pesquisa de Stiel.
Vale ressaltar que apesar das pesquisas técnicas e testes hoje em torno dos ônibus a baterias, híbridos (movidos por combustível e eletricidade) e até sobre o sistema de células de combustível a hidrogênio, os trólebus não podem ser considerados “coisas do passado”.
A indústria brasileira deste tipo de veículo se modernizou. A Eletra, por exemplo, até exporta sistemas.
Hoje os trólebus possuem alavancas pneumáticas, que reduzem os riscos de quedas dos pantógrafos parando os veículos nas vias, o sistema é de corrente alternada, há um grande nível de nacionalização das peças, tornando os trólebus mais baratos que no passado, e os mais recentes modelos saem de fábrica com baterias armazenadoras que podem fazer com que os trólebus consigam circular de quatro quilômetros a sete quilômetros sem estarem conectados aos fios, em caso, por exemplo, de queda de energia. Isso também facilita as manobras dentro das garagens.
O trólebus é considerado solução de mobilidade confortável e limpa para circular em corredores, que possuem melhor pavimento e linhas mais retas, sendo separados do trânsito dos demais veículos, como os BRTs – Bus Rapid Transit.
Mas nenhum dos BRTs previstos para todo o Brasil contempla sistema de ônibus elétricos.
A principal vantagem é a ambiental, já que não há emissão de gases poluentes durante a operação. Mas há outras características que podem deixar os trólebus atraentes tanto para o cidadão como para as operadoras: O nível de ruído é baixo e os trancos durante a viagem são menores (não há trocas de marchas, nem manuais e nem automáticas).
O custo de aquisição é hoje 1,8 vez maior que um ônibus diesel comum do mesmo porte. Mas um trólebus pode durar de 20 a 30 anos, ou seja, de duas a três vezes mais que o previsto para uma frota a diesel. Este custo maior de compra se diluiria pela vida útil maior.
Os fabricantes também garantem que os custos de operação e manutenção também acabam sendo menores por causa deste fator.