30 filmes para comemorar os 30 anos do Dia Mundial da Luta Contra a AIDS
Como o cinema ajudou a conscientizar o público sobre a doença.
- Data: 04/12/2018 17:12
- Alterado: 04/12/2018 17:12
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Lilian Trigo
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O Dia Mundial da Luta Contra AIDS foi comemorado pela primeira vez em 1º de dezembro de 1988. Idealizado por James W. Bunn e Thomas Netter, dois agentes de informação pública do Programa Global sobre AIDS (atual UNAIDS) da Organização Mundial de Saúde, tinha como objetivo diminuir o estigma em torno da doença e promover o diálogo e a troca de experiências sobre o assunto.
Os primeiros casos foram diagnosticados em 1981 e, como a maioria dos pacientes era homossexual, a doença foi erroneamente classificada como câncer gay. O preconceito gerou uma onda de homofobia e, como na época ainda não havia medicamento para tratá-la, a AIDS era considerada por muitos uma sentença de morte. No dia 4 de fevereiro de 1983, os pesquisadores do Instituto Pasteur de Paris isolaram pela primeira vez o Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV), que destrói o sistema imunológico e propicia o desenvolvimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS), e assim a doença começou a ser mapeada oficialmente.
O ano de 1985 pode ser considerado o ano em que foram alcançados os maiores avanços, tanto em matéria científica como na maneira como a AIDS era tratada na América. Foi o ano em que o governo Reagan finalmente admitiu que existia uma epidemia. A imprensa e a opinião pública, até então indiferentes, não puderam mais varrer o assunto para baixo do tapete depois da morte de Rock Hudson, a representação do galã macho americano. No meio de tudo isso, surgiu “Buddies”, o primeiro filme a abordar o assunto. Escrito e dirigido por Arthur J. Bressan Jr., foi filmado em nove dias com um orçamento de 27 mil dólares e exibido pela primeira vez no Festival Internacional LGBT de San Francisco, em setembro daquele ano. O filme desapareceu e ficou esquecido durante muito tempo, até ser resgatado e restaurado por Jenni Olson, cineasta e pesquisadora da cultura LGBT.
No ano seguinte, coube a Steve Buscemi, no seu segundo filme, interpretar o soropositivo Nick em “Parting Glances – Olhares de Despedida”. No entanto, o grande filme da década, “Meu querido companheiro”, só foi lançado em 1989. O diretor estreante, Norman René, reuniu um elenco de caras novas, que logo se tornariam conhecidas, como Campbell Scott, Mary-Louise Parker, Bruce Davison, Dermot Mulroney e Tony Shalhoub. O filme é um retrato comovente de como as relações amorosas e de amizade são afetadas pela epidemia.
A década de 90 é considerada a ‘era de ouro’ dos filmes sobre o tema. Para o grande público, “Filadélfia”, de Jonathan Demme, foi o filme que tirou a AIDS da marginalidade e trouxe o assunto para a sala de jantar. Vencedor de 2 prêmios da Academia, foi também o ponto de virada na carreira de Tom Hanks que, depois de conquistar o Oscar por sua interpretação do advogado Andrew Beckett, deixou de lado a imagem de comediante e passou a ser respeitado como um ‘ator sério’. O mesmo aconteceu, 20 anos depois, com Matthew McConaughey em “Clube de Compras de Dallas”.
“E a vida continua”, do diretor canadense Roger Spottiswoode é uma adaptação do livro do premiado jornalista Randy Shilts e acompanha a progressão da AIDS de 1980 a 1985, na área de San Francisco. Shilds, que se recusou a saber o resultado do seu exame até ter terminado o manuscrito, entrevistou centenas de pessoas, entre políticos, cientistas, atores, ativistas e até Gaëtan Dugas, comissário de bordo canadense que por anos foi considerado o “paciente zero”da doença.
Na metade da década, surgiram filmes que retratavam pacientes for a do grupo de risco. “Kids” de Larry Clarke, apresenta pela primeira vez adolescentes heterossexuais como portadores do vírus. “Somente elas”, drama estrelado por Woopi Goldberg, Drew Barrymore e Mary-Louise Parker, mostra a improvável amizade entre essas três mulheres e como elas lidam com a doença de uma delas. O belo “A Cura” aborda o contágio através de transfusão de sangue e a viagem de dois garotos em busca de um médico que supostamente poderia curar a doença.
Muitos foram os filmes europeus sobre o tema, mas poucos causaram o impacto de “Noites Felinas”. O filme é baseado na autobiografia de Cyril Collard, ganhador póstumo do prêmio Cesar, o Oscar do cinema francês. Collard era poeta, ator e cineasta, uma espécie de crossover entre Cazuza e Caio Fernando Abreu. Da Espanha vem o premiado “Tudo sobre minha mãe” de Pedro Almodóvar. Em 2001, “Um Amor Quase Perfeito”, do diretor turco naturalizado italiano Ferzan Özpetek, mostra a infectologia Antônia, que depois da morte inesperada do marido, encontra apoio e acolhimento numa excêntrica comunidade de gays, trans, prostitutas e imigrantes. O belo e triste “Blue” é o filme testamento do diretor britânico Derek Jarman. Inédito no Brasil, o filme alemão “Vakuum”, de 2017, conta o drama de uma mulher de 60 anos que, às vésperas de comemorar 35 anos de casamento, descobre ter sido infectada pelo marido.
O cinema brasileiro tem poucos filmes sobre o assunto, mas vale destacar os longas-metragens “Cazuza: O Tempo Não Pára”, e“Carandirú”. “Boa Sorte” é uma adaptação do conto de Jorge Furtado, “Frontal com Fanta”, dirigida por Carolina Jabor, com a atriz Deborah Secco como protagonista.
Nada colaborou mais para o debate que o teatro e suas adaptações para as telas. “Angels in América”, a megalomaníaca peça de Tony Kushner, de mais de 7 horas de duração, virou uma minissérie da HBO, dirigida por Mike Nichols, com o estrelado elenco encabeçado por Al Pacino, Emma Thompson, Meryl Streep e Jeffrey Wright. O drama de Terrence McNally, “Entre Amigos”, vencedor do prêmio Tony de 1995, que conta a história de um grupo de amigos que se reúne numa casa de praia durante um feriado, chegou aos cinemas apenas dois anos após a sua estréia na Broadway. O musical “Rent: Os Boêmios”, versão moderna da ópera “La Bohème”, troca tuberculose pela AIDS e Paris pelo Village. Em 2014, “The Normal Heart”, peça de Larry Kramer que foi apresentada no circuito off-Broadway em 1985 e voltou a ser encenada em 2011, virou um filme da HBO estrelado por Mark Ruffalo, Julia Roberts, Matt Bomer, Jim Parsons, Alfred Molina e Taylor Kitsch.
“Caminhos Cruzados”, vencedor do Oscar em 1990, conta a história de cinco pessoas, que morreram nos primeiros anos da epidemia, cujos nomes estavam na AIDS Memorial Quilt, a gigantesca colcha de retalhos que foi colocada, pela primeira vez, na frente da Casa Branca em 1987. Um dos depoimentos mais comoventes é de Vito Russo, ativista e autor do livro “O Outro Lado de Hollywood”, Em 2011, a HBO encomendou ao produtor e diretor Jeffrey Schwarz um documentário sobre a vida de Russo, que morreu em 1990, intitulado “Vito”.
Vale destacar a produção documental não americana. Através de seis personagens de diferentes gerações, “Everybody Toditos”, retrata os 30 anos da epidemia de AIDS na comunidade LGBT da República Dominicana. Já “Memory Books – Damit du mich nie vergisst…”, documentário da cineasta alemã Christa Graf produzido em Uganda, mostra mães soropositivas que escrevem diários para os seus filhos. Lançado em 2016, o curta-metragem “Promising Practices in Indigenous Communities in Saskatchewan” mostra o crescimento do contágio nas comunidades indígenas no Canadá, que atinge índices alarmantes, quatro vezes maiores que a média nacional. Do mesmo ano é “Doin’ My Drugs”, que conta a história do músico zambiano Thomas Muchimba Buttenschøn, que nasceu HIV positivo e emigrou para a Dinamarca para um tratamento experimental.
Para encerrar, os três lançamentos mais recentes, baseados em histórias reais. “Tom of Finland”, cinebiografia de Touko Valio Laaksonen, um dos mais importantes expoentes da arte erótica do século XX, foi exibido no Festival do Rio do ano passado. O belíssimo “120 Batidas por Minutos”, vencedor do grande prêmio do festival de Cannes, conta o começo do trabalho da trajetória dos ativistas franceses do grupo “ACT UP”. E finalmente, “Bohemian Rhapsody”, a história da banda inglesa Queen e do seu extravagante vocalista Freddie Mercury, espetacularmente interpretado por Rami Malek.
Todos esses filmes têm as suas particularidades e conseguem humanizar a doença mais devastadora dos últimos tempos e, ao mesmo tempo, comover.