Lei paulista que usa dinheiro da educação é inconstitucional segundo PFDC
Dispositivos da lei paulista que permite que o governo estadual inclua no orçamento do piso da educação valores referentes ao pagamento de benefícios a servidores inativos é questionada
- Data: 05/03/2019 16:03
- Alterado: 05/03/2019 16:03
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
Crédito:PFDC
A Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, braço do Ministério Público Federal (PFDC/MPF), defende a inconstitucionalidade de dispositivos da lei paulista que passou a permitir que o governo estadual inclua no orçamento do piso da educação valores referentes ao pagamento de benefícios a servidores inativos.
A Lei Complementar 1.333 (projeto de lei complementar 57) foi promulgada nos estertores do governo Márcio França (PSB), em 17 de dezembro de 2018, e, em seu artigo 5.º, autoriza a contabilização de despesas decorrentes do sistema próprio de previdência no piso mínimo de aplicação obrigatória em educação – contrariando os dispositivos constitucionais que tratam da matéria, segundo entendimento da Procuradoria.
As informações foram divulgadas pela Assessoria de Comunicação e Informação da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC).
A legislação também inclui como investimento em educação qualquer despesa para manter o equilíbrio financeiro e atuarial do regime próprio, seja ela com inativos da educação ou de outras áreas.
Para a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, além de ferir o artigo 6.º da Constituição Federal que assegura o direito à educação, a lei paulista fere o artigo 22, que estabelece como competência privativa da União para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional.
“A lei editada pelo governo de São Paulo também descumpre o dever de progressividade na concretização de direitos fundamentais, assumido pelo Brasil no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais e que foi promulgado pelo Decreto 591/1992”, acentua a Procuradoria.
“Ao incluir despesas necessárias ao equilíbrio financeiro e atuarial do Regime Próprio de Previdência como se fossem em manutenção e desenvolvimento do ensino, a referida legislação burla o espírito da Lei de Diretrizes e Bases da Educação e do artigo 212 da Constituição da República, que trata do percentual mínimo a ser investido na manutenção e desenvolvimento do ensino”, destaca a procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat.
Na sexta-feira, 1, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão encaminhou à procuradora-geral, Raquel Dodge, um conjunto de argumentos que apontam a inconstitucionalidade do artigo 5.º, III, da Lei Complementar 1.333/2018.
O documento ressalta que ‘uma lei estadual não pode dispor sobre a inclusão de novas despesas na categoria de manutenção e desenvolvimento do ensino, tendo em vista que a Lei Federal 9.394/1996 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) já disciplina o assunto’.
O texto reforça que o Supremo Tribunal Federal ‘possui entendimento pacífico no sentido de que é de patamar constitucional a controvérsia relativa à repartição de competência legislativa entre a União e os estados, sendo que, em matéria de educação, cabe à União dispor sobre normas gerais’.
“Em razão dos prejuízos que o baixo investimento representa para o direito à educação, a PFDC defende que seja apresentado ao Supremo pedido de liminar para suspender os efeitos do artigo 5.º, III, da Lei Complementar 1.333/2018, bem como, que a suprema corte declare inconstitucional a referida legislação.”
DECISÕES
De acordo com a Procuradoria, a ‘lei editada pelo governo do estado de São Paulo reproduz, de modo semelhante, o teor de dispositivos da Lei Complementar 1.010/2007, também paulista, que prevê, no cômputo dos pisos estaduais da saúde e da educação, despesas decorrentes de aposentadorias e pensões, bem como insuficiências financeiras do regime próprio de previdência’.
Segundo o braço do MPF, esses ‘dispositivos já foram impugnados junto ao Supremo Tribunal Federal por meio das ADI 5.719, ajuizada em 2017 pela Procuradoria-Geral da República, em atendimento a uma representação proposta pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão’.
“Ação semelhante também foi ajuizada no Supremo por meio da ADI 5.546, que questiona a Lei 6.676/1998, do estado da Paraíba”.
COM A PALAVRA, O EX-SECRETÁRIO DE PLANEJAMENTO DE SÃO PAULO, MAURÍCIO JUVENAL
O ex-secretário de Planejamento Maurício Juvenal ressalta que São Paulo é um dos ‘poucos estados’ que destinam mais de 30% do orçamento à educação. “O Estado de São Paulo entendeu elevar esse gasto de 25% para 30%, mas não estipulou de que modo esses 5% adicionais poderiam ser gastos”.
O ex-chefe da pasta explica que após a elevação dos repasses à educação de 25% para 30%, não existia regulamentação do uso do excedente. “O Estado decidiu aumentar de 25% pra 30%. Elogiável. No entanto, precisávamos disciplinar o uso dos 5% excedentes. Gostaria de ressaltar que apenas uma parte desses 5% a mais é utilizada para pagar inativos”.
O ex-secretário ainda afirma que a regulamentação do uso da verba para o pagamento de inativos foi um ‘debate feito todo com os órgãos de controle’. “Não quisemos fazer o nosso único entendimento. Conversamos com o Ministério Público, com a Assembleia, com o Tribunal de Contas do Estado”.
E ainda alerta. “O Estado poderia voltar a destinar 25% com a educação, de maneira a não se utilizar mais de uma parte desses 5% a mais para o pagamento dos inativos, mas eu discordaria dessa medida”.
“O que nos preocupa é que haja uma redução em São Paulo dos gastos com educação”.