Junta militar do Sudão ataca acampamento de opositores e mata 13
O Conselho Militar de Transição do governo sudanês negou ter dispersado o acampamento à força. "Não dispersamos o protesto pela força", disse um porta-voz do conselho
- Data: 03/06/2019 17:06
- Alterado: 03/06/2019 17:06
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
Crédito:Reprodução
Militares que governam o Sudão forçaram, nesta segunda-feira, 3, a dissolução de um acampamento popular montado há semanas em frente ao quartel-general em Cartum. A operação resultou em 13 mortos, segundo informações de um comitê médico local. Enquanto os disparos contra o acampamento eram ouvidos, membros de forças de segurança fortemente armados e vans com metralhadoras foram posicionados em toda a capital do país.
O acampamento foi montado durante os protestos que levaram à queda do ex-presidente Omar Bashir. Após o ditador deixar o poder, em abril, as manifestações voltaram-se contra o governo militar que o sucedeu.
O Comitê Central de Médicos Sudaneses, entidade ligada aos manifestantes, confirmou as 13 mortes, relatou um “grande número” de feridos graves e pediu “apoio urgente” ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha e a outras organizações humanitárias para ajudar as vítimas.
O Conselho Militar de Transição do governo sudanês negou ter dispersado o acampamento à força. “Não dispersamos o protesto pela força”, disse um porta-voz do conselho, general Shamsedin Kabashi, à emissora de TV Sky News, dos Emirados Árabes Unidos. “As tendas ainda estão lá e os jovens podem se mover livremente” disse o general.
O porta-voz disse que as forças de segurança agiram em uma área “perigosa”, apelidada de “Colômbia”, perto do local da ocupação. “Aquele lugar, chamado ‘Colômbia’, foi durante muito tempo uma fonte de corrupção e atividades ilícitas”, disse o militar.
A relação entre militares e manifestantes ficou tensa após o fracasso das negociações entre a junta de governo e a oposição no último mês. Grupos contrários ao antigo governo interromperam os contatos com o Conselho Militar de Transição e convocaram novas manifestações. “Anunciamos o fim de qualquer contato político e negociação com o Conselho golpista”, disse a Aliança pela Liberdade e Mudança (ALC), em comunicado.
A ALC convocou “a greve total e indefinida e desobediência civil a partir de hoje” para esta segunda. Neste momento, “ninguém é deixado antes da sede das Forças Armadas, apenas os cadáveres dos nossos mártires que não era possível evacuar”, diz o grupo.
A Associação de Profissionais Sudaneses (APS), um dos organizadores do protesto, falou de “abate” e instou o Sudão à “desobediência civil total a derrubar o traidor e assassino Conselho Militar”.
ONU CONDENA VIOLÊNCIA DO GOVERNO
A chefe de Direitos Humanos da ONU, Michelle Bachelet, pediu nesta segunda que as forças de segurança sudanesas interrompam os ataques aos campos de protestos de Cartum e que equipes médicas tenham acesso aos feridos na operação. “Deploro totalmente o aparente uso de força excessiva nos campos de protesto. Relatos de que munições foram usada pelas forças de segurança próximas e, mesmo dentro, das instalações médicas são extremamente alarmantes”, disse Bachelet em comunicado. “Peço que as forças de segurança suspendam imediatamente esses ataques e garantam acesso seguro e desimpedido aos cuidados médicos para todos”.
O ministro das Relações Exteriores do Reino Unido condenou “o ataque aos manifestantes” e chamou-o de “passo escandaloso”. “O Conselho Militar é totalmente responsável por essa ação e a comunidade internacional será responsável”, escreveu Jeremy Hunt no Twitter.
Por sua parte, a embaixada dos EUA em Cartum exigiu um fim à operação das forças de segurança sudanesas: “É injustificada e deve cessar”, publicou o órgão no Twitter.
O chefe do Conselho Militar no poder, Abdel Fatah al-Burhan, visitou recentemente o Egito, os Emirados Árabes Unidos e a Arábia Saudita, três países que expressaram apoio ao novo governo.
À frente do Sudão por quase 30 anos, Omar Bashir foi deposto e preso pelo Exército em 11 de abril sob pressão de um movimento sem precedentes desencadeado após o governo triplicar o preço do pão em um país envolvido por uma grave crise econômica.