Indústria automobilística poderá acumular incentivos, mas terá de correr, diz secretário
O benefício será a concessão de um crédito financeiro, que as empresas poderão abater dos impostos a pagar.
- Data: 17/02/2024 16:02
- Alterado: 17/02/2024 16:02
- Autor: Redação
- Fonte: FOLHAPRES/Adriana Fernandes
Crédito:Reprodução
O secretário de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços do governo federal, Uallace Moreira, diz que as empresas poderão acumular incentivos adicionais no Mover (Mobilidade Verde), o novo programa para a indústria automobilística, se exportarem mais e ampliarem a inserção do Brasil nas cadeias produtivas globais.
À Folha, Uallace Moreira afirma que haverá uma trava para o total de incentivo tributário que o governo vai conceder. O benefício será a concessão de um crédito financeiro, que as empresas poderão abater dos impostos a pagar.
“O pedido de crédito financeiro será por ordem cronológica. As empresas terão que correr”, diz. O programa prevê uma renúncia fiscal de R$ 19,3 bilhões entre 2024 e 2028.
Moreira defende o gasto do governo com a concessão de mais incentivos para um dos setores que mais foram beneficiados nas últimas décadas.
O secretário prevê que o carro elétrico no Brasil vai descarbonizar mais do que nos outros países. E afirma que o Brasil tem a vantagem de estar à frente com a tecnologia do etanol.
DESCARBONIZAÇÃO
O Mover é um programa que coloca o Brasil na fronteira do debate das rotas tecnológicas para carros sustentáveis.
Se você pegar um carro elétrico com a bateria produzida na Europa ou na China, considerando a matriz energética hoje, e pegar uma bateria produzida no Brasil, pode ter certeza que o carro elétrico no Brasil vai descarbonizar mais do que nos outros países. A razão é que a fonte da matriz energética aqui é limpa.
TRAVA NAS CONCESSÕES
Não há projeções de quanto pode chegar de investimento.
Tanto é que o programa tem uma trava. Se o volume de investimento, por exemplo, ultrapassar o limite de R$ 3,5 bilhões em 2024, as empresas que fizerem por último não terão o crédito financeiro. O pedido de crédito financeiro é por ordem cronológica. As empresas terão que correr.
IPI VERDE
Há uma grande expectativa por parte do setor sobre a regulamentação do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados) Verde para os carros sustentáveis.
Vai ser um IPI mais barato para os veículos que descarbonizar mais. É uma nova fórmula de cálculo do IPI que considera consumo, potência do motor, segurança veicular e reciclabilidade.
Esses critérios somados estabelecerão as alíquotas diferenciadas. Todos [híbridos e flex] obedecerão a esses critérios.
DECRETO NOS PRÓXIMOS DIAS
A regulamentação vai funcionar até 2028. Quando tiver o IBS e a CBS [tributos que serão criados pela reforma tributária], acabou, passa para outro tipo de regulamentação.
Galeria Escandinávia caminha para ser a primeira região sem carros a combustão Países como Noruega, Suécia e Dinamarca transformam carro elétrico em realidade
O mundo inteiro está fazendo isso [conceder benefícios]. Europa, Estados Unidos, Ásia… O volume de subsídios e incentivos que BYD tem [na sua origem] não está no gibi. São bilhões.
Estamos falando de países de alta renda que estão dando subsídio. Não deveriam dar? O Brasil não está distanciado do mundo. Pelo contrário, não chega nem perto o que esses países estão fazendo para promover um processo de descarbonização na mobilidade.
CRÍTICAS
Não estamos falando de um setor ultrapassado, retrógrado. É um setor que está na fronteira tecnológica. O mundo inteiro vem discutindo novas rotas tecnológicas, buscando reduzir o custo de produção de carros elétricos, por exemplo, porque a bateria ainda pesa muito e é muito cara. O setor é extremamente estratégico para descarbonizar, emitir menos CO2.
DOMÍNIO DE TECNOLOGIA
Ao mesmo tempo em que o programa tem a busca de sustentabilidade, envolve também o domínio de tecnologia.
Por que não podemos dialogar com um setor que corresponde a 20% da indústria manufatureira do Brasil, que é consolidada? Estamos dando o incentivo porque consideramos importante.
Estamos falando de um parque industrial que é a oitava maior produção mundial de automóveis. A pergunta que eu faço a todos que podem criticar: então, o Brasil tem que abdicar de estar na fronteira tecnológica?
NEOINDUSTRIALIZAÇÃO
Se o Brasil busca uma neoindustrialização, e tem um setor que corresponde a dois tripés, que é a sustentabilidade e inovação tecnológica, vamos dizer “vocês estão fora”? Qualquer inovação tecnológica, no seu processo inicial de maturação do investimento, é cara.
INCENTIVOS DO PASSADO
Você acha mesmo que o Brasil não avançou no setor automotivo? Eu discordo, se pegar o Inovar-Auto [programa de incentivo anterior ao setor], estamos avançando na tecnologia.
ETANOL COMO DIFERENCIAL
O Brasil está muito à frente do mundo em termos de descarbonização do setor automotivo. É uma vantagem o Brasil olhar e dizer ‘não necessariamente precisamos ir para o carro elétrico’. O programa tem uma pluralidade de entender todas as rotas tecnológicas.
PREÇOS MENORES
Vai ter carro mais barato no Brasil. Quando, eu não posso dizer, mas que vai, vai. O mundo inteiro terá. Precisa de um tempo para ter maturação. Depende muito da evolução tecnológica da bateria.
Vai chegar o momento que teremos maturação de investimento com tecnologia em escala o suficiente para reduzir preço. Um carro elétrico custava R$ 300 mil. Hoje, você compra por R$ 140 mil, R$ 150 mil. Já caiu o preço.
CAMINHÕES PESADOS
O programa contempla todos os tipos de veículos. O grande desafio do Brasil é descarbonizar mais caminhões pesados do que carros leves, porque nosso principal mecanismo de transporte são caminhões e ônibus.
O programa estimula a exploração de novas rotas, como o biodiesel e o biocombustível. O PL [projeto de lei] do combustível do futuro, que está vinculado ao Mover, trata de explorar novas rotas de fontes energéticas. Não tem um [tipo de veículo] que tenha um incentivo a mais.
EXPORTAÇÃO
Tem um artigo da MP [medida provisória] que prevê a possibilidade de acúmulo de incentivos. Para ter o acúmulo de crédito, as empresas terão que cumprir etapas adicionais, como exportar mais, ter uma inserção maior nas cadeias globais.
Há sempre a crítica de que o setor não exporta muito. Isso é fato. É setor que, em média, quase 83% da produção depende do mercado interno. Só que hoje essas empresas não podem ficar presas ao mercado interno.
PORTARIA NESTA SEMANA
As empresas vão se cadastrar, apresentar projetos, e, cumprindo todos os critérios que estão no Mover, como de produção local, vão ter acesso ao crédito financeiro. A portaria vai regulamentar como as empresas se habilitam, os critérios, o que tem que compor os projetos, os relatórios para a fiscalização por parte do MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio), se eles estão cumprindo com o previsto.
METAS
Se não cumprirem as metas, as empresas sofrerão sanções administrativas, que é a suspensão da habilitação e devolução do crédito.
TRAMITAÇÃO DA MP
Já foram apresentadas mais de 200 emendas à MP. Por que alguém seria contra? Um programa que tem mais de R$ 41 bilhões em investimentos previstos.
Todos os deputados com quem temos conversado, inclusive do Centrão, têm se mostrado muito favoráveis e entusiasmados com o programa. Já estamos tendo conversas com eles.
POLÍTICA INDUSTRIAL E PLANO SAFRA
Queremos consolidar uma política de previsibilidade para toda a indústria um pouco parecida com o Plano Safra, que foi construído aos poucos ao longo do tempo. Hoje, sai governo e entra governo e ninguém mexe no Plano Safra. Queremos fazer a mesma coisa para a indústria. O Plano Safra não foi construído de um dia para outro.
CONTEÚDO LOCAL
O MDIC está mapeando os setores para identificar a possibilidade de estabelecer conteúdo local para algumas cadeias produtivas e o percentual.
O importante é aprender com os erros do passado, olhar e ter clareza se é possível estabelecer um direcionamento para compras para cadeias produtivas existentes, e um porcentual também razoável que não encareça as obras, que não comprometa o prazo de entrega da infraestrutura.
Esse processo está avançado. Fizemos mapeamento das cadeias eólicas, mineração, construção civil, de ônibus, porque tem prevista a renovação de frota nas grandes cidades no PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
REVISÃO DAS METAS DA POLÍTICA INDUSTRIAL
Muita gente não percebeu e saiu fazendo críticas sem ter lido. Eu chamo atenção que o decreto estabeleceu o prazo de 90 dias para que as metas próprias do documento sejam revisadas, as contrapartidas, as sanções. Todo esse documento vai ser revisado e apresentado até 22 de abril.
RAIO-X
Uallace Moreira, 44 anos
É secretário de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços do MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços). É doutor em desenvolvimento econômico pelo Instituto de Economia da Unicamp e pesquisador do KIEP (Korea Institute for International Economic Policy).
O que é o Mover?
O programa Mobilidade Verde e Inovação institui um regime de incentivos às atividades de pesquisa e desenvolvimento (P&D) da indústria automobilística para estimular a produção e comercialização de carros sustentáveis
Como é dado o benefício?
O benefício é dado via concessão de crédito tributário, que pode ser abatido do imposto a pagar
Qual é o custo?
O custo total será de R$ 19,3 bilhões de 2024 até 2028. Para os R$ 3,5 bilhões de renúncia previstos neste ano, R$ 3 bilhões já estão no Orçamento. Os R$ 500 milhões restantes serão feitos com a receita gerada pela recomposição tarifária na importação dos carros elétricos e dos painéis fotovoltaicos. A Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores) fez uma previsão de que os investimentos podem superar os R$ 41 bilhões já anunciados e chegar a até R$ 100 bilhões
Renúncia 2024 – 2028
2024 – R$ 3,5 bilhões
2025 – R$ 3,8 bilhões
2026 – R$ 3,9 bilhões
2027 – R$ 4,0 bilhões
2028 – R$ 4,1 bilhões
Total: R$ 19,3 bilhões