Candidatura de Paulo Wanderley à reeleição prejudica imagem do COB, diz adversário
Wanderley assumiu em 2017 após a renúncia de Carlos Arthur Nuzman.
- Data: 13/09/2024 17:09
- Alterado: 13/09/2024 17:09
- Autor: Redação
- Fonte: FolhaPress/Lucas Bombana
Crédito:Divulgação
Estão previstas para o dia 3 de outubro as eleições para a presidência do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) para o ciclo olímpico de Los Angeles-2028, em um pleito que tem gerado discussões dentro do meio esportivo sobre a legalidade da candidatura do atual mandatário, Paulo Wanderley.
Wanderley assumiu em 2017 após a renúncia de Carlos Arthur Nuzman, que era investigado à época pela PF (Polícia Federal) por suspeita de pagamento de propinas para a escolha do Rio de Janeiro como sede dos Jogos em 2016. Em 2020, foi reeleito, e, no último dia de inscrições para as chapas no pleito deste ano, inscreveu sua candidatura, com Alberto Maciel Júnior como vice.
Associações que reúne atletas olímpicos, como a Cacob (Comissão de Atletas do Comitê Olímpico do Brasil) e a ApB (Atletas pelo Brasil), se manifestaram contra a candidatura de Wanderley, pelo fato de um terceiro mandato ser vedado pelo estatuto do próprio COB e também infringir a Lei Pelé.
“Os mandatos dos membros eleitos para os poderes do COB são de no máximo quatro anos, permitida uma única recondução”, diz o estatuto em seu Art. 21. Da mesma forma, a Lei Pelé, no Art. 18-A, aponta que “as entidades sem fins lucrativos componentes do Sistema Nacional de Desporto […] somente poderão receber recursos da administração pública federal direta e indireta caso seu presidente ou dirigente máximo tenham o mandato de até quatro anos, permitida uma única recondução”.
O entendimento de Wandeley, contudo, é o de que, como assumiu um mandato tampão após a renúncia de Nuzman, ainda teria direito a buscar a reeleição.
“Paulo Wanderley está se candidatando para a primeira e última reeleição ao COB. A legislação brasileira não veda a reeleição quando o primeiro período é um chamado mandato tampão. A gestão do presidente Paulo contribuiu para o resgate da credibilidade do COB. Ele não se candidataria se não houvesse respaldo jurídico”, afirmou Marcelo Jucá, assessor jurídico de Wanderley.
Tanto a chapa de Wanderley quanto a de oposição, liderada por Marco La Porta e Yane Marques, ainda precisam passar por uma dupla checagem –documental e de integridade– para terem a candidatura oficializada.
“O objetivo da candidatura é falar de projetos, compromissos concretos e de próximos passos para que o COB siga avançando no patamar de resultados esportivos e de gestão do esporte olímpico brasileiro de forma sustentável”, acrescentou Jucá.
Wanderley publicou na tarde desta sexta uma mensagem nas redes sociais ao lado de Maciel Júnior, em que corrobora o lançamento da candidatura.
“Com a chapa inscrita e ao lado do vice-presidente Alberto Maciel Júnior, firmamos o compromisso de consolidar as conquistas e avançar. Estamos prontos para promover um novo salto sustentável no esporte olímpico brasileiro”, escreveu o cartola.
Vice-presidente do COB até o início do ano, quando teve de renunciar ao cargo para poder concorrer nas eleições de outubro, Marco La Porta, que lidera a chapa COB Unido, afirma que a candidatura de Wanderley prejudica a imagem do comitê brasileiro junto à sociedade.
“Acho que é ruim para o COB essa discussão, a imagem do comitê melhorou muito nos últimos anos, a governança, e acho que é ruim trazer isso agora a público e fazer essa discussão sobre a legalidade da chapa, em vez de estarmos falando dos atletas, dos resultados, discutindo novas propostas”, diz La Porta à Folha de S.Paulo.
“Isso é ruim para o movimento olímpico. Gostaria que a gente fosse mais propositivo”, disse La Porta, acrescentando que assumiu o compromisso de não judicializar a candidatura do adversário.
“O Brasil tem um histórico de governança de entidades esportivas com dirigentes com mais de 20 anos no cargo. Aquela coisa que a gente sabe que não funciona”, diz Fernanda Nunes, atleta de remo do clube Vasco da Gama, diretora da ApB e integrante da Cacob.
“O nosso posicionamento é simplesmente de acordo com a lei. Não é absolutamente nada pessoal contra o Paulo Wanderley. Qualquer dirigente que tente um terceiro mandato, os atletas serão contra”, emenda a atleta.
Vice-presidente do Instituto Brasileiro de Direito Desportivo, Mariana Chamelette explica que a jurisprudência brasileira não é pacífica e apresenta diversos precedentes favoráveis e contrários ao entendimento sobre o mandato tampão.
“Para muitos, [o mandato tampão] não se configura como um mandato eletivo completo, uma vez que sua origem está vinculada a eventos extraordinários e não a um processo eleitoral regular”, afirma a especialista.
Ela acrescenta que, apesar das limitações de reeleição previstas na Lei Geral do Esporte para organizações que recebam verbas oriundas da União, a autonomia das entidades esportivas, assegurada constitucionalmente, permite que os próprios estatutos estabeleçam os critérios de eleição e reeleição, “ficando a critério do Poder Judiciário aferir, conforme o caso concreto, a legalidade de tais dispositivos estatutários.”
O Ministério do Esporte informou, por meio de nota, que recebeu recentemente uma consulta do COB que aborda o processo eleitoral da entidade e está analisando o conteúdo da consulta.
“Assim que a análise for concluída, o resultado se tornará público. É importante ressaltar que o Ministério do Esporte irá acompanhar com isenção e imparcialidade todo o processo, cumprindo rigorosamente o que determina a lei.”
Medalhista de bronze no pentatlo moderno em Londres-2012, Yane Marques concorre como vice-presidente de La Porta contra a chapa de Wanderley. Ela esteve à frente da Cacob entre 2012 e 2024 e foi indicada pelo comitê de atletas para compor a chapa concorrente.
Segundo Yane, a comissão de atletas adotou posicionamento unânime a favor da candidatura de sua chapa, pela avaliação de que a de Wanderley desrespeita o estatuto do COB.
“A comissão de atletas é absolutamente contra um terceiro mandato e tem um lado muito definido e muito claro nessa eleição, que é a nossa chapa”, afirmou Yane, que pode se tornar a primeira mulher a assumir um cargo executivo de gestão no COB.
“O Laporta não me convidou porque eu sou mulher, a comissão de atletas não me indicou porque eu sou mulher, mas ser mulher tem um componente muito significativo nessa história. Vai ser a primeira vez, e toda primeira vez quebra paradigmas, abre portas”, disse a ex-atleta, que ocupa a secretaria executiva de esportes educacionais em Recife.
Segundo La Porta, a proposta da chapa é trazer ao COB uma gestão mais colegiada, em que o comitê, ao lado das confederações e dos atletas, “possam, juntos, planejar o futuro do esporte.”
“A gente entende que o COB teve uma evolução muito grande na sua governança e os resultados evoluíram a partir de 2012. Agora em Paris, não digo que teve uma queda, mas deixou de evoluir. E é preciso retomar esse processo”, diz o candidato.
Ele defende uma redução gradual na dependência de recursos públicos, com atração de patrocínio corporativo para a sustentação da operação. “O COB é uma entidade privada e precisa ter mais empresas apoiando-o. Tivemos uma evolução muito grande no último ciclo, com o trabalho da nossa diretoria de marketing, e agora pretendemos ampliar esse trabalho.”
La Porta afirmou também que pretende reformular o papel do conselho de administração, de modo que o órgão tenha um papel mais ativo na gestão do esporte brasileiro. E que contratará a empresa de auditoria Deloitte para que seja realizada um mapeamento e posterior revisão dos processos internos, para que o repasse de recursos às confederações seja mais célere. “O esporte tem pressa.”
“É normal que haja uma dificuldade de relacionamento nesse momento, mas a gente tem muito respeito, ou eu, pelo menos, tenho muito respeito pelo presidente Paulo Wanderley e espero que a gente faça um processo tranquilo”, afirmou o candidato.