Médico investigado por erros no Ceará opera em São Paulo e paciente morre
Um cirurgião plástico investigado por supostos erros médicos no Ceará conseguiu emitir registro profissional para atuar em São Paulo, operou uma mulher que faleceu logo após a cirurgia
- Data: 29/03/2019 11:03
- Alterado: 29/03/2019 11:03
- Autor: Redação ABCdoABC
- Fonte: Estadão Conteúdo
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A operação foi no início de março em um hospital do Ipiranga (zona sul). A cirurgia, de lipoaspiração e abdominoplastia, acabou com a paciente morta, destaca o jornal O Estado de S. Paulo.
Danilo Rocha Dias é um cirurgião plástico conhecido em Fortaleza onde tem uma clínica na Aldeota, bairro nobre da capital cearense. Nas redes sociais, também é popular. Sua página no Instagram conta com mais de 160 mil seguidores.
Em seu Estado de origem, porém, ele acumula, além de fama, pelo menos quatro processos judiciais de pacientes que o acusam de erro médico, duas denúncias no Conselho Regional de Medicina local e um inquérito criminal no Ministério Público do Ceará (MP-CE) pela morte de uma paciente em 2016, após uma lipoaspiração. A vítima, Lia Pacheco Coelho Dias, então com 32 anos, era cunhada do profissional.
Mesmo com todas as denúncias, o cirurgião, em atividade desde 2007 no Ceará, conseguiu emitir registros profissionais secundários nos conselhos regionais de São Paulo, em 2017, e do Rio, em 2018. O primeiro processo movido contra Danilo Dias no Ceará por suposto erro médico é de 2013. Para poder trabalhar nos dois Estados do Sudeste, solicitou e obteve um certificado de regularidade no CRM do Ceará, seu conselho de origem.
Com o registro no Conselho de São Paulo (Cremesp) ativo, Dias abriu um consultório na capital paulista no fim do ano passado. Uma das primeiras pacientes foi a dona de casa Sandra Mara Trovino da Cunha, de 45 anos, que procurou o médico interessada em uma cirurgia de abdominoplastia.
“Tem mais de dez anos que ela tinha o sonho de fazer essa cirurgia. Ela já tinha tentado emagrecer de todo jeito. Quando começou a conversar com o doutor Danilo, ele disse que fazia um preço bom, que facilitava o pagamento, e ela ainda viu que ele tinha uma clínica chique em Fortaleza, que recebia famosos, então achou que podia confiar”, conta o filho de Sandra, o universitário Welliton Trovino Cunha, de 24 anos.
Sandra foi operada na manhã do dia 9 de março, mas a cirurgia não terminou bem. Ela sofreu três paradas cardíacas e morreu no mesmo dia.
A família reúne documentos e aguarda o laudo final do Instituto Médico-Legal (IML) para processar o médico. “Minha mãe fez todos os exames pré-operatórios, estava bem para a cirurgia. Naquela manhã, ele ainda postou nos stories do Instagram que tinha corrido tudo bem em uma cirurgia que tinha feito. Só depois avisou a família que tinha acontecido um problema”, diz Cunha. Na quarta-feira, 27, o médico apagou seu perfil da rede social.
Outros casos
A empresária Ângela Pacheco Coelho, de 57 anos, aguarda há três anos esclarecimentos sobre o ocorrido com a filha, Lia, a cunhada de Dias morta em 2016 após cirurgia realizada em Fortaleza. “Eu não posso dizer o que aconteceu, mas sei que minha filha entrou saudável, perfeita, e saiu morta. Eu deveria ter uma explicação”, diz. O caso de Lia é investigado pelo MP-CE.
Além dos dois óbitos, Dias é acusado de erros em cirurgias de pelo menos outras três pacientes, que não morreram, mas ficaram com sequelas. Um dos casos ganhou destaque na imprensa no início de 2018 após a paciente, a youtuber Camilla Uckers, que tem mais de 1,2 milhão de inscritos em seu canal, denunciar em suas redes sociais as complicações sofridas no pós-operatório. Ela diz que o médico atingiu seu nervo ciático durante uma cirurgia de implante de prótese nos glúteos. “Manco até hoje, ainda preciso fazer fisioterapia. Além disso, tive reação à prótese porque ela era muito grande para o meu peso”, conta Camilla, que moveu processo judicial contra o médico e registrou a denúncia no CRM-CE.
O caso da administradora Sara Nunes de Melo, de 50 anos, foi ainda mais grave. Ela conta que, durante procedimento de abdominoplastia e lipoaspiração, em 2016, ela sofreu uma atelectasia pulmonar, condição na qual os pulmões entram em colapso. “Fiquei 13 dias na UTI e até hoje tenho dificuldades para respirar. Não entendo como esse médico ainda não perdeu o registro”, conta Sara.
A autônoma Gicelda Maria Bezerra Costa, que fez cirurgias com o médico em 2011 e 2012, também segue com sequelas. “Fiquei com uma bola no abdôme e com a barriga torta. Não posso usar biquíni nem roupa justa”, diz ela, que moveu processo contra o médico em 2013 e aguarda julgamento.
Defesa
O cirurgião plástico Danilo Rocha Dias afirmou, por meio de mensagem no Whatsapp, que todas as cirurgias foram feitas conforme as regras de segurança. “Foram realizados e vistos todos os exames pré-operatórios bem como avaliações médicas antes das cirurgias. As pacientes foram preparadas e orientadas. Durante o ato cirúrgico em si, tivemos total controle da cirurgia, sendo feito tudo conforme manda as normas de segurança”, afirmou.
O cirurgião disse ainda que “em nenhum momento houve imperícia ou imprudência” e que sua equipe “é muito experiente e preparada”.
A reportagem pediu explicações sobre os relatos específicos de cada paciente, mas o médico afirmou que “relatos são relatos” e que “o importante (é) saber a verdade dos fatos, e que sempre agimos dentro dos padrões”.
O Estado também procurou os conselhos de medicina do Ceará e de São Paulo para saber os resultados de eventuais sindicâncias contra o médico e como funciona a emissão do certificado de regularidade que permitiu que o cirurgião obtivesse o registro também em São Paulo.
O CRM-CE limitou-se a enviar e-mail com o artigo do código de processo ético-profissional que prevê que as sindicâncias tramitam em sigilo.
Já o Cremesp informou que ainda não havia sido acionado sobre a morte da paciente paulista, mas que poderá abrir sindicância para apurar se houve indícios de má conduta ética e profissional.
Afirmou ainda que Dias não responde a nenhuma sindicância no conselho de São Paulo e que um profissional “só é impedido de obter inscrições secundárias, e até de exercer a profissão em todo o território nacional, quando é submetido à pena de cassação do registro após o trânsito em julgado.”
O Conselho Federal de Medicina não atendeu ao pedido de entrevista.