A estratégia perversa da indústria do tabaco
Psicóloga Cristina Perez, da Fundação do Câncer, alerta sobre as estratégias que a indústria do tabaco vem utilizando para manter mercado consumidor, já que é proibida de fazer propaganda
- Data: 19/07/2016 14:07
- Alterado: 19/07/2016 14:07
- Autor: Redação
- Fonte: Cristina Perez, psicóloga, consultora técnica da Fundação do Câncer
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No ano 2000, lei federal proibiu a propaganda dos cigarros nos grandes meios de comunicação, como TVs, jornais e rádios. Em 2011, outra legislação apertou ainda mais o cerco: anúncios nos pontos de venda foram vetados. A indústria do tabaco, porém, reagiu. E da forma mais perversa possível: atraindo jovens e crianças para o tabagismo com a estratégia de expor seus produtos em meio a doces e chocolates nos pontos de venda, além de utilizar embalagens coloridas e atraentes.
No Brasil, a imensa maioria dos fumantes (80%) dá sua primeira tragada antes dos 18 anos de idade. Em média, no mundo, é aos 15 que acontece o primeiro contato com o cigarro – produto que mata dois a cada três de seus usuários. Para entender como a indústria tabagista busca driblar a proibição da propaganda, a Fundação do Câncer e o Instituto Nacional de Câncer (Inca) realizaram a Pesquisa Pontos de Venda de Produtos Derivados do Tabaco: Estratégias de Marketing.
A técnica de investigação adotada foi a de cliente oculto. Durante dois meses, junho e julho de 2015, visitamos 54 pontos de venda de cigarros. Eram bancas, padarias, lojas de conveniência de postos de gasolina e bares nas cidades de Rio de Janeiro e Teresópolis, no Estado do Rio de Janeiro; São Paulo e Embú das Artes, em São Paulo; e Porto Alegre e Santa Cruz do Sul, no Rio Grande do Sul. As conclusões foram estarrecedoras.
Como se não bastasse estarem posicionados perto de balas, chicletes e outros produtos com apelo infantil, os maços de cigarros também são encontrados frequentemente juntos aos caixas, por onde todo o público é obrigado a passar. Além disso, em muitas ocasiões são organizados em mosaicos coloridos nos displays, simulando grandes painéis. Isso sem falar em paredes inteiras revestidas com material especial, repetindo as cores da embalagem do produto exposto, e a iluminação forte nas ‘vitrines’.
Portanto, com a proibição da propaganda de produtos de tabaco nos pontos de venda, a indústria passou a investir pesadamente nestas artimanhas para continuar atraindo novos consumidores. As advertências de malefícios à saúde ocupam uma face dos maços, mas a outra continua sendo cada vez mais trabalhada para chamar a atenção e, principalmente, passar a impressão de que aquele produto não é nocivo.
Tramitam no Congresso Nacional três projetos de lei que determinam a padronização das embalagens de produtos de tabaco. Todas deverão se apresentar numa cor padrão, sem desenhos ou quaisquer outros artifícios gráficos e possuir o mesmo tipo de letra. Legislações neste sentido já foram adotadas na Austrália. França, Reino Unido e Canadá deverão seguir o mesmo caminho.
Acreditamos que a medida se faz necessária com urgência no Brasil, para dizer o mínimo. Não é possível que um produto que causa dependência, doença e morte, e que ainda por cima tem autorização para ser comercializado de forma legal, possa continuar direcionando seus esforços livremente a crianças e adolescentes. Afinal, trata-se de um público cujas escolhas sofrem grande interferência de estratégias de propaganda como as da indústria do tabaco, que travestem de inofensivos comportamentos de risco, como fumar.